Colisão na Dutra deixa 4 mortos, 1 feridos graves e interdita pista sul
Caminhoneiro autuado por dirigir sob efeito de drogas matou 4 pessoas esmagadas Foto: Divulgação/CBSP

Motoristas drogados, com excesso de jornada, causam mortes e as empresas permanecem protegidas no anonimato

Todos os dias, nas estradas, ocorrem sinistros (acidentes) de trânsito com características semelhantes, onde a principal causa é a fadiga, resultante da pressão exercida pelos proprietários das transportadoras ou pelos donos das cargas.

Ao investigar alguns casos, o Estradas descobriu que por trás dessa exploração estão grandes empresas que não são responsabilizadas pelas tragédias.

Nesta quarta-feira (1º de maio), está previsto o início das autuações de condutores com exame toxicológico vencido. Apesar da importância dessa medida, as empresas que obrigam os motoristas a dirigir sem descanso, muitas vezes sob o efeito de drogas, continuam impunes.

No último domingo (22), na Fernão Dias (BR-381), em Betim (MG), um caminhoneiro, de 44 anos, faleceu, provavelmente por uma overdose de cocaína, após dirigir mais de 16 horas sem descanso.

Em alguns momentos, como revelou a Polícia Rodoviária Federal (PRF), ele chegou a conduzir a carreta, com 48 toneladas, a 150 km/h. Ele foi encontrado morto na cabine com vários vestígios de uso de cocaína. O caminhoneiro trabalhava para o Grupo Brasil Novo – transportadora que possui uma frota com mais de 300 carretas. A carga pertencia a uma grande empresa e o destinatário da bobina, ainda não revelado, também deve ser.

No site oficial, a transportadora Brasil Novo informa: “Somos a solução para o transporte rodoviário dos seus produtos, através de uma frota própria, rastreada, com motoristas treinados e preparados para entregar sua carga de forma responsável e segura.”

Não foi o caso dessa carga de bobinas. O motorista passou mal e faleceu a poucos minutos do local de entrega, com sinais claros de uso de cocaína, excesso de jornada e de velocidade.

Esse é apenas um exemplo das consequências do uso de drogas por motoristas que, muitas vezes, se sentem pressionados por seus empregadores a “cumprir o horário” e fazem uso dessas substâncias para se manterem acordados.

Em outro caso, apurado pela reportagem do Estradas, a PRF flagrou um caminhoneiro a serviço da FedEx dirigindo há mais de 20 horas sem descanso e que admitiu fazer uso de “rebites” para se manter acordado. A PRF autuou e mandou ele cumprir o descanso obrigatório.

O motorista, que trabalhava para a Rodobinho, simplesmente evadiu-se da base da PRF, o que gerou outra autuação. Apesar do veículo ser rastreado, assim como a carga, nem a transportadora, muito menos a Fedex esclareceram adequadamente o que ocorreu.

A transportadora simplesmente não respondeu a nenhum questionamento sobre o caso. Já a Fedex deu uma resposta genérica. A mesma transportadora atende outras multinacionais como TNT e DHL. O que é indício de que ninguém controla de fato as condições de trabalho dos motoristas,nem mesmo multinacionais que tem supostamente postura mais responsável, ao menos nos seus países sede.

Outro caminhoneiro, autuado por dirigir sob o efeito de drogas, envolveu-se em um acidente que matou quatro pessoas na Dutra, em 16 de janeiro. Como os demais, ele estava em excesso de jornada e já era reincidente na condução sob o efeito de drogas.

Nesses três exemplos, todos os motoristas estavam direta ou indiretamente a serviço de grandes empresas, que “pregam” em seus sites a preocupação com a segurança e a redução de acidentes nas estradas.

Mas os casos não estão restritos ao setor de cargas. No último sábado (27), um motorista de ônibus da Santur tombou, causando, até o momento, 7 mortes e deixando 32 feridos. Dentre as dezenas de multas encontradas no registro do veículo, também há autuação por irregularidades no cronotacógrafo, excesso de jornada, velocidade e falta do exame toxicológico obrigatório, aplicada em 02/02/2022 pela PRF da Bahia, na BR-116.

