O ministro do Tribunal Superior do Trabalho, Augusto Cesar de Carvalho, que é Mestre em Direito Constitucional e Doutor em Direito das Relações Sociais e Direito do Trabalho, concedeu entrevista exclusiva ao ESTRADAS e falou sobre a exaustiva atividade profissional do transporte rodoviário de carga no Brasil. Fez um alerta importante à sociedade sobre o transporte socialmente responsável. Leia a entrevista do Ministro.

Foto - Ministro Augusto César

ESTRADAS – Frequentemente os caminhoneiros reclamam da exploração dos embarcadores e das transportadoras. Como eles podem denunciar essa exploração?

Min. Augusto César:  A exploração por qualquer empregador, além dos limites que são estabelecidos em lei, é assunto para os auditores fiscais do trabalho. Na fiscalização das estradas, une-se, a depender do caso, a Polícia Rodoviária. O empregador que exige de seu empregado além do que a lei permite prejudica não apenas o trabalhador, mas também os demais empregadores que não têm como suportar a concorrência de empresários inescrupulosos que não assumem as suas obrigações trabalhistas.  E como é natural que os empregados (motoristas e ajudantes) tenham receio de se expor à possível retaliação do empregador que age à margem da lei, os auditores do Ministério do Trabalho normalmente recebem denúncias anônimas e assim protegem o trabalhador que tem seus direitos violados e não pode aparecer, além de impedirem, por meio de autuação e até interdição, que a violação aos direitos trabalhistas continue.

ESTRADAS – Muitos caminhoneiros e transportadoras reclamam que o uso de drogas é uma concorrência desleal. Qual a sua opinião?

Min. Augusto César: A minha impressão, sobretudo após participar do seminário promovido pela Câmara de Deputados, no último dia 16 de fevereiro, é a de que o legislador agiu bem ao exigir exames de larga janela, que identificam o uso de drogas em um tempo maior. Assim, o usuário terá maior dificuldade para disfarçar uma abstinência que só teria ocorrido para que ele se preparasse para o exame toxicológico. Mas o mais importante é que haja a conscientização dos trabalhadores da estrada de que eles são os mais prejudicados quando aceitam participar desse esquema de trabalho em que droga combina com salário e também com a própria insegurança e com a insegurança das estradas. Em outros tipos de trabalho, também há empregados que aceitam reduzir o custo empresarial mediante a realização de trabalho precário ou indigno, que normalmente é mais barato. A lei ajuda, mas cabe aos empresários sérios e aos trabalhadores a coragem de, unidos, dizerem não.

ESTRADAS – Qual a responsabilidade do consumidor nesse processo, na medida em que se preocupam mais com o preço do que com o transporte socialmente responsável?

Min. Augusto César:  Essa preocupação não está relacionada somente com os produtos que chegam a nós, consumidores, pelas estradas. O consumidor quer sempre pagar menos e esse é um direito que todos nós, consumidores, temos. Sem a informação devida, não temos como adivinhar a má procedência de algo para fazermos valer nosso senso ético. Às vezes, a informação chega aos ouvidos ou aos olhos do consumidor e ele tem a possibilidade de escolher entre o produto mais caro, que provém de uma cadeia produtiva em que o ser humano é respeitado, e o produto mais barato, cuja origem remete a trabalho forçado ou degradante, a transporte em condições desumanas, à inexistência de controle de qualidade. Em outros setores do mercado, temos selos que informam a boa procedência do que consumimos, a exemplo das certificações do Inmetro, também a de produtos orgânicos e mesmo a indicação do país de fabricação é às vezes conotativa do respeito, ou desrespeito, ao trabalho humano. Talvez caiba aos atores sociais (empresários e empregados) a criatividade de instituírem um selo que distinga o produto transportado em condições adequadas daquele que não o é. A diferença do que pagaremos a mais pelo produto certificado será certamente compensada pelo ganho em cidadania, dignidade e segurança nas estradas brasileiras.