Major Luiz Eduardo Ulian Junqueira da Polícia Militar do Estado de São Paulo foto: Divulgação

Artigo: Por Major Luiz Eduardo Ulian Junqueira*

São Paulo é o estado que possui a maior e mais complexa malha rodoviária estadual do Brasil, com mais de 22.000 quilômetros de rodovias pavimentadas; possui a responsabilidade de proteção de todos os 645 municípios, cujo cenário permite o tráfego de boa parte da economia do país.

Essa estrutura viária e, na sua maior parte, urbanizada, pujante, no aspecto econômico e social, recheada por indústrias, terminais de petróleo, estabelecimentos bancários, aeroportos, estabelecimentos prisionais, chama a atenção e desperta o interesse de organizações criminosas por crimes que propiciem acesso a somas alentadas de dinheiro.

O reconhecimento dessa heterogeneidade e de situações potenciais que se originam dessa diversidade, presentes nos ambientes urbano e rural, constitui um forte arcabouço, teórico e prático, diante da importante tarefa de se construir estratégias policiais.

Diante dos crimes ultraviolentos contra o patrimônio (UVP), que apresentam, como característica principal, a insubmissão às forças policiais, por vezes, incrementados com a utilização de veículos blindados, fuzis, metralhadoras, uso de reféns como escudos-humanos, produzem danos sociais que vêm sendo alvo de atenção de gestores públicos, jornalistas, da academia e da sociedade.

Os impactos negativos decorrentes desses eventos, tais como perdas de vidas, danos materiais e prejuízos econômicos, geram uma preocupação enorme para as instituições de segurança pública.

Cada etapa de enfrentamento desse tipo de crime extremo é essencial para a minimização de impactos negativos. Atualmente, o monitoramento e controle dos crimes UVP são realizados preferencialmente de forma reativa, por cada unidade impactada, geralmente em reuniões com esse objetivo. Nessas situações, há oportunidade para que sejam manipulados documentos e ouvidos alguns atores que participaram efetivamente da ocorrência que envolvia esses crimes.

A Gestão de Riscos[1] (GR), nesse contexto, emerge e fornece ao seu usuário conhecimentos organizados e processados com metodologia própria, aventando-se a possibilidade de ações e medidas de prevenção ou correção dos possíveis problemas detectados nos processos ou áreas em que a organização atua.

Posto isso, acredita-se ser possível, seguindo uma metodologia adequada, e por conseguinte, respeitando a experiência de nossos policiais, diminuir gradativamente o grau de subjetividade no processo decisório, até mesmo porque a tolerância ao risco é estabelecida pelo próprio Comandante[2].

A ideia de Segurança Pública, inerente à missão policial, estabelecida pela Constituição Federal de 1988, constitui uma verdadeira garantia que o Estado oferece aos cidadãos, por meio de organizações próprias, dentre elas, as Polícias Militares Estaduais, contra todo o perigo que possa afetar a ordem pública, em prejuízo da vida, da liberdade e da propriedade.

2 – AS FERRAMENTAS DE GESTÃO DE RISCOS

Por meio do advento da “nova gestão pública”, termos, como Governança, integridade, compliance e gestão de risco, estão sendo incorporados gradativamente ao processo decisório da Administração Pública, de forma a atender aos complexos desafios atuais.

Não há dúvidas de que a atividade policial é arriscada. Nesse sentido, pode-se afirmar que o gerenciamento de riscos está relacionado à diminuição de incertezas. É crucial que o policial tome decisões com base no máximo de informações alcançáveis, a fim de que assuma uma posição de vantagem no teatro de operações.

O cotidiano do policial, após uma vivência acadêmica, não é fácil, porém, é possível raciocinar de maneira lógica e sobre o contexto dos crimes UVP, uma vez estabelecidas as causas e consequências que deram origem ao problema, ou ao menos sua hipótese mais provável. É necessário definir de que forma ocorrerá a intervenção para que sejam alcançados os melhores resultados.

