Técnicos do TCU (Tribunal de Contas da União) e do governo federal não conseguem

chegar a um acordo sobre os estudos que servirão de base para a elaboração dos editais

de concessão de rodovias federais para a iniciativa privada. O problema está na definição

do nível de risco regulatório do investimento, do volume de recursos privados necessários

para obras e na taxa de retorno.

Esses três fatores influenciam diretamente a tarifa de pedágio que será cobrada dos

usuários. Enquanto a discussão prossegue, o edital não sai. Entre as rodovias a serem

concedidas estão a Régis Bittencourt (SP-Curitiba) e a Fernão Dias (SP-Belo Horizonte),

que figuram no ranking das que mais matam no país.

Segundo a Folha apurou, há entendimento dentro do governo de que o TCU está

extrapolando suas funções, ao tentar forçar critérios que levem a tarifas mais baixas para

os usuários. O governo teme que, com tarifas “artificialmente” baixas, não haja

interessados nos trechos a serem concedidos.

O governo também deseja evitar que, sem conseguir atrair um operador especializado em

concessões rodoviárias, uma empresa ou consórcio sem a necessária habilitação técnica

assuma uma rodovia importante, vindo a abandoná-la depois ou a entrar na Justiça contra

o governo para forçar um aumento de tarifa.

O tribunal, por sua vez, se exime de culpa. Informa que não está definindo política tarifária

nem os demais critérios do edital diretamente ligados à tarifa de pedágio: taxa de retorno,

quantidade e preço das obras a serem feitas pelo investidor e nível de risco. O tribunal

argumenta que apenas exigiu que o governo explicasse melhor seus critérios.

Do ponto de vista do TCU, qualquer taxa de retorno, nível de investimento ou de exposição

ao risco regulatório pode ser usada para elaborar o edital, desde que o governo consiga

comprovar tecnicamente como fez suas opções. Nos estudos colocados em consulta

pública pela ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres), que atenderam em parte

às determinações do TCU, o valor teto do pedágio oscilou de R$ 3,12 a R$ 4,61,

dependendo do trecho. Para ganhar a concessão, os investidores teriam que oferecer

tarifas menores do que essas. Esses valores foram considerados insuficientes por

potenciais investidores privados.

Após consulta pública, deverão ser incorporadas obras pedidas por usuários, o que deve

elevar o volume de investimentos e, conseqüentemente, a tarifa teto. No caso da Régis

Bittencourt (SP-Curitiba), o gasto em obras da iniciativa privada subiria de R$ 1,6 bilhão

para R$ 2,1 bilhões, e a tarifa, de R$ 3,12 para cerca de R$ 3,60. Também haveria

aumento na Fernão Dias (SP-Belo Horizonte). Os investimentos privados subiriam de R$

1,4 bilhão para R$ 1,9 bilhão, e a tarifa de pedágio, de R$ 3,22 para R$ 3,60.

Retorno

No primeiro leilão de concessões rodoviárias, quando foram concedidas a Via Dutra

(SP-Rio) e a ponte Rio-Niterói, a taxa interna de retorno do investimento era de

aproximadamente 17% ao ano. Na ocasião (1995), no entanto, o país tinha uma taxa de

juros muito mais alta e nenhuma experiência em concessões rodoviárias.

O risco, portanto, era maior e era preciso mais rentabilidade para atrair o investidor

privado. Para as novas concessões, feitas em um ambiente de juros menores e de mais

experiência com concessões, o governo trabalha com taxa de retorno próxima de 15% ao

ano.

Concorrência

Técnicos do TCU também recomendaram que o governo desse um desconto de

aproximadamente 30% nos custos estimados para as obras.

Segundo o tribunal, esse é o desconto médio que o Dnit (Departamento Nacional de

Infra-Estrutura em Transportes) consegue nas suas licitações. Os técnicos avaliam que,

por serem empresas privadas, as concessionárias terão condições de conseguirem

descontos ainda maiores.

O governo federal, no entanto, avalia que é um erro usar a tabela com desconto, porque a

própria concorrência no leilão levaria o preço para baixo.

Na opinião dos técnicos do TCU, não há como garantir que haverá concorrência e, dessa

forma, uma superestimativa de investimento levaria a um preço teto de pedágio

desnecessariamente alto. Em caso de pouca concorrência, o consumidor pagaria tarifas

muito altas ao longo de todo o período da concessão (25 anos).

A Folha procurou o Ministério dos Transportes e a ANTT para comentar os problemas no

programa de concessão de rodovias, mas os órgãos não quiseram se pronunciar.