Esta multa é anterior a suspensão das autuações por falta do exame toxicológico pelo governo anterior em dezembro de 2022. Controle que será retomado neste 01 de maio.

No dia 06 de abril de 2023, pouco mais de três meses após a suspensão das multas por falta do exame toxicológico, um caminhoneiro, com veículo em péssimas condições, causou engavetamento e a morte de uma professora e seu filho. Além de todas as irregularidades com o veículo, o Estradas.com.br apurou na ocasião que o motorista estava com exame toxicológico vencido havia dois anos.

Empresas entregam cargas e veículos a condutores sem exame toxicológico

Assim como no caso da professora e do onibus da empresa envolvida na morte de sete pessoas no último sábado, fica evidente que muitas transportadoras não controlam o exame dos seus funcionários.

Ao revelar que 3,4 milhões de condutores estão com o exame toxicológico vencido, a Senatran admitiu que 30% dos motoristas das categorias C, D e E estão irregulares apenas nessa obrigação, que envolve o uso de drogas.

Para o coordenador do SOS Estradas, Rodolfo Rizzotto, a questão que precisa ser investigada pelo Ministério Público do Trabalho é: por que empresas entregam cargas e veículos a pessoas nessas condições? Na avaliação do SOS Estradas, existem três possibilidades: falta de compromisso com a segurança viária e/ou exploração dos motoristas.

É fundamental que as empresas sejam responsabilizadas, principalmente quando ocorrem acidentes“, afirma Rizzotto. “O MPT tem a obrigação de investigar esses casos. Não estamos falando apenas de caminhoneiros autônomos transportando carga para pequenos produtores ou de motoristas dirigindo ônibus para transporte clandestino. Quando mais de 3 milhões não realizam o exame para detecção de drogas, como revela o próprio governo, temos, possivelmente, centenas de milhares ou até milhões sendo explorados por grandes grupos”, acrescenta.

Entidade de vítimas defende alerta sobre a responsabilidade das empresas

Segundo Ava Gambel, fundador da ONG ‘Não Foi Acidente’, ” que reúne mais de 1,2 milhões de apoiadores, “..o dia em que nossas autoridades reconhecerem que as empresas, juntamente com os motoristas, têm responsabilidade nas infrações e mortes nas estradas, não vamos mais ler notas oficiais como a do caso recente, envolvendo a FedEx, que se isentou das responsabilidades.

SEGURANÇA: Ava Gambel é fundador do movimento ‘Não Foi Acidente’ que reúne vítimas da violência no trânsito brasileiro. Foto: Arquivo pessoal

Ele lembra que quando uma empresa contrata um profissional para transportar cargas ou passageiros, precisa se resguardar sabendo de que ele tem compromisso com a preservação de vidas. O profissional representa a empresa que tem responsabilidade e o departamento de pessoal deve checar todos os documentos, inclusive o toxicológico.

Ava Gambel diz que o Movimento ‘Não Foi Acidente’ é totalmente a favor do exame toxicológico e que salva vidas. Ele acrescenta: “Os sinistros provocados por condutores de veículos pesados sob efeito de drogas não tiram apenas uma vida mas podem acabar com famílias inteiras. Então, é preciso entender que a exigência do exame não é para tirar dinheiro de ninguém mas para preservar vidas, inclusive dos trabalhadores.”

Abcam

Na opinião de Bolivar Lopes Brambila, assessor da presidência da Associação Brasileira de Caminhoneiros (Abcam), é um absurdo um motorista profissional dirigir por horas sem descanso. “É preciso rever os procedimentos imediatamente de várias transportadoras que atuam no transporte do nosso País. Trata-se de uma situação inaceitável, que deve ser combatida. Infelizmente, temos vistos muitos acidentes por excesso de jornada, que leva muitas vezes ao uso de drogas”, frisou.

1 COMENTÁRIO

Comentários encerrados