Com esse objetivo, foram selecionadas algumas ferramentas de gestão de riscos, que podem ser utilizadas por cada Comandante, a fim de identificar, avaliar e gerir riscos, pois, quanto mais estruturada estiver a instituição e mais madura for a estrutura de gestão de riscos, maior será a segurança de atuação.

2.1 Mapa de Riscos

O mapa de riscos é uma ferramenta que permite avaliar os riscos segundo os critérios ou parâmetros fornecidos pelos especialistas, técnicos ou responsáveis pela identificação do risco.

O mapa deve refletir a análise dos riscos para permitir uma visão holística, isto é, indicar o risco no momento anterior ao tratamento e sua situação atual.

Os riscos podem ser filtrados para a organização ou o departamento tanto quanto as oportunidades ou ameaças e outros mecanismos de agrupamento que facilitem a visualização do problema.

No exemplo acima, os círculos escuros (preenchidos) representam o momento anterior – da identificação dos riscos – e os claros, o momento atual. Os números indicados dentro dos círculos representam a quantidade de riscos relacionados. O departamento 2, por exemplo, manteve a quantidade de riscos do momento anterior, porém, seus riscos tiveram nível de impacto elevado, o que ocasionou reposicionamento no gráfico, saindo de impacto leve para moderado.
Nesse formato, após os riscos serem devidamente identificados e registrados, com o objetivo de permitir o levantamento das possíveis causas e consequências, além da sua classificação quanto à categoria e natureza, segue o processo de sua avaliação quanto à probabilidade versus impacto. O azul indica a normalidade do risco, o verde, a mínima urgência, o amarelo requer atenção e, por fim, o vermelho caracteriza os riscos mais urgentes.

2.2 Relatórios Sumarizados

O intuito dos relatórios sumarizados é fornecer informações aos tomadores de decisão com uma visão sintética sobre o quantitativo dos riscos no momento de sua identificação (momento anterior) e momento atual, bem como uma comparação entre esses dois momentos. Essa técnica apresenta o somatório das ameaças e oportunidades por meio de um filtro.
A imagem a seguir apresenta esse conjunto de informações em quatro departamentos de uma organização qualquer, diante de um determinado período.

Nesse cenário, observa-se que o Departamento 1 manteve a quantidade de ameaças do momento anterior, mas identificou uma oportunidade atual. Já o Departamento 2, resolveu uma ameaça e concluiu uma oportunidade.

O relatório sumarizado não contém a gravidade dos riscos, mas a quantidade de riscos e oportunidades a que os departamentos estão expostos.

Essa técnica permite uma visão rápida e ampliada de quais departamentos estão enfrentando mais problemas e requerem mais atenção. Em conjunto com esse tipo de relatório, devem ser desenvolvidos textos sucintos e explicativos quanto aos riscos e oportunidades identificados.

2.3 Comunicações e mensagens de alerta

Na sequência do registro quantitativo dos riscos, um conjunto de informações, como data de levantamento, proximidade e última atualização, podem contribuir para que revisões sistemáticas ocorram. Por exemplo, um risco grave que não é atualizado há mais de 07 dias pode ocasionar um problema. Nesse caso, é recomendado que os riscos sejam frequentemente revisitados para atualizar as informações do registro.

Um outro exemplo corresponde aos riscos que estão próximos à data-limite de solução. Por meio das mensagens de alerta, pode-se manter atentos os tomadores de decisão. Nesse contexto, destaca-se a utilização de sistemas de informações que podem ser criados para alertas específicos por e-mail ou por outro canal de comunicação, notificando os gestores dos riscos na condução de suas atividades.

Os mecanismos virtuais de comunicação constituem um meio prático de comunicação entre todos os gestores e colaboradores, pois possibilitam que todos tirem dúvidas, conversem com especialistas e, acima de tudo, permitem que a liderança converse com a equipe de trabalho.

2.4 Árvore de decisão

Entre os modelos mais práticos que contribuem para o processo de tomada de decisão, têm-se a árvores de decisão.

O método caracteriza-se por sistematizar uma série de fatos, riscos, probabilidades e oportunidades – relacionados a uma situação, objetivo, metas ou, em maior escala, programas e projetos – cujos efeitos devem ser reconhecidos, manipulados e comparados.

