Ministro Lewandowski diz para os PRFs: "Chamem essa polícia do que quiserem!"
SITUAÇÃO DELICADA: Lewandovski cria constrangimento ao se referir ao nome da PRF dizendo: "chamem essa polícia do que quiserem" Foto: Jamile Ferraris/MJSP

Frase do ministro desagrada a policiais e especialistas em segurança viária

O ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, apresentou a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Segurança Pública, nesta terça-feira (18), durante o 9º Fórum CNT de Debates, que teve como tema Segurança Pública: Uma Nova Agenda de Prioridades Para um Transporte Mais Seguro.

Ao explicar as novas atribuições da Polícia Rodoviária Federal, que poderia ser intitulada de Polícia Viária, assumindo a responsabilidade de fiscalizar hidrovias e ferrovias, o ministro, ao perceber a presença dos policiais rodoviários federais disse:

“O nome não importa, o que importa é a função. Amanhã vocês chamam, vão lá no Congresso, lá na Casa Civil, chamem essa polícia do que quiserem. Pra mim tá tudo bem”.

Ministro detalha planos para a nova Polícia Viária Federal

O ministro da Justiça e Segurança Pública apresentou detalhes sobre a reformulação da Polícia Rodoviária Federal (PRF), que passará a se chamar Polícia Viária Federal (PVR).

Caso a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) seja aprovada pelo Congresso, a nova corporação terá como principal atribuição o patrulhamento em rodovias, ferrovias e hidrovias federais, ampliando seu campo de atuação.

Curiosamente, o ministro não mencionou a Marinha, órgão responsável pela fiscalização até do uso de jetskis em rios e lagos, quanto mais o patrulhamento em hidrovias e oceano. A Marinha, ao menos em teoria, tem mais expertise que a PRF terá para exercer esta função.

Durante o anúncio, Lewandowski destacou que a PVR não terá funções de polícia judiciária, nem será responsável pela apuração de infrações penais, atribuições exclusivas da Polícia Federal (PF) e das polícias civis.

Críticas e preocupações com a proposta

Para algumas lideranças da PRF, a medida pode representar um retrocesso, restringindo a atuação da PRF ao patrulhamento e impedindo sua participação em ações de policiamento.

Entre as preocupações levantadas está a possibilidade de a PRF ser impedida de lavrar o Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO), um instrumento essencial para agilizar o registro de infrações de menor potencial ofensivo.

Há exatamente dois anos, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) validou, por unanimidade, um decreto da Presidência da República que concedeu à PRF competência para lavrar TCOs em crimes federais de menor potencial ofensivo.

A decisão decorreu de uma ação movida pela Associação Nacional dos Delegados de Polícia Judiciária, que argumentava que a Constituição Federal atribui às polícias civis a função de polícia judiciária e a apuração de infrações penais.

Já a Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal sustentava que a PRF deveria se limitar ao patrulhamento ostensivo das rodovias, alegando que o decreto violaria a competência exclusiva da PF.

Ao confirmar a decisão do STF, o ministro Luís Roberto Barroso enfatizou que … o TCO não pode ser comparado ao inquérito policial, pois, por sua natureza investigativa, este último deve ser presidido por um delegado de polícia.

Na prática, permitir que a PRF lavre TCOs agiliza seu trabalho, evitando que agentes precisem se deslocar até a delegacia mais próxima para registrar o documento.

Em um país de dimensões continentais, essa exigência seria inviável na maioria das regiões, reduzindo ainda mais o já escasso efetivo da PRF nas rodovias. Essa ausência tende a facilitar a ação de criminosos, que se aproveitam da falta de policiamento ostensivo.

Participantes do evento criticam a fragilização da PRF

Para Rodolfo Rizzotto, coordenador do SOS Estradas e representante de entidade de vítimas de trânsito, a PRF precisa manter seu foco.

“Trata-se de uma corporação quase centenária, especializada em rodovias. Ao ampliar suas atribuições para hidrovias e ferrovias e, ao mesmo tempo, retirar funções essenciais ao trabalho policial, o governo fragiliza sua atuação na segurança viária e na redução de sinistros (acidentes). Além disso, compromete o combate ao crime organizado, cuja logística se baseia principalmente nas rodovias”, argumenta Rizzotto.

O especialista também criticou declaração do ministro Ricardo Lewandowski, que, ao se referir à mudança, disse: “Chamem essa polícia do que quiserem!”

Para Rizzotto, a fala do ministro levanta dúvidas sobre seu respeito pelo diretor-geral da PRF e pelas lideranças da corporação, inclusive as presentes fisicamente no local.

“Como magistrado oriundo do STF, Lewandowski sabe o peso das palavras. Sua declaração não pode ser considerada apenas um ato falho. Ela transmite a sensação de que o governo virou as costas para a PRF e para todo o seu efetivo. Isso pode prejudicar a segurança viária e a preservação de vidas em nossas rodovias”, alerta.

Policiais demonstram insatisfação

Ao conversar com policiais rodoviários federais sobre o tema, a reportagem constatou um ambiente de constrangimento. Muitos evitam se manifestar publicamente sobre a PEC, mas a insatisfação interna é evidente, inclusive com a falta de reação a altura de seus legítimos representantes, afinal a entidade da categoria tinha criticado duramente artigos da PEC.

