As condições de trabalho dos motoristas de ônibus podem colocar os passageiros em risco. Reportagem do Jornal Nacional desta segunda-feira (4) mostra que a câmera instalada por uma empresa de ônibus para flagrar assaltos registrou outra ameaça para quem viaja pelas estradas do Brasil: o sono ao volante.
Era fim da madrugada, em julho deste ano. Um motorista, que não é identificado a pedido da companhia, viajava entre São Paulo e Minas Gerais. A cada cochilo, o ônibus, sem controle, ia para a pista contrária. Ele tentava despertar e mexia no cabelo. A luta contra os próprios limites durou 40 minutos. Por sorte, a viagem terminou sem acidente.
Na hora de viajar, 95% dos brasileiros pegam a estrada e grande parte vai de ônibus. No ano passado, as empresas regulares venderam mais de 1,5 bilhão de passagens. O número é grande porque um único passageiro pode viajar muitas vezes.
No transporte que leva tanta gente, não bastam apenas ônibus modernos e rodovia bem conservada. Para cuidar do destino de quem está nas poltronas dos ônibus, é preciso também um motorista bem preparado e bem descansado.
Mas a situação de risco não é rara. O Instituto do Sono, da Universidade Federal de São Paulo, entrevistou e fez testes com 800 motoristas durante um ano. Descobriu que quase metade tem sonolência na hora de pegar o volante. Alguns admitiram cochilar até oito vezes durante uma viagem.
A principal alegação para tanto cansaço é o excesso de jornada, que pode chegar a um dia inteiro de estrada. “Eu dormi no volante várias vezes. Na Dutra, já perdi até a conta. Os passageiros perguntavam o que estava acontecendo e porque eu estava pisando no freio toda hora. Eu dizia que um bicho que passou na minha frente”, contou um profissional.
Mesmo responsável por transportar tantas vidas, os motoristas ainda não têm a profissão regulamentada. A luta para oficializar a carreira e limitar a jornada de trabalho começou em 1985, com a apresentação de um projeto de lei no Congresso Nacional. De lá para cá, já são sete propostas e todas ficaram pelo caminho à espera de aprovação.
Sem uma legislação específica, por enquanto, as regras para os motoristas são as mesmas que valem para outros trabalhadores: oito horas diárias com, no máximo, mais duas extras.
A Associação Brasileira das Empresas de Transporte Terrestre de Passageiros (Abrati) nega que o sono seja provocado por abusos nas escalas. De acordo com a associação, muitas empresas já adotam medidas para melhorar as condições de saúde e de trabalho dos motoristas.