O método ainda garante que a qualidade de todas as decisões seja influenciada por: precisão das informações; qualidade dos julgamentos e avaliações; fatores de probabilidade; e atitude do tomador de decisão em relação ao gerenciamento de risco.

As árvores de decisão tomam a forma de diagramas e estruturam um mapa com possíveis escolhas para a melhor ação. A ferramenta, ainda que na sua forma simples, pode proporcionar lógicas à escolha de cursos alternativos de ação/decisão.

A árvore é útil, não somente por organizar os fatores de influência, na problemática em questão, mas, também, por estimular a imaginação e o aprofundamento no exame de elementos cruciais dessa tecnologia, revelando pontos de possíveis impactos e consequências.

Além disso, é um método auxiliar de checagem e de desafio de medidas empreendidas, pois permite a codificação de impactos por outros meios independentes de análise.

2.5 Brainstorming

É uma técnica criada em 1953, por Alex Osborn[3], focada na resolução de problemas ou na expansão das ideias. Um grupo de pessoas reúne-se e, com base em seus pensamentos e sugestões, aventa-se a possibilidade de se chegar a um consenso sobre o caso em estudo.

O primeiro passo da técnica e, talvez, o mais importante, é garantir a definição do problema, pois, somente assim, será possível planejar ações corretivas.

Entre outras vantagens do brainstorming[4], é possível destacar a sua capacidade de germinar as causas para os problemas, ajudar a decidir um passo a passo no desenvolvimento de um projeto e reconhecer oportunidades, além de encorajar a participação de todos, considerando que não é permitida censura por parte dos demais participantes. A grande sacada é o processo de adaptações e aperfeiçoamentos de ideias, que podem, inclusive, servir de inspiração para  a solução de outras problemáticas.

É uma técnica usada para desenvolver ideias criativas e inovadoras. Todos os membros do grupo apresentam sugestões de uma forma aleatória, enquanto uma pessoa registra as ideias, sem crítica. O processo permite o surgimento de novas ideias, aumenta o surgimento de ideias incluindo as não familiares, estimula a sinergia e desencoraja a avaliação. O brainstorming escapa dos limites do pensamento lógico e transcende as restrições da tradição, do tempo, de recursos e de precedentes. (BOHLANDER; SNELL; SHERMAN, 2003).

Uma variação do brainstorming é o brainwriting, sendo que a diferença básica entre as duas ferramentas é o fato de que, na segunda, as opiniões e ideias são apresentadas pelo grupo por escrito (MARSHAL JR et al., 2006).

É excelente para captar o pensamento criativo de uma equipe; nela, o importante é a quantidade de ideias apresentadas, não a qualidade (ARAUJO, 2008, p. 243).
O brainstorming pode ser feito da seguinte forma:
i. transcrever todas as ideias;
ii. todas as ideias devem ser expostas ao mesmo tempo;
iii. todos devem concordar com a questão;
iv. escrever as palavras de cada participante;
v. decidir em conjunto qual a melhor opção dentre as alternativas.

Além disso, pode ser de dois tipos:

i. estruturado: há uma metodologia para que as ideias sejam manifestadas; tem como vantagem fazer com que todos participem; por outro lado, tem como desvantagem exercer pressão nos participantes.

ii. não estruturado: as ideias são manifestadas espontaneamente, sem uma metodologia específica; tem como principal vantagem ser uma reunião mais tranquila, sem pressão; no entanto, tem como desvantagem maior não ter a participação de todos, já que os colaboradores mais tímidos podem ficar calados, enquanto os mais expansivos podem monopolizar o levantamento das alternativas, tornando seu resultado tendencioso.

Cabe ao condutor do brainstorming definir o método de levantamento de dados, a depender da complexidade do problema e do perfil dos participantes.

2.6 Análise de  cenários

A principal função das análises de cenários é o reconhecimento do contexto (interno e externo). no qual a organização está inserida. Os cenários são imagens alternativas do futuro que favorecem o processo decisório e, ainda, configuram futuros possíveis ou prováveis, por meio de simulação e desdobramento de certas condições diferenciadas e exteriorização dos eventos que levariam à sua concretização.

