Uma série de análises foi apresentada na semana passada para justificar o fracasso do leilão da BR-262, que não atraiu nenhum investidor. De risco político a retorno incerto do investimento, foram várias as explicações. Mas, percorrendo-se os 375 km da estrada, fica-se com uma certeza: o trabalho para recuperar a via seria realmente gigantesco.

O jornal Estado de São Paulo percorreu o trecho que seria leiloado, entre João Monlevade (MG) e Viana (ES), e constatou vários problemas na rodovia que teriam de ser sanados pelo vencedor.

Equipes a serviço do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) trabalham na estrada em obras pontuais, como contenção de encostas e a recomposição de barrancos que, ao cederem, abriram crateras que engoliram acostamentos e parte da pista.

Ainda há outras questões, como sinalização deficiente em alguns trechos e a necessidade de outros reparos, além de detalhes como grandes valas entre o acostamento e a margem da rodovia em alguns pontos.

Foi uma destas que fez o caminhão de Amarildo Vingler, de 49 anos, tombar. “O caminhão começou a ferver. Eu tentei encostar, mas não vi a vala. Só nessa estrada vi essa vala deste tamanho”, disse o caminhoneiro, que na quinta-feira (19) já esperava há cerca de 30 horas por um guincho para seguir viagem. “Estou perdendo dinheiro aqui parado”, desabafou.

Pista estreita. Mas o maior problema vai demandar muito mais que ações pontuais. Atualmente, quase todo o trecho tem apenas uma via em cada sentido. Com a pista bastante sinuosa e raros pontos de ultrapassagem, um caminhão carregado, por exemplo, pode levar à criação de uma longa fila de veículos percorrendo a estrada, em alguns pontos a 10 quilômetros por hora.

Conscientes do problema, alguns caminhoneiros até chegam para o acostamento para dar passagem aos demais, mas com isso cometem infração gravíssima de acordo com o Código de Trânsito Brasileiro (CTB), com risco de levarem multa de R$ 574, além de perderem sete pontos na carteira de habilitação.

A solução para essa questão é a duplicação da estrada, obra que consumirá a maior parte do investimento de R$ 2,11 bilhões previsto no edital da concessão do trecho.

Pelo certame, quem vencesse a licitação poderia cobrar de R$ 7,40 a R$ 9,90 em cada uma das cinco praças de pedágio. O estudo feito pela Agência Nacional de Transporte Terrestre (ANTT) para a elaboração do edital calculou o volume diário médio anual de tráfego (VDMA) nas cinco praças entre 30.733 e 31.291, em 2013, podendo chegar a um VDMA entre 90.685 e 95.031 em 2043, último ano da concessão.

Com isso, o governo previu receita de R$ 7,96 bilhões, o que representa taxa interna de retorno real de 7,2% ao ano.

Cobrança. Mas a empresa ou consórcio que assumisse a rodovia só poderia começar a cobrar pedágio após a duplicação de pelo menos 10% do trecho e o valor do investimento foi considerado subestimado, principalmente pela necessidade de cortes de rochas nas montanhas que cercam a estrada para a construção de outras pistas.

“A topografia na região é recortada, mas o edital diz que é ondulada”, afirmou o engenheiro Elzo Jorge Nassaralla, que já trabalhou na rodovia pelo extinto Departamento Nacional de Estradas de Rodagem (DNER, atual Dnit) e hoje integra a Enecon S/A – Engenheiros e Economistas Consultores, especializada em consultoria em projetos relacionados a vias, sistemas viários, operação e infraestrutura de transportes.

Desconfiança. Ele contou ter sido foi procurado por um dos possíveis interessados na concessão e ressaltou que outro ponto problemático é a participação do Executivo federal nas obras.

“Não li o edital em detalhes, mas vi que tem trecho a cargo do governo. Aí tem de por o desconfiômetro para funcionar. Não se sabe a garantia do que será feito, nem quando será feito. Recomendei não participar”, revelou.

“A rodovia poderia ser uma rota para escoar a produção de grãos da região central do País para o Porto de Tubarão (em Vitória). Mas essa obra é cara e, do jeito que está, a estrada tem esse movimento”, observou um dos policiais rodoviários federais que atuam na estrada e pediu para não ser identificado, apontando para o único caminhão que podia ser visto trafegando no local no momento.

“Só em época de férias escolares é que o tráfego aumenta. Aí, a estrada congestiona toda porque não suporta o grande número de veículos”, completou.

A assessoria do Dnit afirmou que a duplicação de um trecho de 71 quilômetros da estrada no trecho de 196 quilômetros no Espírito Santo “tem duplicação em processo licitatório em fase final”.

Segundo o órgão, 16 quilômetros a partir de Vitória (que não estavam incluídos no edital de concessão) já foram duplicados e o restante do trecho “até o km 196” tem projeto de Estudo de Impacto Ambiental/Relatório de Impacto Ambiental (EIA/Rima) em elaboração, com previsão de início das obras para o começo de 2014.

Fonte: Agestado