“O motorista comete os atos de imprudência porque tem a certeza de que não vai ser pego. Não temos condição de fiscalizar tudo, por conta do baixo efetivo”, desabafa um agente da Polícia Rodoviária Federal (PRF) que trabalha na BR-040. A afirmação ilustra a situação presenciada pelo EM nos mais de 1 mil quilômetros percorridos durante a produção da reportagem. Em pelo menos dois postos da PRF, o plantão policial tem apenas dois agentes, que precisam fiscalizar a conduta dos motoristas, atender acidentes, aplicar os testes do bafômetro e ainda fazer o trabalho administrativo. O detalhe é que em muitos postos a atribuição da dupla que está de plantão se estende a mais de 300 quilômetros. A cúpula da PRF admite que a situação gera uma sensação de impunidade e contribui para manutenção do perigo nas estradas, principalmente para aqueles que não têm experiência.

A situação é tão grave que alguns postos estão vazios, sem policiais. Em Campos Altos, no Alto Paranaíba, a estrutura da PRF na BR-262 está desativada por conta da falta de pessoal, segundo policiais da corporação. Uma viatura permanece na porta, mas quem faz o policiamento do trecho, que deveria ser coberto pelos agentes de Campos Altos, são equipes de Bom Despacho (Centro-Oeste) e Araxá (Triângulo). A mesma situação é encontrada no posto da PRF de João Pinheiro, na BR-040, Noroeste de Minas. Como o local está fechado, quem se desdobra são os policiais de Paracatu e Três Marias. “Nós trabalhamos 24 horas sem parar. Às vezes, estamos em um acidente na ponta do nosso trecho quando ocorre outro a quase 200 km de distância. E nesse meio-tempo também temos que fiscalizar as infrações, despachar o malote com as multas até a delegacia, entre outros”, afirma outro policial que atua na 262.

A prova de que o aumento na fiscalização contribui para a diminuição nos acidentes e mortes nas rodovias pode ser observada no trecho de mais de 300 km da BR-365 de responsabilidade da delegacia da PRF de Patos de Minas. Segundo o inspetor Sérgio Pereira Borges, chefe da delegacia, em 2010 foram 500 acidentes no trecho com 75 mortos. No mesmo período, a PRF emitiu 3.920 multas, com destaque para as ultrapassagens proibidas, que somaram 952 infrações. Já em 2012, foram pouco mais de 4 mil infrações, sendo que as ultrapassagens proibidas subiram para 1,3 mil. Também no ano passado morreram 32 pessoas em 415 acidentes, em uma redução de 57% nas mortes e 17% nos acidentes.

Gerenciamento estratégico

A assessora de comunicação da PRF, inspetora Fabrizia Nicolai, afirma que os postos de Campos Altos e João Pinheiro estão sendo usados esporadicamente enquanto a PRF ajusta o quadro de pessoal. Segundo ela, é normal que os postos sejam fechados no momento que os policiais saem para atender acidentes e fiscalizar os trechos. “A PRF tem trabalhado com o gerenciamento estratégico de seus meios materiais e humanos. De acordo com as diretrizes da corporação, a viatura em ronda pode oferecer uma sensação de fiscalização maior que estacionada no posto”, afirma a inspetora. Segundo a PRF, são 830 agentes do operacional para os 6,2 mil km em todo o estado, o que dá uma média de sete quilômetros para cada policial.

“Em relação ao nosso efetivo, como em toda corporação ligada à segurança pública, não temos o ideal. Com a retomada do concurso de 2009, Minas Gerais já recebeu mais 130 policiais e temos a previsão da chegada de outros”, diz a porta-voz da PRF. Ainda segundo a corporação, em 2013 deve ser feito concurso para o preenchimento de mais 1,5 mil vagas em todo o Brasil, mas não há informações sobre quantos agentes virão para Minas Gerais.

Lei do esperto

Na lei dos espertos, normalmente os protagonistas são os carros pequenos. O festival de desrespeito protagonizado pelos veículos de passeio é visto diariamente na BR-381, especialmente entre BH e João Monlevade, conhecido como Rodovia da Morte. Basta o tráfego ficar mais lento, situação normal no trecho de 110 km, que os mais espertos começam a tentar levar vantagem ultrapassando pelo acostamento. Em 2012, segundo os dados da PRF, foram 1,5 mil multas aplicadas a veículos transitando e ultrapassando pelo acostamento só na BR-381, ocupando a terceira posição no ranking das infrações mais cometidas. Em todas as rodovias federais de responsabilidade da PRF, que somam quase 6,2 mil km, esse tipo de infração ocupa o terceiro lugar geral. Foram mais de 5 mil registros em todo o estado.

Os espertos também aproveitam os motores possantes dos carros para fazer as ultrapassagens proibidas sem a menor cerimônia. Enquanto a reportagem transitava pela BR-262, um caminhoneiro encostou no posto da PRF de Bom Despacho para entregar o número de uma placa aos policiais. “Queria reclamar desse sujeito em uma caminhonete que me cortou na faixa dupla contínua em uma curva sem o mínimo de visibilidade. Depois colocam a culpa nos caminhões”, desabafou Ernani Silveira Caricatte, de 63, há mais de 40 como motorista profissional.

Em 2012, as ultrapassagens proibidas perderam a liderança no ranking das infrações mais cometidas apenas contando as multas aplicadas pela PRF. Apesar da falta de cinto de segurança ter assumido a primeira posição, as ultrapassagens irregulares ocupam o segundo lugar, com 6,5 mil multas. Um agente da PRF explica que onde há faixa contínua há perigo de batida em caso de ultrapassagem. “Essa situação é ainda pior quando o motorista é inexperiente ou encontra um imprudente à frente. Quem tem pouco tempo de carteira costuma não ter noção da profundidade e perde a referência para se colocar na via, aumentando o risco”, afirma o policial.