Dizia a Nota Pública de 16 de janeiro de 2025, divulgada pela Federação Nacional dos Policiais Rodoviários Federais(FENAPRF)em que assinalava: “A proposta do Governo Federal não só mantém um modelo de investigação ultrapassado e ineficiente que temos hoje, baseado no obsoleto “inquérito policial”, como também ameaça comprometer os esforços de inteligência da PRF e o exitoso trabalho cooperativo entre o Ministério Público e as polícias, desenvolvido através dos Grupos de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (GAECO) em todas as unidades federativas do país.”

Durante a transmissão do evento no YouTube, as manifestações dos espectadores que acompanham via web revelou fortes críticas à proposta do ministro Lewandowski, por parte de usuários das rodovias, transportadores, especialistas em segurança viária.

Nos comentários, surgiram dezenas de questionamentos e críticas de toda ordem. Selecionamos uma sequência de posicionamentos pela ordem de manifestação durante a fala do ministro. Veja os exemplos abaixo:

André B. – “A quem interessa enfraquecer a inteligência da PRF, que viabiliza apreensões de drogas pelo país?”

Paulo Roberto Coelho – “A falta de importância dada à PRF pelo ministro é evidente.”

João Bosco Ribeiro da Silveira – “Ao restringir o poder de polícia da PRF, favorece-se o crime organizado.”

Taynah Lima – “Viajando esta semana, vi vários postos da PRF fechados. No único aberto, informaram que era por falta de efetivo.”

Marcus Rodrigues – “Portos e aeroportos também são vias de transporte. A PRF terá jurisdição sobre eles?”

Tomaz Vinícius – “No meu estado, é possível rodar 100, 200 km ou mais sem ver uma viatura da PRF.”

A PEC deve enfrentar resistência no Congresso

A proposta ainda tem um longo caminho a percorrer no Congresso Nacional. Primeiro, passará pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados. Em seguida, seguirá para uma Comissão Especial antes de ser votada no Plenário da Câmara. Caso aprovada, será encaminhada ao Senado, onde pode ser alterada e retornar à Câmara para nova deliberação.

Diante da repercussão negativa, o governo deverá enfrentar desafios para aprovar o texto original. A postura do ministro durante o anúncio também expôs sua falta de familiaridade com o tema da segurança viária, aumentando a resistência à proposta.

Pelas reações do público e dos próprios policiais rodoviários, a insatisfação com a proposta demonstra a gravidade da situação. O debate no Congresso pode acabar paralisando medidas e investimentos urgentes na Polícia Rodoviária Federal, enquanto a insegurança nas estradas cresce.

O tema promete gerar novos desdobramentos nos próximos meses.

Nota da redação: O Estradas solicitou à PRF e à FenaPRF manifestação sobre a frase do ministro. Seguem o posicionamento da corporação e entidade.

Resposta da PRF:

A Polícia Rodoviária Federal (PRF) informa que, com seus 96 anos de história, vislumbra o crescimento da instituição, e defenderá sua marca, nacional e internacionalmente. Mas é, por óbvio, a favor da ampliação de suas atribuições, consolidando ações que possibilitam o fortalecimento da Segurança Pública no Brasil.

A PRF tem atuado de forma colaborativa, contribuindo incondicionalmente com o Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) dentro de suas competências e atribuições institucionais atualmente estabelecidas, e permanece à disposição do Estado brasileiro para o que for demandada.

A PRF reafirma seu compromisso com o fortalecimento da segurança pública no país e com as iniciativas voltadas à promoção de políticas integradas e eficazes para a proteção dos cidadãos.

Att.
Coordenação-Geral de Comunicação Institucional
Polícia Rodoviária Federal

 

Resposta da FenaPRF:

“A FenaPRF deixou claro ao ministro Lewandowski que a categoria vê a manutenção da marca da Polícia Rodoviária Federal como item fundamental na PEC da Segurança Pública. É uma polícia quase centenária, que tem o policiamento cidadão como característica principal e entrega ótimos resultados à população brasileira. Outros pontos que julgamos importantes na PEC e deixamos claro ao ministro em reunião que tivemos no último dia 06, são a proteção do serviço de inteligência realizado pela PRF e a importância da previsão do policiamento ostensivo da União pela PRF no texto da PEC”, Tácio Melo, presidente da FenaPRF.

Outros posicionamentos da entidade quanto a PEC estão disponíveis nestes links:

Nota Técnica: https://fenaprf.org.br/novo/wp-content/uploads/2025/02/Nota-Tecnica-FENAPRF-01-2025-PEC-da-Seguranca-Publica-v15012025.pdf

Reunião com o ministrohttps://fenaprf.org.br/novo/fenaprf-alerta-ministerio-da-justica-sobre-riscos-da-pec-reuniao-com-ministro-sera-na-quinta/

Veja também:

 

1 COMENTÁRIO

  1. Bom dia caro amigo RODOLFO RIZZOTTO!!!
    Na qualidade de PRF aposentado, quero deixar evidente, meu agradecimento por tua manifestação em relação ao objeto da matéria em pauta e concordar em todos os aspectos em tuas palavras. A Instituição POLÍCIA RODOVIÁRIA FEDERAL, como Instituição de ESTADO, capitulada no artigo 144 da CRFB, não pode em hipótese alguma, passar por nenhuma situação vexatória que venha a diminuir todo o esforço por parte de seus integrantes de uma INSTITUIÇÃO quase centenária e que merece e exige todo respeito por essa HISTÓRIA, da qual dediquei 33 anos de minha vida à EDUCAÇÃO DE TRÂNSITO e SEGURANÇA VIÁRIA.
    HÉLIO DIAS DE SOUZA.

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