Chefe do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (TCU), o procurador Lucas Rocha Furtado defendeu no plenário a entrega da concessão da BR-101 no Espírito Santo a um grupo de empresas, baseando-se em proposta sigilosa, que deveria estar lacrada em cofre da Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa).

O aval foi dado ao Consórcio Rodovia Capixaba. O grupo trava uma guerra jurídica para desclassificar o vencedor do leilão pelos pedágios, que devem render R$ 6,93 bilhões em 25 anos. Nos bastidores do TCU, a manifestação abriu uma crise em torno do processo, permeado por pressões políticas.

Uma das prioridades do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), o leilão da BR-101 é o primeiro da série de concessões rodoviárias previstas pelo governo Dilma Rousseff. Realizado em janeiro, teve como primeiro colocado o Consórcio Rodovia da Vitória, liderado pela concessionária EcoRodovias, com preço de pedágio 6,5% mais barato que o da Rodovia Capixaba. Formado por seis empresas do Espírito Santo, o grupo levou ao Ministério Público Federal supostas irregularidades nos documentos da concorrente.

Pelas regras do edital, após o fim do pregão, só é divulgada a proposta vencedora. Tanto os documentos de habilitação quanto o plano de negócios dos demais ficam sob custódia da Bovespa, que, consultada pelo Estado, reiterou não tê-los fornecido a nenhum órgão.

No dia 1.º, ao discutir recurso de sua autoria em sessão do TCU, o procurador pregou a assinatura do contrato com a Rodovia Capixaba. Para ele, os documentos da empresa não contêm vícios, atendem aos requisitos formais e ao interesse público.

“Defendo a classificação em primeiro lugar da segunda proposta. Nela, não há falha formal. Defendo, portanto, essa proposta, de modo que seja considerada válida”, afirmou Furtado, ao contestar o voto do relator do processo, ministro José Múcio Monteiro, que se manifestou em favor da contratação do consórcio vencedor.

Pressões . Exceto a Bovespa, em tese só o próprio consórcio tem acesso à proposta que formulou. Os documentos da Rodovia Capixaba não constam do processo no TCU. Para alguns ministros, o procurador agiu com parcialidade em favor da Rodovia Capixaba, que tem contado com o apoio de setores do PMDB. Por sua vez, o primeiro colocado tem aval do governo.

Em sua exposição, o procurador citou “pressões”, às quais o plenário estaria submetido. “Gostaria, senhor relator, que Sua Excelência não tivesse recebido as pressões que recebeu, mas tenho a certeza de que está seguindo a sua consciência”, disse Furtado. Múcio retrucou: “Não estamos discutindo sob efeitos de pressões, estamos discutindo pontos de vista”.

Dois ministros votaram com o relator. Ex-secretário geral do Senado, indicado ao TCU por José Sarney (PMDB-AP), Raimundo Carreiro encampou a proposta do procurador. A votação foi interrompida por Aroldo Cedraz, que pediu a retirada de pauta até a semana seguinte.

O processo não voltou ao plenário. Depois de apresentar seu voto, Múcio deixou a relatoria, alegando motivo de foro íntimo. O processo foi sorteado para Valmir Campelo, que se declarou suspeito, também por motivo pessoal. O novo relator é Raimundo Carreiro.

A concessão da BR-101 no Espírito Santo tem 475,9 quilômetros. A concessionária vai explorá-la por 25 anos, com o compromisso de R$ 2,1 bilhões em investimentos, entre os quais a duplicação nos primeiros cinco anos. Serão sete praças de pedágio. Os preços propostos pelo consórcio classificado em primeiro vão de R$ 1,21 a R$ 2,81.