O Pontilhão Márcio Rocha Martins foi inaugurado em setembro do ano passado com a proposta de acabar com a rotina de tragédias do velho traçado na BR-040, que liga BH ao Rio de Janeiro

A inauguração do Pontilhão Márcio Rocha Martins, no fim do ano passado, foi um breve alento para quem temia a passagem apertada e curva pelo traiçoeiro Viaduto das Almas, na BR-040, em Itabirito, Região Central de Minas. Engenheiros viários, policiais rodoviários e motoristas que trafegam no novo traçado que liga Belo Horizonte ao Rio de Janeiro apontam vários erros construtivos e de projeto que tornaram os acessos tão arriscados como o antecessor, responsável por mais de 200 mortes. Pistas inclinadas, sinalização precária, falta de acostamento e de fiscalização eletrônica são problemas graves.
O trecho mais crítico, de acordo com esses especialistas, é a curva de entrada na cabeceira do viaduto, bem no fim de uma forte descida com cerca de cinco quilômetros, no sentido Rio de Janeiro/Belo Horizonte. “Essa junção é muito perigosa. De repente, no meio da curva de entrada, a estrada de duas pistas se estreita. Os caminhões descem embalados e se espremem. Por sorte ainda não houve mortes, mas tivemos muitas batidas e engarrafamentos com cinco, seis quilômetros de extensão”, afirma o inspetor Valtair Vasconcelos, da Polícia Rodoviária Federal (PRF) de Congonhas, responsável pelo trecho.

Os indícios da á execução do pontilhão e de sua ligação com a estrada velha surgem apenas nove meses depois da inauguração do viaduto. O Márcio Rocha Martins foi projetado em 1998, mas só começou a ser construído em 2006. A previsão para término era 2008, mas vários problemas construtivos e de licitação alongaram os trabalhos por mais dois anos.

Depois de sete datas de abertura, as pistas do viaduto da BR-040 foram liberadas ao tráfego a um custo 82% superior ao que o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) anunciou. Dos R$ 33 milhões iniciais, o custo final chegou a R$ 60 milhões. Tantos problemas ocorrem em meio a uma crise no Ministério dos Transportes. O grande número de denúncias de obras superfaturadas e embargos pelo Tribunal de Contas da União culminou no afastamento e na exoneração de 27 pessoas da Pasta, sendo oito delas ligadas diretamente ao Dnit.

Velocidade

A reportagem do Estado de Minas levou o engenheiro civil e consultor de projetos de infraestrutura viária (como o do novo Anel Rodoviário de BH e do Rodoanel Metropolitano) Everaldo Cabral, para analisar o viaduto e apontar seus problemas. O excesso de velocidade é o primeiro aspecto notado. “Os veículos deveriam descer a 60km/h, mas poucos rodam a menos de 80km/h. Não há radares para inibi-los”, aponta. A única haste instalada na via para receber um aparelho de registro de velocidade está a cerca de três quilômetros da curva, longe de interferir na velocidade dos caminhões e automóveis.
Descendo a rampa, a primeira visão que os motoristas têm é da mureta central de concreto. Ela começa quase no meio da curva. Ao seu lado, uma linha amarela reflexiva e zebrada, que fazia parte da pista antiga, mas não foi apagada com eficiência, ajuda a confundir. “O condutor se depara com a mureta na sua esquerda e tende a se dirigir mais para a direita. Quando vê a zebra amarela mal apagada, então, instintivamente ele vai ainda mais para a direita, principalmente porque o barranco não o deixa ver que há espaço depois da curva”, avalia Cabral.

Nas duas pistas os veículos acabam se deslocando para a direita e invadindo a linha divisória de faixas e do acostamento. Isso, justamente quando a estrada se estreita perto do corte feito num barranco com mais de 30 metros de altura. “Os caminhões passam ali muito próximos uns dos outros, principalmente as carretas que transportam minério. Quase tocam umas nas outras”, conta o inspetor Vasconcelos.

Com 22 anos de experiência naquela estrada transportando minério, Idário Silva de Jesus, de 45, acha o Viaduto das Almas menos perigoso que o pontilhão novo. “No fim, o Viaduto das Almas estava cheio de radares e redutores de velocidade. Nesse, a gente passa grudado um no outro nas curvas. Se tiver alguém parado no acostamento: um abraço. Bate mesmo. Minha carreta cheia, com 41,5 toneladas, precisa de 100 metros para frear completamente”, calcula.

Outro perigo silencioso naquela parte do viaduto é o corte rente ao barranco. As máquinas abriram a montanha muito próximo à pista. O solo ficou sem cobertura vegetal para ser protegido das chuvas, trazendo riscos de desabamentos. “Há muitos veios de uma rocha instável chamada filito. Ela se incha com a água que absorve e, sem uma cobertura adequada, as pedras rolam e caem na canaleta e na rodovia. Podem ser grandes o suficiente para atrapalhar o tráfego ou, no mínimo, bloquear os canais e fazer a água correr para dentro da curva”, prevê Cabral.

O que fazer

As soluções apontadas pelo engenheiro civil Everaldo Cabral para corrigir esses problemas são caras, demoradas e demandam interdições. “A mureta precisa ser prolongada mais uns 60 metros para que os veículos já venham encaixados dentro dela. A faixa mal apagada precisa sumir. O mais difícil é o barranco. Ele tem de ser cortado pelo menos mais uns dois metros e meio para dentro. Para isso, será preciso interditar a pista e fazer outra licitação. Se fosse feito na época da obra, não precisaria de tanto esforço e custo”, avalia Cabral.