No desenvolvimento dessa metodologia, recomenda-se a utilização, em conjunto, dos procedimentos da Análise SWOT[5] – Strenghts (Forças), Weakness (Fraquezas), Opportunities (Oportunidades) e Threats (Ameaças), que fortalecem a apuração e a formulação das estratégias organizacionais.

A ideia é ter uma imagem, de modo completo e integrado, dos possíveis contextos fáticos, com base na análise ambiental e, para cada necessidade detectada, deve-se estudar os óbices que dificultem ou impeçam o alcance do objetivo visado.

Os cenários, assim, na sua essência, são uma abordagem analítica e especulativa que, como complementação da tomada de decisão, servem para explicitar as premissas, para integrar variáveis e facultam levantar incertezas, diante da participação dos diversos atores, os quais podem, de alguma forma, favorecer ou se opor ao atingimento dos objetivos.

A atitude prospectiva significava olhar longe, preocupar-se com o longo prazo; olhar amplamente, tomando cuidado com as interações; olhar a fundo até encontrar os fatores e tendências que são realmente importantes; arriscar, porque as visões de horizontes distantes podem fazer mudar nossos planos de longo prazo; e levar em conta o gênero humano, grande agente capaz de modificar o futuro. (GODET, 1996, grifo nosso).

Quando a realidade se apresenta simples e sem maiores incertezas, o senso comum pode ser empregado satisfatoriamente e sem maiores surpresas na solução dos problemas da decisão. Entretanto, quando a realidade se torna complexa, o senso comum pode tornar-se errático e a escolha de um critério para respaldar a decisão deve ser deixada para o gestor, que buscará encontrar nele uma ferramenta auxiliar para a solução de problemas de decisão.

Na definição de Porter (1992, p. 436), vislumbram-se as seguintes opções estratégicas:
apostar no cenário mais provável – a estratégia será baseada no cenário de maior probabilidade de ocorrência – estratégia adotada pela maioria das empresas; apostar no melhor cenário – definir a estratégia baseada naquele cenário que a organização acredita ser o melhor para o seu posicionamento competitivo futuro; buscar robustez, ou seja, definir a estratégia que produza resultados satisfatórios em todos os cenários; buscar flexibilidade. Neste caso, adota-se uma estratégia flexível até que o cenário mais provável se torne aparente para a empresa; influenciar a ocorrência do melhor cenário, estratégia pela qual a organização busca aumentar a probabilidade de ocorrência do melhor cenário; combinar algumas das alternativas anteriores (grifo nosso).

Decidir é escolher um plano de ação, uma estratégia, à luz do entendimento e do conhecimento que se tem na realidade presente. Isso deve ser feito associado com a visão das circunstâncias futuras, com base na experiência e nos conhecimentos do passado, que direcione, selecione a trajetória e encaminhe o processo ao encontro da escolha, dos objetivos.

Os grandes tomadores de decisão, da mesma forma que os jogadores de xadrez, não fazem o movimento que rende a maior vantagem imediata, mas o movimento que, muitas etapas depois, oferecerá a melhor, a mais esmagadora posição.
Na definição do plano de ação, sugere-se, pela simplicidade, a adoção da metodologia 5W2H e que se busque o cenário mais provável na condução do planejamento operacional.

Os “w” e os “h” significam as ações e os requisitos relacionados à missão:
i: what (o quê): o que será feito;
ii. who (quem): quem realizará as atividades;
iii. where (onde): local em que essas atividades serão realizadas;
iv. when (quando): definição do tempo para cada atividade;
v. why (por quê): determinação dos motivos das ações;
vi. how (como): como serão realizadas as atividades;
vii. how much (quanto): quais os valores gastos na atividade.

O enfoque de sensibilização – planejamento é a base para o diagnóstico de qualquer situação em que se queira implementar uma metodologia de construção de cenários prospectivos, cabendo, tão somente, a preocupação de adaptá-los à realidade de cada gestor.

