Era 1971. As vendas no comércio em Solânea – região do
Brejo paraibano – já não eram tão boas assim. O
comerciante Edvaldo Ferreira dos Santos sentiu que era o
momento de mudar de profissão e conseguir uma renda que
lhe permitisse oferecer uma vida melhor à família. Não
demorou muito para ele perceber que a ‘galinha dos ovos de
ouro’ podia estar na garagem da própria casa. Na velha
Perua Amazona (1963), ele investiu o sonho e passou a
transportar amigos e desconhecidos que – todos os dias –
saíam de casa com destino a Campina Grande para tratar de
negócios ou simplesmente rever amigos e familiares.
Desde então passaram 35 anos de trabalho na estrada e
uma história que se confunde com o surgimento de um tipo
de transporte que, todos os anos, cresce em grandes
proporções na Paraíba e demais Estados do Nordeste. A
Perua Amazona – que mais tarde ganhou o nome de
‘Princesinha do Brejo’ – se aposentou e deu lugar a duas
camionetas mistas (Veraneio), que são dirigidas por ele e
dois filhos que também são motoristas de alternativos.
“Este ano mesmo, dei entrada nos papéis da minha
aposentadoria como motorista de alternativo. Foi dele que
tirei o sustento para manter meus filhos e minha esposa e
quero me aposentar pelos anos de trabalho que prestei à
sociedade”, relata Edvaldo Ferreira, hoje com 63 anos de
idade.
Surgido em localidades rurais do Nordeste, o
transporte alternativo de passageiros ganhou espaço e
invadiu as médias e grandes cidades causando um ‘choque’
no mercado das empresas de ônibus intermunicipais e
urbanos. Na Paraíba, o crescimento foi tanto que a frota
de veículos alternativos superou – e muito – o número de
ônibus. Mais de 5 mil veículos alternativos cortam as
principais estradas do Estado atualmente, enquanto apenas
230 ônibus continuam na ativa. O tipo de transporte não é
regulamentado em lei, mas não há fiscalizações para coibir
ou reduzir o número de veículos em circulação.
A comodidade de chegar mais rápido ao destino e
economizar dinheiro com táxi ou mototáxis levaram os
passageiros a trocarem as linhas de ônibus pelas vans ou
camionetas, que hoje existem em todas as 223 cidades
paraibanas. Um exemplo disso é o autônomo Armando Mendes,
31 anos. Ele viaja, a cada quinze dias de Belém, no Brejo
paraibano, para Campina Grande em um veículo alternativo.
“Eu preferia o ônibus, mas sempre quebrava e eu chegava
atrasado nos locais. Aí já conheço o motorista da Veraneio
e passei a vir sempre com ele. Ganho mais tempo e ele vai
me deixar em qualquer lugar da cidade”, explica.
Numa impotência diante do crescimento do transporte
alternativo, os empresários partiram para um ‘fogo amigo’
e passaram a buscar acordos com os motoristas de
alternativos para preservar determinadas clientelas. As
empresas traçam um mapa onde somente os ônibus devem
atuar, enquanto os alternativos operam nas outras
localidades.
O presidente do Sindicato das Empresas de Transporte
Intermunicipal de Passageiros do Estado da Paraíba
(Setrans), Joselito Pereira da Silva, confirma que desde
1995 o número de passageiros no transporte formal
paraibano caiu mais de 60% devido à interferência dos
alternativos. “Temos exemplo de empresas que operavam com
72 veículos e hoje estão com apenas 25. Outra que operava
com 60 ônibus e hoje possui apenas 20. São empresas que
ficaram sem condições de operar, porque os passageiros
foram tomados pelos clandestinos”, disse.
Em 1995, havia 51 empresas com permissão para explorar
o transporte intermunicipal no Estado. Hoje, esse número
caiu para 43. “Empregamos hoje 6,5 mil pessoas, mas
poderíamos ter 8 mil pessoas empregadas no setor se não
houvesse a interferência deste transporte”, disse Joselito
Pereira. Pelo menos três empresas do setor fecharam, na
Paraíba, desde a evolução do transporte alternativo na
região.
Projeto prevê diminuição da frota
O diretor de transportes do Departamento de Estradas e
Rodagens (DER/PB), Aparício Calzerra, afirma que há uma
complexidade em buscar soluções para a situação e assegura
que algumas falhas no sistema de transporte formal foram
consideráveis para o crescimento dos alternativos.
Responsável pela fiscalização sobre o transporte
estadual, o órgão reconhece a dificuldade na fiscalização
sobre a circulação destes veículos e admite – através de
um projeto em fase de estudo – a regulamentação do sistema
alternativo. “Não é fácil fiscalizar os alternativos, mas
temos equipes espalhadas por todo o Estado para verificar
as condições como estão sendo transportados esses
passageiros. Temos visitado alguns Estados onde o
transporte é regulamentado para discutir essa
possibilidade aqui também na Paraíba, mas ainda não há
muita coisa concreta”, explica.
Em outubro do ano passado, a Assembléia Legislativa do
Estado aprovou um projeto de lei que institui o serviço de
transporte alternativo intermunicipal na Paraíba e reduz
para 1,5 mil o total de veículos com permissão para
circular no território estadual. O projeto aguarda sanção
do governador, mas está parado devido a uma liminar
impetrada pelo Setrans/PB.
O presidente do Sindicato dos Transportes Alternativos
da Paraíba, Francisco das Chagas, disse que a
regulamentação do transporte vai servir para garantir mais
segurança aos usuários e aos proprietários dos veículos.
“Vai haver uma redução de 5 mil para 1,5 mil no número de
veículos, mas depois haverá a possibilidade deste número
ser ampliado legalmente”, explica. O projeto prevê a
criação de um cobrador fiscal para atuar junto aos
motoristas dos veículos. Cada motorista credenciado terá
de possuir apenas um veículo.