Para que os motoristas flagrados pelos radares da Ponte Rio-Niterói recebam suas multas em casa, todos os 75 mil usuários que, em média, passam diariamente pelo pedágio terão que arcar com o aumento da tarifa. A Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) autorizou o reajuste para compensar o gasto que a Ecoponte, concessionária que administra os 13,2 quilômetros da via, terá com o envio das multas àqueles que desrespeitarem o limite de 80km/h. O novo valor ainda não foi calculado.

A Ecoponte já está negociando com os Correios a assinatura de um contrato para a distribuição das notificações. É o que falta para que a Polícia Rodoviária Federal (PRF) comece a aplicar as multas. Com base no valor que a concessionária irá desembolsar com o envio, técnicos da ANTT vão calcular de quanto poderá ser o reajuste do pedágio, que será aplicado junto com o aumento anual previsto em contrato para junho. Inicialmente, a agência que regula o setor informou que a revisão extraordinária da tarifa seria autorizada porque o serviço de postagem não constava do contrato de concessão.

Porém, ao ser alertada pela Polícia Rodoviária Federal (PRF), a agência explicou que o custo com a postagem das multas foi incluído nos contratos de concessão por meio de um termo aditivo. No dia 8 de setembro, a ANTT informou ao Departamento de Polícia Rodoviária Federal que iria comunicar à concessionária a necessidade de contratar os serviços dos Correios para a postagem das multas.

“Sobre o assunto, cumpre inicialmente destacar que os contratos de concessão de rodovias, em sua origem, não previam como obrigação contratual verba para postagem de notificações de infrações de trânsito, pois tal obrigação, entende-se, era outrora de responsabilidade do DPRF (Polícia Rodoviária). Acrescente-se que essa alteração somente surgiu após a celebração do terceiro termo aditivo ao convênio de cooperação técnica”, informou a agência.

A ANTT vai autorizar o reajuste, no entanto, porque o custo do envio das multas nunca foi incluído no cálculo do pedágio. Segundo a agência, todos os procedimentos necessários para que a PRF comece a aplicar multas foram cumpridos. Ao longo do processo, que teve início em junho do ano passado, a Polícia Rodoviária Federal solicitou ajustes nas imagens fornecidas pelos radares, o que já foi concluído. O Inmetro também já aferiu os equipamentos e deu sinal verde para a aplicação das multas. A única pendência é o contrato entre a concessionária e os Correios.

A decisão de repassar aos usuários os custos do envio das multas não é bem aceita pelo Ministério Público Federal. Em 2015, o órgão já havia instaurado uma ação civil pública por causa do mesmo procedimento adotado em relação à concessionária Autopista Fluminense, que administra a BR-101 Norte. Na ocasião, o MPF alegou que era irregular repassar para a tarifa do pedágio o custo que a concessionária teria com os Correios. A ação tem como réus a ANTT, a concessionária e a União. O MPF sustenta que a única forma de implementar esse aumento de tarifa seria por meio de um termo de aditamento ao contrato de concessão.

“Há ilegalidade no repasse da tarifa do custo de impressão e remessa postal das notificações de autuações e notificações de penalidades de trânsito geradas pelas imagens captadas pelos radares fixos”, diz um trecho da manifestação do MPF na ação. “Tal seria incumbência da DPRF (Polícia Rodoviária), visto se tratar de serviço de segurança pública”, acrescentou. A procuradoria ressalta ainda que “entender o contrário seria burlar o princípio da razoabilidade e da gratuidade do serviço de segurança pública, que não é remunerado mediante taxas”. Em primeira instância, a decisão foi favorável ao Ministério Público, mas a ANTT recorreu.

O aumento da tarifa do pedágio para custear o contrato com os Correios irritou usuários da Ponte Rio-Niterói. Presidente da Associação de Moradores de São Francisco, em Niterói, a psicóloga Marinice Machado aponta incoerências no processo.

— Acredito que esse ônus deve ser pago pelo governo. Não pode cair nas costas dos usuários. Isso é um absurdo. Deveria ser inconstitucional. Eles (os infratores) é que fazem irregularidades, e nós é que vamos pagar? Tem algo errado nessa lógica. Deveria ser barrado. Isso não tem a ver com aumento da tarifa do pedágio. O lucro com o valor das multas vai ficar todo com o governo — criticou Marinice.

Já a advogada niteroiense Daniela Graça Arcoverde de Oliveira vê ilegalidade na medida:

—É um absurdo! Na banca da faculdade, a gente estuda algumas coisas. Se não tem no contrato, não pode ser passado para o usuário. A multa que o infrator paga vai para um fundo. Acho que não é obrigação da concessionária arcar com os custos da emissão das multas. Quem deveria pagar isso é quem recebe a multa. Isso é direito administrativo. Quem deve pagar é quem recebe a multa ou o governo federal, que arrecada dinheiro com as infrações. Nós que andamos direitinho na Ponte é que vamos pagar por quem não anda direito? Nós temos princípios, regras, normas administrativas e a Constituição.

A ANTT informou que outras concessionárias já passaram pela mesma situação e tiveram autorização para fazer revisão extraordinária de tarifa: além da Autopista Fluminense, a Concer, a Autopista Planalto Sul, a Autopista Litoral Sul, a Autopista Regis Bittencourt/Arteris, a Autopista Fernão Dias, a Rodovia Transbrasiliana, a Rodovia do Aço/ACCIONA, a Via Bahia e a CRT/Rio-Teresópolis.

Hoje, a tarifa do pedágio na Ponte é R$ 4,10. De junho de 2016, quando os radares entraram em funcionamento, até agosto passado, 1.470.084 motoristas foram flagrados trafegando em excesso de velocidade. Se a PRF já estivesse aplicando multas, a arrecadação, considerando o mais baixo valor (R$ 130,16 por dirigir em velocidade até 20% acima do permitido), teria chegado a R$ 191,3 milhões.

Em junho do ano passado, quando os radares foram instalados, o número motoristas flagrados ficou em 130.924. No mês seguinte, com a informação sobre a operação dos equipamentos, o número de infrações despencou para 81.561. Novembro de 2016 foi o mês com menos registros: 71.756. Mas, sem que as multas fossem aplicadas, os motoristas voltaram a pisar fundo. Em junho, o número de flagrantes chegou a 126.322. Em julho, foram 121.312, e em agosto, 120.878.

Mesmo sem mexer no bolso dos motoristas infratores, a instalação dos radares na Ponte teve um efeito imediato no número de acidentes na via. No primeiro ano de concessão da Ecoponte, de junho de 2015 a junho de 2016, foram registrados 434 acidentes com seis mortes. No ano seguinte, de junho de 2016 a junho de 2017, com os radares já operando, foram 366 colisões — uma queda de 18,5% — e nenhuma morte. Também não ocorreram acidentes fatais em julho, agosto e setembro deste ano.

Fonte: ASCOM