Em estudo realizado por dois pesquisadores (Elaine Coutinho Marcial e Alfredo José Lopes Costa), no ano de 2001, por ocasião do artigo científico “O uso de cenários prospectivos na estratégia empresarial: vidência especulativa ou inteligência competitiva?”, oportunidade em que estudaram os efeitos da inteligência competitiva como aliada do processo elaboração de cenário estratégico e sua compreensão metodológica pelos dirigentes do Banco de Brasil (BB), evidenciaram que:

Em função da rapidez com que o macroambiente está se modificando, as empresas têm sido mais afetadas por ele do que pelo ambiente de sua própria indústria. Por isso, tem crescido a necessidade de monitoração ambiental, que, segundo Stoffels (1994), constitui conjunto de técnicas capazes de transcrever as questões da competitividade externa à empresa, as quais dizem respeito às variáveis social, política, econômica e tecnológica – que podem ser difíceis de se observar ou diagnosticar, mas não podem ser ignoradas. (MARCIAL; COSTA, 2001, grifo nosso).

Do total de 58 entrevistados:

i. 36% dominam a metodologia, desenvolvem e aplicam;
ii. 35% reconhecem, desenvolvem e buscam domínio da metodologia;
iii. 14% reconhecem a importância, mas não aplicam;
iv. 2% desconhecem cenários e, portanto, não aplicam.

Na conclusão, o estudo demonstra a seguinte menção:

Os testes aplicados demonstraram que a turbulência ambiental verificada no sistema financeiro tem levado os executivos do BB a se preocuparem com o curto prazo e, portanto, demonstrarem pouco interesse em “pensar o futuro”. A questão relacionada com o estímulo do pensamento estratégico e o estabelecimento de uma visão de futuro ficou classificada, quanto à sua moda, em último lugar na ordem de prioridades. Para modificar isso, é preciso criar no BB uma linguagem unificada sobre os diversos conceitos que envolvem as técnicas de cenários de modo que não haja dúvida quanto aos termos utilizados. (MARCIAL; COSTA, 2001, grifo nosso).

Ora, pensando nas mudanças constantes que as corporações policiais enfrentam, levando-se em consideração as magnitudes dos desafios, cada vez mais distintos e complexos, e, ainda, face à probabilidade de sofrer lesões graves, traumas e mortes, por ocasião da postura dos ativos operacionais, diante das ocorrências que envolvem os crimes UVP, não restam dúvidas de que a noção de risco, para essas ocorrências, vai além do cotidiano ordinário de um policial. Isso é um verdadeiro “risco epidemiológico”, o qual deve ser combatido com o remédio certo.

Os policiais devem valer-se da força quando necessário e, sobretudo, devem recorrer às técnicas procedimentais e de inteligência policial. Nesse sentido, a construção de cenários prospectivos ajuda bastante, pois permite um verdadeiro enriquecimento institucional em termos operacionais.

3 – A MODELAGEM DE PLANOS PREVENTIVOS OU DE PREPARO EMERGENCIAL

A Gestão de Riscos antecede as etapas de Gestão do Incidente (eclosão do crime), sendo composta basicamente das fases de prevenção e preparação emergencial. Uma terceira perspectiva de mitigação de danos é efeito direto da execução bem-feita das etapas anteriores.

Atualmente, o monitoramento e controle dos crimes UVP são realizados preferencialmente de forma reativa, por cada unidade impactada, geralmente em reuniões com esse objetivo, oportunidade em que são manipulados documentos e ouvidos alguns atores que participaram efetivamente da ocorrência que envolvia esses crimes.

Por mais que essa prática produza algum resultado e, ainda, considerando que algumas unidades já estão avançando em termos de preparação, em função da realização de simulados, faz-se necessária a utilização de novos instrumentos que possam incrementar ainda mais a preparação do efetivo policial, em função dos perfis dessas ocorrências.

Nesse contexto, a utilização de indicadores de prevenção é primordial para a redução dos danos sociais, pois possibilita a correção de falhas durante o processo de atuação preventiva, logicamente já antecedido de uma cuidadosa fase de escolha desses indicadores, que organiza a etapa de preparação emergencial, de modo a receber com segurança a fase seguinte de gestão do incidente.

