Tranqüilidade, dinheiro no bolso, muitos passageiros e falta de segurança. Esse é o clima de trabalho entre os perueiros que circulam por Belo Horizonte e região metropolitana. Na terça-feira, o EM flagrou em várias áreas da cidade o retrato da imprudência e do perigo do transporte clandestino, alimentado por milhares de pessoas que não encontram no sistema regular a eficiência desejada. De janeiro a junho deste ano o Departamento de Estradas de Rodagem (DER-MG) e a BHTrans aplicaram 28.214 multas para o transporte irregular de passageiros. Mas o peso no bolso parece não incomodar os perueiros: “Sou multado quase todos os dias. Mas o valor da infração a gente pode dividir e pagar até com desconto. Enquanto não apreenderem o meu carro, eu não paro”, afirma um motorista, de 32 anos, que preferiu não se identificar.

Ele é um dos 30 condutores clandestinos que se revezam todos os dias na BR-040, em pontos de ônibus nas imediações da Ceasa, em Contagem. E diz que consegue faturar por dia R$ 100, transportando pessoas em seu Monza verde, da década de 1980. Ele afirma que faz o itinerário que o cliente quiser. “Onde tiver passageiro eu arranjo um lugar no meu carro. As pessoas falam que tem perigo mas isso não é verdade. Conheço bem os trajetos, sei onde tem buraco e não corro. Então, não há risco comigo. Acidentes podem ocorrer com qualquer um, regular ou não”, garante ele, que está há quatro anos no ramo.

Para conseguir mais passageiros, os perueiros criam uma série de estratégias. Contratam, inclusive, um agenciador que é pago para ficar nos pontos de ônibus fazendo a propaganda dos itinerários. Adriano Rodrigues, de 20 anos, é um deles. “Sou fiscalizador de peruagem desde os 12 anos. Combino com todos os motoristas o valor de R$ 2, por dia. Desta forma, eles não precisam sair do carro para chamar as pessoas. Eu faço o serviço e já estou fazendo carreira como fiscalizador”, diz Adriano.

Mesmo depois da morte da camareira Zildete Alves Aguiar Silva, de 33, passageira de um microônibus de transporte clandestino que sofreu grave acidente na manhã do último sábado, outras pessoas não se intimidam e estimulam a prática ilegal. “Eu não pego mais ônibus. Vou e volto para casa só com perueiro. O problema é que o ônibus que preciso não passa, enquanto as vans e carros passam a toda hora. Sei que é perigoso, pois os motoristas correm muito. Já andei com um que não dirigia com velocidade menor que 120 quilômetros por hora. Mas, infelizmente, não há melhoria no sistema público. Por isso, eu prefiro correr risco”, diz o conferente de cargas, Wagner Dutra, de 36.

A vendedora Joelisa Morais Santos, de 54 anos, é outra que prefere o transporte irregular. Ela mora no Bairro San Marino, em Ribeirão das Neves e, para trabalhar, vai ao Centro de BH todos os dias. “Pegar ônibus é um sofrimento. Demora até duas horas para chegar e, quando passa, está lotado. Por isso vou com os perueiros. Além de ir sentada, eles chegam sempre na hora certa”, observa.

Os pontos de ônibus da outra extremidade da BR-040, no sentido de Nova Lima, é também uma região disputada. Os perueiros ficam parados às margens da rodovia e oferecem o serviço aos passageiros. Um deles, que também pediu anonimato, faz o trajeto BH/Ponte Nova. Por R$ 18 ele leva a pessoa até Ouro Preto em seu Fiat Palio, com placa de Ponte Nova. “Não há risco, pois faço esse trabalho há três anos”, afirma. A passageira que decidiu ir com ele também não reclamou: “Há um certo medo, mas Deus guarda”, diz.