Desde a última quarta-feira (01), quem colocou os pneus de seu veículo em alguma das estradas pedagiadas do chamado Anel de Integração, no Paraná, pagou uma tarifa 5% mais cara. À primeira vista, o índice pode até não assustar ninguém, já que está dentro das margens estimadas da inflação para este ano. Mas as coisas mudam de figura quando o cidadão incauto é apresentado às tabelas de preços praticados pelas concessionárias no Paraná. Aí, qualquer pessoa que preze pela saúde do seu bolso – seja um usuário comum ou aquele que depende das estradas em seus negócios – vai ficar com os cabelos em pé.

Para se ter uma ideia, para trafegar pelos 80 quilômetros da BR-277, entre Curitiba e Paranaguá, um carro de passeio comum irá pagar, só de ida, RS 13,30. Ou R$ 26,60 com o retorno pela mesma via. Trocando em miúdos, vai acabar desembolsando mais com o pedágio do que com o obrigatório prato de barreado nos restaurantes do Litoral. Já o motorista que tomar a mesma BR-277 para seguir de Curitiba a Foz do Iguaçu, vai passar por nove praças de pedágio ao longo dos 637 quilômetros de estrada, pagando R$ 141,00 na viagem de ida e volta. Em contrapartida, se o mesmo usuário resolver tomar a direção de São Paulo, pela BR-116, não vai encontrar apenas um, mas quatro postos de pedágio. A diferença é que, até a capital paulista, a tarifa total da viagem – só de ida – sai por R$ 6,00. Detalhe: 400 quilômetros separam as duas capitais – cinco vezes a distância entre Curitiba e Paranaguá.

Certamente não era esse o cenário que os paranaenses imaginavam, em 1997, quando começaram a surgir na imprensa as primeiras notícias sobre a implantação do pedágio nas rodovias do Estado. Na época, as condições da malha viária do Paraná aproximavam-se do caos. Com exceção da duplicação da BR-376 até a divisa com Santa Catarina, iniciada na gestão de Alvaro Dias, e concluída somente na de Jaime Lerner, as estradas paranaenses ficaram por muito tempo como território livre para buracos e falta de sinalização. Em 1997, entretanto, o governo do Estado lançou mão de um plano ousado, com a ideia de matar dois coelhos com um único tiro: passar para a iniciativa privada a concessão de 2.035 km de estradas estaduais e federais, no chamado Anel de Integração, um conjunto de rodovias quer ligam as principais cidades paranaenses.

Pedágio: tiro que saiu pela culatra
O plano parecia louvável: recuperar a malha rodoviária sem gastar um só tostão do Orçamento na empreitada. Pena que o tiro saiu pela culatra. Os burocratas de plantão, comandados pelo então secretário de Transportes Heinz Herwig, hoje presidente do Tribunal de Contas do Estado, esqueceram um pequeno detalhe: discutir as linhas gerais do projeto com os principais interessados no assunto, ou seja, os usuários das rodovias. E o que era para ser uma solução acabou se transformando em um problema. E dos grandes.

Com as concessionárias, o governo estabeleceu que fossem feitas obras de recuperação inicial das estradas oferecidas – uma espécie de mega-operação tapa-buracos – além da melhoria da sinalização em trechos considerados críticos. O investimento total, na época, realizado pela iniciativa privada, foi estimado em R$ 90 milhões, ao longo de seis meses. Concluída a maquiagem, as concessionárias poderiam começar a cobrar o pedágio nas estradas. Em nenhum momento, porém, o governo chamou os segmentos diretamente atingidos pela cobrança – transportadores de carga e passageiros e produtores rurais, por exemplo – para discutir os valores a serem cobrados. Os preços – R$ 0,34 por quilômetro em pista simples e R$ 0,45 em pista dupla – foram definidos em reuniões onde apenas técnicos do DER e das concessionárias tiveram assento.

Na verdade, nem a própria Assembleia Legislativa foi informada dos valores que seriam praticados. “Nós aprovamos apenas uma lei genérica, que definia o regime de concessões de serviços públicos”, lembra o deputado Luiz Claudio Romanelli, na época um dos líderes da oposição. “O projeto do pedágio nunca passou pela Casa. Só tomamos conhecimento depois que o governo já estava fazendo campanha na mídia”. Os defensores do pedágio alegavam que o preço do pedágio no Paraná era mais caro que o de outros Estados por conta do menor fluxo de veículos nas estradas da região. Comparavam, por exemplo, a Via Dutra, entre Rio e São Paulo, onde o movimento chegava as 80 mil veículos por dia, contra os 4 mil que trafegariam diariamente pela Rodovia do Café.

Altas tarifas causam profundo impacto sobre produtores rurais

Não era preciso ser nenhum especialista para adivinhar que, em um Estado de economia essencialmente agrícola, como é o caso do Paraná, o pedágio teria um impacto considerável sobre os produtores rurais, aumentando os preços dos fretes e reduzindo a competitividade do segmento diante dos competidores internacionais. Na época, o Sindicato e Organização das Cooperativas do Estado do Paraná (Ocepar) chegou a fazer simulações que traduziam em números os efeitos da cobrança do pedágio. Pelos valores de 1997, ao trafegar pelos 740 quilômetros de Foz do Iguaçu a Paranaguá, um caminhão de cinco eixos, com capacidade para 17 toneladas de carga, deixaria nas dez praças ao longo do trecho o valor equivalente a 19 sacas de milho ou 10 sacas de soja. E isso só no trajeto de ida, lembrando que, no retorno, os caminhões em geral voltariam vazios.

A carga pesada do pedágio sobre os custos dos produtores é reforçada pelo engenheiro-agrônomo Nilson Hanke Camargo, assessor técnico da Federação da Agricultura do Paraná (Faep). Segundo ele, independente do valor do produto do mercado (nesta semana a saca foi comercializada entre R$ 48,00 e R$ 51,00 no Estado), o impacto do pedágio é de R$ 0,50 por saca de soja. Não é pouca coisa. Sem esquecer que, no posto de pedágio, não importa se o caminhão esta carregado de milho ou leva computadores e eletrodomésticos. O preço é o mesmo. “Só que milho não tem valor agregado”, lembra Camargo. Bingo.

Com seus caminhões transbordando de milho e soja, por sinal, transportadores de carga e produtores rurais fazem a festa das concessionárias. Com a nova tabela, uma carreta de seis eixos que faça o trajeto de ida e volta entre Foz do Iguaçu e Curitiba vai pagar R$ 884,00 de pedágio. “Isso da R$ 0,60 por quilômetro”, critica Luiz Carlos Podzwato, superintendente do Sindicato dos Trsanportadores de Carga do Paraná (Setcepar). “É um absurdo, sob qualquer ponto de vista”. Bem, menos das concessionárias, claro.