Essa metodologia visa aprimorar ainda mais o sistema de atendimento dos crimes UVP, antes que eventos negativos atinjam policiais e civis, pois, por mais que a coleta de dados quantitativos constitua uma etapa fundamental do processo de análise criminal, ela é somente a primeira etapa de uma construção que envolve vários atores do sistema de segurança pública.

Na atualidade, existe amplo reconhecimento da comunidade científica, de que nenhuma organização pública ou privada, com fins militares ou civis, funciona bem sem um capital humano apto a desenvolver com eficácia, eficiência e efetividade as atividades que lhe são destinadas, quiçá, a situação piora bastante, quando seus olhares não conseguem aprimorar ou traçar ações de prevenção da criminalidade, se esse for o negócio principal de sua atividade.

Para que o planejamento seja bem-sucedido, torna-se necessário verificar quais são os elementos condicionantes no alcance dos objetivos pretendidos. A análise do perfil e o aspecto estrutural de cada unidade operacional permite aferir o foco e a flexibilidade, isto é, com foco de atuação, a unidade identifica o ponto de convergência de esforços e, com a flexibilidade, alcança a capacidade de ajustamentos à medida que o andamento do incidente requeira.

Como se pode prever, um planejamento estruturado oferece uma série de vantagens operacionais, inclusive, melhora a flexibilidade, a coordenação e administração do tempo. Os itens a seguir, além de ampliarem a consciência situacional, permitem alocar os recursos utilizados para conseguir a melhor vantagem operacional possível.

Os meios disponíveis (usados atualmente) e os potenciais (que podem ser alcançados com tempo) fazem parte da análise do ambiente de atuação das unidades territoriais ou especializadas. O ambiente tem a propriedade de determinar a natureza do desenho da força e do comportamento dos ativos operacionais. Quando os ativos operacionais trabalham no ambiente de certeza, pequenas mudanças operacionais podem se ajustar perfeitamente à demanda, porém, diante dos crimes UVP, que envolvem atividades complexas e diferenciadas, há necessidade de uma estratégia que conduza para o crescimento ou expansão controlada das ações, em razão da complexidade, fluidez e incerteza do ambiente.

As necessidades das unidades territoriais ou especializadas estão relacionadas com as carências que devem ser atendidas (tecnológicas, humanas, treinamentos, equipamentos, dentre outras) e que possam auxiliar, no futuro, o processo de prevenção e de preparo emergencial em relação aos crimes UVP. O propósito principal é colocar a estrutura operacional a serviço do ambiente, da estratégia, da tecnologia e dos ativos operacionais, ou seja, o atendimento das necessidades deve ser capaz de organizar e articular os recursos no sentido de buscar a adequação de todas as múltiplas circunstâncias que possam servir ao processo de redução de riscos.

Os óbices de preparo preventivo ou de esboço emergencial são os fatores adversos ou antagônicos que dificultam ou impedem o planejamento das ações preventivas ou de preparo emergencial, por parte das unidades territoriais ou especializadas. A noção dos óbices levará necessariamente à priorização de tarefas e quais serão executadas com maior segurança operacional. Por meio de um cuidadoso planejamento de contingência, é possível antecipar possíveis cenários e articular uma resposta eficaz, antes que aconteçam. Uma equipe bem-informada, treinada e que entende as ações que serão executadas, já considerando os possíveis óbices, evita que o sistema de policiamento seja sobrecarregado com decisões arriscadas e improvisadas, bem como viabiliza um comando descentralizado eficaz.

A Gestão do Conhecimento, baseada em lições aprendidas e troca de experiências, permite uma metodologia eficiente para elaboração e disseminação dos planos de ações. No campo de batalha que envolve os crimes UVP, inúmeros problemas somam-se, pois as ações, além de complexas por si só, exigem extrema atenção. As decisões tomadas nessas ocorrências, em função do ambiente de pressão e risco, além de gerar estresse, exigem decisões rápidas e esse processo pode sobrecarregar nossos Comandantes. Por isso, todo planejamento começa com a análise da missão e principalmente das lições aprendidas. Os Comandantes devem cultivar diretrizes claras para suas equipes.

