Departamentos de trânsito do país discutem amanhã normas do Denatran

Com apenas uma semana de publicação, a resolução 285 do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran) vai ser alvo de discussão em Brasília. Os Detrans de todo o país vão se reunir amanhã para tratar, entre outros assuntos, das novas regras para a formação de condutores, em especial dos motociclistas.

Há poucos dias, a legislação de trânsito aumentou as horas de aulas teóricas e práticas para tentar melhorar a qualidade da formação de condutores no país.

Anunciada como uma melhoria no processo, a permissão para que o curso de direção para motocicleta seja realizado em via pública não trouxe nenhum avanço prático. De acordo com o chefe da divisão de condutores do Detran/MG, Anderson França, era esperado que as propostas que serão debatidas amanhã já estivessem incluídas na publicação atual. “O nosso grupo de estudo propõe a realização do exame em duas etapas: uma eliminatória em circuito fechado e outra em via pública. As aulas em via pública nunca foram proibidas, já poderiam ser realizadas mesmo antes da resolução. Vamos pedir a mudança”, disse França.

No Denatran, a ousadia foi o termo utilizado para avaliar as ações que serão adotadas a partir de janeiro do ano que vem. Segundo o coordenador de informatização e estatísticas do Denatran, Eduardo Sanches, permitir as aulas nas ruas é uma evolução no processo de formação. “Foi um avanço porque permite o aluno a sair deste modo que é quase um adestramento do condutor. Em um segundo momento, teremos de repetir o exame na via pública e testes na via pública. Mas por enquanto, mesmo que não seja obrigatório, pode ajudar”, afirmou.

Náusea. Mensalmente, as ruas da capital recebem em média 1.068 motoqueiros recém-habilitados. A grande maioria passou por 15 horas de aulas práticas sem passar da primeira marcha em circuito fechado, o que deixa parte dos aprendizes nauseados em virtude do pequeno espaço e dos vários zigue-zagues que são obrigados a encarar. O resultado são os inúmeros acidentes, com maior chance de gravidade, que batem a casa dos 20 por dia somente só em Belo Horizonte.

O instrutor Caio Barros de Faria trabalha em um Centro de Formação de Condutores no bairro Letícia, região de Venda Nova, e acredita que poucos alunos irão optar por aulas nas ruas já que não é obrigatório e o exame continua sendo feito em circuito fechado. “Esta forma de aprendizagem só serve para tirar a carteira, não ensina a pilotar a moto no trânsito. O exame é muito fraco para o condutor”, disse Caio.

Enquanto sonha em comprar a moto para garantir o triplo dos rendimentos no trabalho de vendedor, Alexander Martins, 34, critica a forma estabelecida de aprendizagem considerada ideal pelas autoridades de trânsito. “Deveria ser no mínimo uns 40% das aulas na rua. Eu ando de bicicleta e vejo como o trânsito funciona e como é perigoso. Eu acho que é por isso que morre muita gente que anda de moto em acidentes”, arriscou o aluno.

A balconista Tatiane Rodrigues, 24, reclama que o treinamento que faz no circuito só serve para testar equilíbrio e cogita a possibilidade de fazer novas aulas mesmo depois de tirar a carteira. “Se eu tiver condição, vou fazer umas aulas na rua, porque não tem condição de enfrentar o trânsito de uma hora para outra.”

O vice-presidente da Associação de Profissionais dos Centros de Formação de Condutores de Minas Gerais (Anaspro), Jaques Vilaça, também critica o processo de aprendizagem dos motociclistas. Para Vilaça, o condutor sai da auto-escola somente com as noções básicas de equilíbrio, arrancada e parada do veículo. “Fica de fora o principal: a realidade do trânsito da cidade. O condutor não tem contato com nenhum outro veículo, com animais, pedestres, defeitos na via. Ele não vai saber qual o momento certo de frear ou a distância segura que tem que ficar de um carro que parar bruscamente à sua frente.”

HPS e Bombeiros
Acidentes refletem problema

Os números da gerência de estratégia e informação do Hospital de Pronto-Socorro João XXIII (HPS) revelam que motociclistas respondem por 55% dos acidentados que dão entrada no local.

A média diária de vítimas de acidentes atendidas na capital está em torno de 40 ocorrências, sendo que 22 são condutores de motos. “Temos três tipos de vítimas: ocupantes de motos, carros e os pedestres. Observamos uma queda do número de vítimas dos automóveis provavelmente por causa da Lei Seca. Mas os ocupantes de motocicleta não tivemos mudança, continuam altos. Observamos que esses acidentes são mais relacionados ao trabalho”, afirmou o gerente de informação do HPS, Roberto Marini.

As estatísticas do Corpo de Bombeiros assustam no que diz respeito à violência que vitima milhares de condutores de motocicletas na região metropolitana. No ano passado, os militares atenderam cerca de 14.580 ocorrências e estimam que, até o final do ano, os números cheguem a 19 mil casos.

A média diária de atendimentos feitos pela equipe de resgate da corporação da Grande Belo Horizonte ultrapassa a casa dos 30 acidentes. Uma morte acontece a cada dois dias. “Eu entendo que deveríamos ter um sistema de exames como acontece na Europa. Lá eles dividem as categorias por potências das motos. Então, cada condutor tem que ter a habilidade avaliada de acordo com o veículo”, afirmou o comandante do Corpo de Bombeiros, coronel Cláudio Teixeira.

O sistema de formação dos motociclistas é considerado ineficiente pelo militar que não vê resultados positivos na realização de exames em locais fechados.

“Iria ajudar muito na diminuição de acidentes e vítimas se tivéssemos um sistema mais eficaz de exames. Estes condutores têm que ser avaliados nas ruas e deveríamos também retomar as categorias que tínhamos antes, como a A1 e A2, que discriminavam a potência da moto”, finalizou Teixeira.