BRASÍLIA – Os ministros dos Transportes, Alfredo Nascimento, e do Meio Ambiente, Carlos Minc, estão em pé de guerra por causa do asfaltamento da BR-319, rodovia que corta a Amazônia ligando Manaus a Porto Velho. A obra, prevista no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), virou motivo de polêmica e é alvo de ambientalistas. O orçamento para pavimentar a estrada, construída entre 1972 e 1973 e intransitável desde 1988, é de R$ 697 milhões. É o que mostra reportagem de Catarina Alencastro na edição deste domingo em O Globo.

Nascimento, que já foi duas vezes prefeito de Manaus, pressiona para tocar a obra, que impulsionará sua candidatura ao governo do estado em 2010. Minc teme que a rodovia provoque uma nova onda de desmatamento no que chama de coração da Floresta Amazônica. Para não perder a disputa, Minc fixou exigências ambientais. E as ações que terão de ser cumpridas, como condições para a concessão de licenciamento ambiental para o empreendimento, dobram o valor da obra.

O custo das ações ambientais chega a R$ 653,5 milhões. Dez exigências constam do relatório final de um grupo de trabalho interministerial que, durante 90 dias, levantou ações preventivas para minimizar o impacto ambiental do asfaltamento. A lista é tão grande que fontes do Ministério do Meio Ambiente acreditam que elas podem até minar o projeto.

O documento, ao qual O GLOBO teve acesso, prevê a implementação de 29 unidades de conservação ao longo dos 819 quilômetros da rodovia, a construção de nove postos de fiscalização, além de um escritório do Instituto Chico Mendes, responsável pela gestão das unidades, em Manaus, e da contratação de 533 funcionários.

Contrário à estrada e defensor de um projeto de ferrovia que não existe, Minc diz que as exigências são inegociáveis. Ele compara a obra a Angra 3 – que recebeu recentemente licenciamento, segundo Minc, apesar de sua oposição ao projeto:

– Para não ser a estrada da devastação, tem que cumprir isso tudo. Vejo essa estrada como uma Angra 3. Acho arriscada. Melhor uma ferrovia. Mas, se tudo isso for feito, haverá um dano ambiental reduzido.

Pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) acreditam que a estrada gerará pressão migratória para o Oeste do Amazonas, atualmente sem ligação terrestre com o restante do país. Simulação feita pelo instituto indica que, com o asfaltamento da BR-319, o desmatamento no local atingirá até 2050 entre 25% e 38% da floresta, hoje preservada. Atualmente, o Amazonas responde por 4% do desmatamento da região.

O Ministério dos Transportes não quis falar das divergências com a área ambiental do governo. Transferiu a tarefa ao Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit). O órgão alegou não estar preocupado com o custo das demandas ambientais para asfaltar a BR-319. Para o Dnit, o problema é o tempo. O atendimento dos pré-requisitos pode atrapalhar o cronograma elaborado para que a estrada esteja funcionando até o fim de 2011.

Segundo o coordenador-geral de Meio Ambiente do Dnit, Jair Sarmento, houve consenso no governo sobre a importância das medidas contra o desmatamento. Para ele, a região estará mais protegida com a estrada do que sem ela.

– As unidades de conservação constituirão um cinturão de proteção da rodovia, para evitar ocupação desordenada. Haverá estancamento do desmatamento. O risco de a região se degradar sem a estrada é maior. Onde não há a presença do Estado, chegam as frentes pioneiras e vão devastando tudo – diz.

O Dnit diz que comparou alternativas de transporte para ligar Porto Velho a Manaus e defende que a rodovia é uma vontade da população. Hoje, há duas opções para o escoamento de produção de Manaus para o centro do país e para o cidadão que deseja visitar um parente mais ao sul da região: de barco, viagem que leva de três a quatro dias, ou de avião, que não está ao alcance de todos.