Na liderança de uma unidade territorial ou especializada, os Comandantes devem assumir que, no planejamento, sempre haverá algum tipo de risco, o qual deve ser considerado em todas as suas circunstâncias. A Gestão do Conhecimento não permite minimizar a importância de nenhum aspecto e serve para preparar a equipe para as contingências mais prováveis, de forma a maximizar o sucesso da missão e mitigar os riscos inerentes aos ativos operacionais.

Uma vez desenvolvido um plano de ação preventivo ou de preparação emergencial, eles devem ser comunicados a toda a equipe e unidades envolvidas; ademais, deve-se proporcionar o conhecimento sobre as ações aos demais participantes e elementos de apoio nas ações.

Um bom resumo das ações permitirá aos participantes da operação entenderem a estratégia, o intuito do Comandante, a missão das equipes e seus papéis; ainda, isso oportunizará uma correta compreensão das contingências – desafios que podem surgir e como reagir a eles.

A fase pré-incidental – antes da eclosão do incidente, baseada em estudo e voltada essencialmente ao aspecto preventivo – destina-se essencialmente à proteção territorial da área a ser atingida.

A unidade deve acionar o plano de defesa territorial do município impactado e dos municípios do entorno; deve reforçar a guarda dos quartéis e manter efetivo exclusivo para as comunicações; deve definir pontos seguros para o comandamento e posicionamento das patrulhas; deve estabelecer limite de atuação para cada unidade de serviço; realizar preparação prévia do terreno e locais possíveis de serem atacados; realizar o mapeamento das propriedades rurais e hotéis; realizar a checagem dos sistemas de monitoramento e sua correta funcionalidade – operador em condições de transmitir informações em tempo real (GCM, Concessionárias, Quartéis, propriedades públicas ou particulares); checagem dos sistemas de comunicação de emergência – única canaleta para todos; patrulhamento tático e bloqueios preventivos em camadas – proximidades dos locais, entradas dos municípios, praças de pedágios e estradas.

A fase de preparação emergencial – após o conhecimento do fato e que precede o deslocamento das equipes para o teatro de operações, ou seja, constitui-se de um verdadeiro preparo para o primeiro atendimento – destina-se à realização do plano de cerco local e do plano de cerco regional, isto é, no município atingido e naqueles que estiverem no entorno, sob a coordenação do COPOM.

Os Comandantes devem estar preparados para compreender todas as variáveis do ambiente de uma vez só. Essa fase permitirá uma segurança operacional antes de assumirem o comandamento e interpretação do ambiente. Os atuais problemas cotidianos de deslocamentos emergenciais ou sem uma estratégia definida serão mitigados nesse momento. Ao selecionar e perceber o seu ambiente de atuação, previamente definido, permitirá reduzir a dissonância e manter a consonância entre as patrulhas. Os estudos demonstraram que deslocamentos antecipados e sem uma compreensão plena do teatro de operações, na melhor das hipóteses, nunca deixaram de favorecer os infratores.

A fase pós-incidental destina-se às providências de registro da ocorrência, checagem de pessoas feridas, preservação do local de crime, recolha de cédulas e materiais deixados durante a fuga, checagem da existência ou não de explosivos secundários e não detonados, inclusive, no interior de veículos abandonados, recolhimento das imagens junto aos sistemas de gravações, checagem de veículos abandonados, presença de fugitivos em matas, feridos em hospitais ou que tenham se homiziado em propriedades particulares e checagem de túneis.

Para que as três fases anteriores funcionem de forma sincrética, deve haver uma identidade entre as atividades de treinamento e mobilização. Uma contingência significa algo incerto ou eventual, que pode suceder ou não, dependendo das circunstâncias. Os crimes UVP exigem uma percepção ambiental peculiar para os ativos operacionais. Há alguns riscos que não podem ser mitigados, porém, planos detalhados ajudam a gerenciá-los, porque todos os envolvidos, direta ou indiretamente nas ações, saberão superar ou contornar os óbices quando surgirem, ou, até mesmo, saberão controlar as situações, quando algo der errado.

