O Ceará enfrenta uma guerra no asfalto. Dados das Polícias Rodoviárias Federal (PRF) e do Estado (PRE) revelam que os acidentes com feridos graves e óbitos só fazem aumentar em nossas estradas. De janeiro a julho deste ano, somadas as BRs e CEs, 320 pessoas perderam a vida e outras 1.930 ficaram feridas. São quase duas mortes por dia nas estradas cearenses.

Um número estarrecedor, afirmam os comandos da PRF e PRE. Se os fatores objetivos, como buracos, falta de manutenção, sinalização falha e má condição dos veículos contribuem para as estatísticas, o erro humano é o principal responsável por essa tragédia diária.

De janeiro a junho do ano passado, segundo dados da PRE, ocorreram 1.416 acidentes, que deixaram 856 feridos e 149 mortos. Este ano, no mesmo período, já são 1.583 desastres, com 1.010 feridos e 171 vítimas fatais. Um aumento de 14% em relação aos óbitos.

Somente nos 20 primeiros quilômetros das BRs 116 e 222 foram registrados 859 acidentes, com 184 feridos graves e 38 mortes. No total, as estradas federais que cortam o Ceará registraram 2.050 acidentes com 119 mortes até o último dia 19.

Vítimas

Um quadro de violência que interrompe o futuro de jovens como José Josimar Vieira Lira, 25 anos. No feriado da Semana Santa, ele conduzia uma moto quando colidiu transversalmente com uma carreta, na BR-020. O rapaz morreu na hora.

Naquele mesmo dia, no quilômetro 6,8 da BR-116, ainda em Fortaleza, um carro que vinha em velocidade acima do permitido colidiu com uma bicicleta, matando o ciclista José Edvaldo de apenas 22 anos.

O comandante da PRE, coronel PM Túlio Studart, aponta que na maioria dos acidentes aconteceram situações que envolveram, sobretudo, imperícia, negligência e imprudência do condutor do veículo.

O inspetor da PRF, Darlan Antares, concorda com a análise e lamenta que comportamentos básicos, como uso do capacete ou do cinto de segurança, ainda liderem as infrações de trânsito. Das 35.851 multas aplicadas nas rodovias federais em 2010, 13.212 foram por falta de cinto de segurança. “Isso é depois de 14 anos da lei federal que obriga a utilização desse acessório de segurança”, frisa.

O engenheiro de transporte José Fábio Loureiro comenta pesquisa do Centro de Estudos em Logística do Instituto Coppead, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), sobre as rodovias brasileiras. “O resultado científico comprova as estatísticas: 66% dos acidentes ocorrem por falha humana, principalmente imprudência (43%)”.

A má condição das estradas é apontada em 47% dos casos. Para ele, a falta de atenção do motorista, excesso de velocidade, ultrapassagens proibidas e sono são causas dos desastres.

Engenheiro e especialista em gestão de pavimento da Universidade Federal do Ceará (UFC), José Benevides afirma que os motoristas que dirigem por trechos da BR-222 e BR-020 – que ligam o Ceará ao Piauí – “correm risco de morte”. Segundo ele, nessas rodovias, os caminhões costumam desviar de um buraco passando por cima de um veículo de passeio. “É a lei do mais forte ou maior”

BR-116
Histórias de quem se salvou por pouco

Andreza Lima, 16 anos, ainda se recupera física e psicologicamente de um acidente no Km 9 da BR-116. Ao andar de bicicleta pelo acostamento, um veículo, com velocidade acima dos 80 quilômetros indicados, passou “raspando” pelo garota, que perdeu o equilíbrio e, por sorte, ficou apenas com ferimentos no braço esquerdo.

As marcas do acidente ainda são fortes na memória de Andreza. “Tenho medo até de ficar perto da estrada. Agora é me recuperar e agradecer a Deus por estar viva”, assevera.

Outra família que não consegue se conformar com a violência das estradas cearenses é a do comerciante Cláudio Gomes. Seu filho de apenas 17 anos perdeu a perna devido a um acidente no KM-20 da mesma rodovia. “Ele tentou atravessar a via e não deu tempo. O motorista viu meu garoto, mas não diminuiu a velocidade”.

A família de Cleide Silva de Moraes não teve a mesma sorte. Sua tia Maria, 84 anos, morreu no Km-20 da 116, na comunidade do Jabuti. “Ao descer do ônibus e atravessar a via, que tem faixa de pedestre, um carro desgovernado jogou minha tia a uns 100 metros daqui. O corpo dela ficou me pedaços. Não quis nem ver”, emociona-se.