Sob a justificativa do aquecimento do mercado automotivo, municípios mineiros estão ameaçados de ficar impossibilitados de emplacar veículos. Por causa de atraso na licitação para compra de lacres de placas, o estoque do Departamento Estadual de Trânsito (Detran-MG) está quase esgotado, segundo confirmação do chefe da unidade da Polícia Civil, delegado Oliveira Santiago. Betim, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, é a primeira cidade a afetada pelo desabastecimento, o que vem impedindo o emplacamento de carros zero quilômetro desde quinta-feira da semana passada. A situação é classificada por delegados do órgão como “caótica”.

O Detran-MG tem só 15 mil selos em estoque para o serviço, que está sendo investigado depois de denúncias de desvio do equipamento. Como são emplacados, diariamente, cerca de 2 mil veículos no estado, o material supre as necessidades por mais sete dias apenas. Depois disso, os carros novos ficarão sem o lacre e impossibilitados de rodar. A proposta para remediar o problema é remanejar selos de cidades que ainda os têm em reserva para aquelas na quais se esgotaram.

O órgão, no entanto, garante que até a próxima semana o problema estará resolvido, com a abertura das propostas de empresas que participaram de licitação para produção de 2 milhões de lacres. Mas, se houver atraso no processo, o serviço entrará em colapso no estado. Esse lote é suficiente para abastecer o estoque por cerca de um ano e meio. Devem ser investidos mais de R$ 3 milhões na aquisição. Quatro fábricas apresentaram propostas e, como são de outros estados, é possível que forneçam uma quantidade pequena de imediato e peçam prazo maior para a entrega do restante previsto no edital.

Em outubro, o Detran-MG adquiriu 1 milhão de lacres, mas a Polícia Civil, por meio de sua assessoria de imprensa, informa que não esperava tantos carros para emplacamento no período. Só nos quatro primeiros meses do ano foram mais de 160 mil no estado. Segundo um despachante, “amanhã ou depois vai estourar o problema, pois o estoque está no fim”. Só a capital, onde são emplacados quase 1 mil veículos por dia, deve ficar livre do desabastecimento, pois a reserva é maior em relação ao resto do estado. Nos dois últimos dias, o despachante deixou de atender mais de 20 clientes em Betim e indaga: “Como os motoristas vão rodar com veículos irregulares?”.

Em Betim, onde são feitos, em média, 30 emplacamentos por dia, o motorista profissional Adriano Santos Júnior foi um dos prejudicados. Depois do almoço, ele tentou emplacar o carro do irmão e foi informado de que deveria esperar alguns dias. “Fica parecendo que compramos carro enfeitar a garagem.” Ele estava com a documentação em dia, placa pronta e havia pago a primeira parcela do IPVA e o seguro obrigatório. “É muita burocracia. A gente perde um tempo enorme para nada”, completou Adriano.

Donos de outros veículos em Betim também foram informados de que retornassem depois de segunda-feira, como o motoboy Narck Prado. Acompanhado da mulher, Rosilene Vasconcelos, voltou para casa sem a placa. “Fazem pouco caso da gente. Comprei a moto, paguei as taxas e não vou poder usá-la. Não há uma data certa para regularização do serviço e fico sem trabalhar. Se arriscar a usá-la, ela pode ser apreendida.”

Há mais de dois meses, um funcionário do Setor de entrega de material notificou o chefe do Detran-MG do risco de desabastecimento. De acordo com informantes, caso a empresa vencedora da licitação seja a atual fornecedora, o problema poderá ser resolvido em poucos dias, mas se for outro o ganhador, o drama pode se arrastar. Outra questão é quanto à fase de recursos da licitação. Depois de abertos os envelopes das propostas, antes de homologar a empresa escolhida, é preciso dar prazo de cinco dias úteis para que os preteridos no processo recorram da decisão. Depois disso, a vencedora tem prazo para produzir o material – tempo não informado pelo Detran-MG. Segundo o coordenador de Apoio Administrativo, delegado Emerson Abreu Bastos, o órgão desconhece a falta de lacres na Grande BH: “Não temos informação de cidades que estão deixando de emplacar. Mas, se estiver ocorrendo, então a situação é caótica”.

Depois de informada pelo Estado de Minas de que o problema estava afetando Betim, a Polícia Civil assegurou que providenciou o remanejamento de lacres para a cidade da Grande BH, onde “o material estava escasso, mas o estoque não chegou a zerar”.