O presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez muito bem quando desautorizou seu subordinado Tarso Genro, ministro da Justiça, que chegou a avisar que o governo federal retiraria do pacote de leis propostas com o objetivo de reduzir os acidentes de estradas com a proibição peremptória de venda de bebidas alcoólicas nas proximidades delas. No conjunto controvertido, contendo equívocos absurdos como a tentativa de usar o aumento desmedido de multas para educar infratores, a lei seca se destaca pela sensatez e pela atualidade. A providência introduz no Brasil a prática civilizada de tentar impedir por todas as maneiras a mistura de álcool com volante, de fato um dos fatores preponderantes na mortandade nas ruas e nas estradas brasileiras.

Convém, de toda forma, jogar um pouco de água fria na fervura dos ânimos em torno desse assunto. A legislação restritiva é bem-vinda. Mas não basta para produzir efeito: se não houver rigorosa fiscalização, ela tende a cair no vazio e não produzirá os efeitos benéficos dela esperados na redução do número de acidentes com vítimas e, mais ainda, o total de mortos por eles produzidos. É desejável que diminuam os acidentes, como ocorreu no carnaval, mas isso de pouco adiantará se não cair também o total das vítimas. As autoridades, entre estas o presidente da República, cometem grave engano quando comemoram os índices positivos em relação às ocorrências e omitem o número maior de cadáveres retirados dos destroços dos automóveis. Feitos esses parênteses, urge lembrar que não é fácil fazer valer a decisão do legislador de impedir o comércio de bebidas nas proximidades das rodovias, conforme demonstra a experiência. As beneméritas campanhas baseadas no slogan se dirigir, não beba; se beber, não dirija usam muitas vezes como exemplos acidentes com jovens menores de idade embriagados ao volante. E a legislação vigente já proíbe terminantemente que menores de 18 anos conduzam automóveis e também comprem bebidas com teor alcoólico em bares, restaurantes ou supermercados. Em vão: menores sem habilitação ao volante ou bebendo em público são a comprovação explícita da desmoralização dessas leis. Não há por que esperar que agora, num passe de mágica, a nova medida seja cumprida.

Cabe observar ainda que a redução do teor de álcool no sangue dos motoristas deve salvar muitas vidas, mas não trará a solução definitiva para o massacre dos acidentes em estradas e avenidas das cidades. Mesmo sóbrios, os motoristas não estão livres das próprias imprudências nem da incúria dos governos que continuam deixando rodovias e vias públicas em petição de miséria. Além de proibir a venda de álcool, o governo federal precisava começar a tapar os buracos de suas estradas para reduzir sua responsabilidade no número crescente de mortos e feridos em desastres de automóveis. E pôr guardas em ruas e estradas para fazer com que as boas leis não fiquem só no papel.