4 – CONCLUSÃO

É primordial que todos os níveis de comando acessem os conhecimentos que envolvem a Gestão de Riscos e apropriem-se desses conhecimentos.

Os primeiros respondedores quase nunca possuem a imagem completa ou uma compreensão clara e certa das ações ou reações dos infratores que praticam os crimes UVP. O primeiro contato, como demonstrado neste artigo, pode ser o disparo perverso e o impacto violento dos tiros recebidos.

É fundamental que os Comandantes e o efetivo subordinado tomem as melhores decisões possíveis, ou seja, com base nas informações a que têm acesso, devem agir de forma decisiva em meio à incerteza.

A coleta e as informações de inteligência são importantes, mas devem ser empregadas com expectativas realistas. Os Comandantes e os ativos operacionais devem estar aptos a criar cenários com base em experiências anteriores, acessando conhecimento sobre o modus operandis dos criminosos, a fim de ter a inteligência disponível para emprego imediato. Esse modo de agir faz uma enorme diferença, pois nossos policiais enfrentam situações de vida ou morte, sendo nossa obrigação trazê-los vivos das missões.

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REFERÊNCIAS

ARAUJO, L. C. G. de. Organização, sistemas e métodos e as tecnologias de gestão organizacional. vol. 1. São Paulo: Atlas, 2008.

BECK, U. Risk Society: Towards a New Modernity. Londres: Editorial Sage, 1992.

BOHLANDER, George; SNELL, Scott; SHERMAN, Arthur. Administração de recursos humanos. Tradução Maria Lúcia G. Leite Rosa. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2003, p. 547.

GODET, Michel; Creating the future: The use and misuse of scenarios. Long Range Planning, v. 29, n. 2, p. 164-171, 1996.

MARCIAL, Elaine C.; COSTA. Alfredo J. L.; O uso de cenários prospectivos na estratégia empresarial: vidência especulativa ou inteligência competitiva? Disponível em: http://www.anpad.org.br/admin/pdf/enanpad2001-eso-152.pdf. Acesso em: 24 abr. 2022.

MARSHALL JR., Isnard; CIERCO, Agliberto A.; ROCHA, Alexandre V.; MOTA, Edmarson B.; LEUSIN, Sérgio. Gestão da qualidade. 8. ed. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2006, p. 169.

BERMEJO, Paulo Henrique de Souza. ForRisco: gerenciamento de riscos em instituições públicas na prática. Brasília/DF: Editora Evobiz, 2018.

PORTER, Michael E. Vantagem Competitiva: criando e sustentando um desempenho superior. 7. ed. Rio de Janeiro : Campus, 1992.

[1] De acordo com Beck (1992), riscos “são formas sistemáticas de lidar com os perigos e as inseguranças induzidas e introduzidas pelo próprio processo de modernização”.

[2] A partir desse momento, será dado destaque proposital à expressão “Comandante(s)” grafado(s) em letra maiúscula,  visando ressaltar a importância da função e não apaziguar sua responsabilidade.

[3] Alex Faickney Osborn foi um publicitário dos Estados Unidos. Foi o autor de uma importante técnica de criatividade denominada brainstorming.

[4] O brainstorming ou tempestade de ideias, mais que uma técnica de dinâmica de grupo, é uma atividade desenvolvida para explorar a potencialidade criativa de um indivíduo ou de um grupo – criatividade em equipe – colocando-a a serviço de objetivos pré-determinados.

[5] Análise SWOT é uma técnica de planejamento estratégico utilizada para auxiliar pessoas ou organizações a identificar forças, fraquezas, oportunidades e ameaças, relacionadas à competição em negócios ou planejamento de projetos.

(*) Major Luiz Eduardo Ulian Junqueira é doutor em Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública e mestre em Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública. Além de ter Curso de Especialização Profissional em Trânsito Rodoviário e longa experiência nas rodovias paulistas