Francisco Souza Lima, 43, dirigia uma carroça às 21 horas no quilômetro 12 da BA-030, trecho entre os municípios de Brumado e Ibitira nesta terça-feira quando o pneu do seu veículo furou. O roceiro desceu do veículo para resolver o problema e foi surpreendido por um caminhão que bateu na traseira da pequena carroça. Lima morreu na hora.

Situações como esta são muito comuns nas estradas baianas, principalmente no período da noite, quando moradores da zona rural se arriscam em viagens diárias a cavalo, em carroças ou bicicletas no escuro das rodovias. Sem sinalização adequada, os pequenos veículos são constantemente atingidos por caminhões, automóveis e ônibus, e os condutores têm pouca chance de sobreviver aos acidentes, devido à falta de proteção destes meios de transporte.

O número de vítimas fatais em acidentes noturnos envolvendo bicicletas, animais ou carroças nas estradas estaduais no primeiro semestre de 2006 já supera o total de 2005. No ano passado, foram registrados 64 acidentes desta categoria, com 60 feridos e seis mortos. Neste ano, já são 29 acidentes, com 24 feridos e sete mortos, de acordo com levantamento da Polícia Rodoviária Estadual.

Acidentes com bicicletas e outros veículos de pequena proteção, como carroças utilizadas para transportar entulhos, também são comuns nas vias urbanas da capital baiana. Dados da Superintendência de Engenharia de Tráfego (SET) revelam que de janeiro a julho de 2005, foram registrados 264 acidentes envolvendo bicicletas e 34 com transportes de pequeno porte. Em 2006, o número de acidente envolvendo bicicletas caiu para 189 no mesmo período, mas aumentou para 48 o número de ocorrências com veículos de pequena proteção.

Perigo nas rodovias – As estatísticas preocupam as autoridades das polícias rodoviárias estadual e federal, que admitem enfrentar dificuldades para reduzir os índices de acidentes noturnos nas estradas. “É muito difícil conscientizar a população da zona rural dos perigos desta prática. Apesar de ser proibido por lei o uso de bicicletas e de carroças sem sinalização nas rodovias, que muitas vezes esse são os únicos meios de transporte de pessoas, que nem sempre podem evitar viagens noturnas”, pondera o comandante de policiamento especial da polícia rodoviária estadual, Wellington Müller Andrade.

O inspetor da Polícia Rodoviária Federal, Rogério Tosta, destaca que a pouca visibilidade do motorista é agravada à noite pelo ofuscamento gerado pelos faróis dos demais veículos e pelo cansaço. Segundo a polícia, o monitoramento diário das estradas nem sempre é possível, mas eventualmente, essas situações são identificadas.

“É difícil ter um controle efetivo desta prática, mas sempre que localizamos carroças, bicicletas ou pedestres transitando pelas estradas à noite, orientamos para que estas pessoas utilizem estradas de chão e, quando possível, retiramos elas das pistas”, explica. Tosta acrescenta que os pedestres devem evitar transitar pelos acostamentos das rodovias, mas quando for inevitável, devem optar pela fila indiana. O órgão não soube informar a média de registros de acidentes nas estradas federais durante o período da noite.

Conscientização – O Subcomandante do batalhão da Polícia Rodoviária Estadual, Capitão Teixeira, alega que os trabalhos de conscientização da população rural, realizados pelo órgão, operam em duas frentes de ação: o alerta para o perigo das caravanas de romarias nas estradas, quando centenas de pessoas saem em vigílias de comemoração religiosa, e a constante presença de animais nas pistas.

“Temos visitado diversos municípios do estado e conversado com autoridades religiosas para que aluguem ônibus para transportar os fiéis, e não utilizem o pau-de-arara, que não oferece nenhuma segurança para estas pessoas”, esclarece Teixeira, que teme a ocorrência de acidentes deste tipo em meados de setembro.

Naquele mês, cerca de 200 mil moradores de Bom Jesus da Lapa seguirão em procissão de homenagem a São Cosme e Damião em veículos pau-de-arara, que não oferecem garantia de segurança.

A resolução 82/98 do Código Brasileiro de Trânsito (CBT) autoriza o transporte de pessoas em veículos de carga [pau-de-arara] apenas “quando não houver linha regular de ônibus entre os municípios ou as linhas existentes não forem suficientes para suprir as necessidades das comunidades”.

A lei também exige que os veículos estejam adaptados com bancos com encosto, carroceria de material de boa qualidade, resistência estrutural, limite de pessoas em conformidade com o espaço da carroceria, condições de higiene e segurança e vistoria por autoridade competente.

Os pedestres e condutores de carroças, bicicletas e animais de montaria podem responder a processo judicial após o acidente. O especialista em legislação de trânsito, Antônio Lásaro Forner, explica que estas pessoas podem ser responsabilizadas pelos acidentes e até mesmo ter que pagar as despesas caso seus veículos não sejam corretamente sinalizados, conforme as exigências do CBT.

Apesar de inocentados da fatalidade, os motoristas dos veículos respondem a processo de homicídio culposo quando houver morte.

Animais nas estradas – Segundo a polícia rodoviária, a presença de animais nas pistas também é uma das principais causas de acidente nas estradas durante a noite. A situação é muito comum nos municípios de Senhor do Bonfim, Capim Grosso, Juazeiro e regiões atingidas pela seca, onde os proprietários de terra soltam os animais para que eles possam se alimentar em outros pastos.

“Estamos sempre em contato com os fazendeiros das regiões onde há mais incidência de animais soltos nas estradas para mostrarmos a importância deles os manterem presos nos currais”, acrescenta o Capitão Teixeira.

A presença de um animal na pista marcou as férias do estudante Pablo Souza, que sofreu um grave acidente no ano passado. “Dirigia em uma estrada próxima ao município de Barreiras e fui surpreendido por um jegue na pista. Estava muito escuro e era impossível ver o animal se aproximando. Desviei o carro para o acostamento e bati em uma árvore. O carro teve perda total, mas, graças a Deus, consegui escapar com vida”, conta. Depois do acidente, o estudante nunca mais teve coragem de dirigir à noite.