Responsável por 7,6 mil mortes somente no ano passado, a violência nas rodovias federais do país custou ao Estado e à sociedade cerca de R$ 8,5 bilhões em 2009 – o equivalente a R$ 53,4 mil por acidente, segundo estudo encomendado pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit). O cálculo do valor levou em consideração diversos aspectos, como danos materiais, físicos e emocionais, gastos com socorro médico, perda de rendimentos futuros com a morte ou invalidez da vítima e até prejuízos com congestionamentos.

O custo total com acidentes nas BRs apontado pelo estudo é, por exemplo, 12 vezes maior do que o orçamento do Fundo Nacional de Segurança e Educação no Trânsito (Funset) no ano passado, que foi de R$ 690,9 milhões.

Considerando somente o que o governo investiu de fato até 15 de dezembro de 2011 em campanhas e ações educativas para diminuir acidentes nas estradas e vias municipais, a diferença entre prevenir e remediar fica ainda mais astronômica.

Conforme balanço da ONG Contas Abertas, R$ 194,9 milhões do Funset foram aplicados no ano passado, o que equivale a apenas 2% do custo da violência no trânsito estimado pelo estudo do Dnit. Isso em um cenário urbano onde, segundo especialistas e autoridades de trânsito, a imprudência e a desatenção dos motoristas ainda responde pela grande maioria dos acidentes.

A tentativa de se estimar o custo econômico da violência no trânsito não é nova – o último estudo a respeito, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), é de 2006. O que a pesquisa elaborada pela empresa Contécnica, contratada pelo Dnit, traz de novo, é a criação de uma fórmula para analisar o “custo-benefício” de intervenções físicas em trechos específicos das rodovias.

Em tese, o órgão poderá agora determinar prioridades para alocação de recursos em obras e campanhas, com alvos específicos. O estudo revela, por exemplo, que os três tipos de acidentes mais custosos são colisões frontais, atropelamento de pedestres e aqueles envolvendo motociclistas.

Impacto de obras

A eficácia de obras e intervenções físicas na redução de acidentes, porém, ainda é vista com ceticismo por especialistas. “O que a engenharia pode fazer é atuar no ambiente da rodovia e induzir a comportamentos mais seguros. Mas várias pesquisas mostram que o fator humano é o mais importante. E, para transformar esse comportamento, são necessárias medidas educativas, a longo prazo”, avalia o engenheiro civil Jorge Tiago Bastos, mestre em Engenharia de Transportes e pesquisador do do Núcleo de Estudos em Segurança no Trânsito da Universidade de São Paulo (USP).

Para o médico e diretor do Núcleo Multidisciplinar de Estudos sobre Acidentes de Tráfego da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Wilson Pacheco, o alto custo dos acidentes é potencializado por falhas na fiscalização e na punição do mau comportamento no trânsito.

“Se eu fosse presidente da República, proibiria as motos, por uma questão de orçamento público. Hoje, elas só têm utilidade passando por locais onde não deveriam, fazendo costuras. E, aí, ocorre uma grande matança”, defende Pacheco. No ano passado, 1.374 motociclistas morreram em acidentes nas estradas federais.

Trechos críticos são urbanos

Em todo o Brasil, 22% dos acidentes mais graves atendidos pela Polícia Rodoviária Federal (PRF) se concentram em 60 trechos, de dez quilômetros de extensão cada. Em todos estes locais, o cenário urbano é o mesmo: rodovias federais cruzadas por vias estaduais ou municipais.

Estes trechos são o foco da operação RodoVida, que prevê blitze simultâneas da PRF, Polícia Militar e agentes de trânsito nas BRs, rodovias estaduais e ruas próximas até o dia 27 de fevereiro. Os locais foram definidos com base em um índice de gravidade criado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) – cada acidente recebe “pontuações” de acordo com a ocorrência de feridos ou mortos. Entre os 60 pontos, nove estão no Paraná, o que confere ao estado o maior número de trechos perigosos pertencentes à operação.

A atenção dada pela PRF ao Paraná não é por acaso. Até dezembro do ano passado, 661 pessoas morreram em acidentes nas rodovias federais paranaenses. Foi o terceiro estado com mais mortes, atrás apenas de Minas Gerais e Bahia. O trecho considerado mais crítico fica na BR-376, entre os Km 170 e 179,9, em Maringá.

Mistura fatal

Chefe-substituta do Núcleo de Comunicação da PRF no Paraná, a inspetora Letícia Zacca reforça que, na maioria dos casos, os trechos estão em rodovias em boas condições. A “mistura” entre o tráfego urbano e o transporte de cargas por caminhões, aliada à imprudência dos motoristas, mais uma vez surge como fator fundamental para o registro de acidentes.

“Em Curitiba, na Linha Verde, por exemplo, os motoristas locais precisam dividir espaço com veículos de carga que estão atravessando o estado ou até o país. Há um grande número de cruzamentos e intersecções em nível. Em resumo, trata-se de como um mesmo espaço é dividido pelos vários tipos de veículos e condutores”, diz.

Entenda a conta

O cálculo dos custos dos acidentes leva em conta uma série de fatores. Veja abaixo:

Objetivo

O estudo procura criar um banco de dados com os valores específicos de cada acidente registrado nas rodovias federais, apresentando um processo regular para a obtenção desses valores. Assim, o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) poderá determinar prioridades para investimentos por meio de uma análise de custo e benefício da obra, considerando os custos consequentes de acidentes em um trecho.

Responsável

O estudo começou a ser elaborado pela empresa Contécnica, de Minas Gerais, ainda em novembro de 2009, sendo concluído dois anos depois. Por isso, para exemplificar o cálculo dos custos, leva em conta os acidentes registrados em 2009. Outras pesquisas semelhantes já haviam sido conduzidas pelo IPR em 2000 e 2004.

Custos relacionados às vítimas

Para chegar aos custos totais por acidente, o estudo leva em consideração fatores como a perda de rendimentos futuros (quanto a pessoa deixa de produzir com a sua morte ou invalidez permanente, conforme sua idade), gastos médicos e hospitalares e despesas com funeral. Outro fator, que procura calcular os efeitos psicológicos dos acidentes sobre as vítimas e familiares, é chamado de perda por dor e sofrimento. Os próprios pesquisadores, no entanto, reconhecem que esse é um valor completamente subjetivo.

Custos relacionados aos acidentes

A pesquisa também leva em conta os custos com danos materiais aos veículos, cargas e às propriedades de terceiros, além de gastos com o atendimento às vítimas na rodovia, processos judiciais, seguros e até congestionamentos causados pelo acidente.

Estudos semelhantes

Em 2006, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) também apresentou uma pesquisa sobre o tema, chegando ao valor de R$ 6,5 bilhões em custos com acidentes nas rodovias federais. Em 2004, estudo anterior do IPR chegou ao montante de R$ 4,8 bilhões. Como os valores dependem da metodologia adotada e do número de acidentes em cada ano, não é possível fazer comparações objetivas. Pesquisa da ONG European Transport Safety Council de 2002, por exemplo, mostrou que o custo de uma vítima de acidente rodoviário fatal podia chegar a 150,2 mil euros na Espanha e a 56,8 mil euros em Portugal.