Caminhoneiro é preso na BR-369/PR com 2 toneladas de maconha
Descriminalização do porte de maconha deverá ampliar o consumo da droga e trabalho da PRF Foto: Divulgação/PRF

STF decidirá se o Brasil vai seguir o caminho da Colômbia ou Equador ao votar a possível descriminalização do porte de maconha nesta quarta-feira (6). Nas estradas, a fiscalização do toxicológico está suspensa e a decisão do STF não impedirá que motoristas continuem a dirigir caminhões, ônibus e outros veículos, admitindo portar “rebite” e cocaína para uso próprio

Nesta quarta-feira (6), está prevista a continuação da votação no STF sobre a descriminalização do porte de maconha para uso próprio. Cinco ministros já manifestaram seu voto a favor, incluindo Gilmar Mendes, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Alexandre de Moraes e Rosa Weber (aposentada).

Até o momento, o único voto contrário foi de Cristiano Zanin. Durante a votação que ocorreu em agosto do ano passado, o ministro Barroso propôs 100 gramas como limite para uso próprio, enquanto Moraes sugeriu até 60 gramas, posição seguida por Rosa Weber. Inicialmente, Gilmar Mendes tinha proposto a descriminalização de várias drogas mas depois reviu seu voto e restringiu a maconha, em função do objeto da ação, restrito a essa droga.

A votação ocorreu dias após o assassinato, pelo tráfico, do candidato à presidência do Equador, Fernando Villavicencio, que defendia o término da tabela de drogas (“Tabla de Drogas”) vigente no país há dez anos.

A “Tabla de Drogas” no Equador foi aprovada pelo então presidente Rafael Correa, atualmente exilado devido a investigações por corrupção, e cuja eleição foi supostamente apoiada pelo narcotráfico colombiano, conforme diversos documentários e denúncias, incluindo as de Fernando Villavicencio, como jornalista investigativo.

Essa ‘Tabla de Drogas’ descriminalizava o porte de diversas drogas em quantidades especificadas. Segundo Villavicencio, ela fomentou o microtráfico, permitindo que traficantes obtivessem quantidades dentro do limite legal, vendessem rapidamente e voltassem para adquirir mais. Ampliando a rede de distribuição do crime organizado.

Especificamente para a maconha, o limite legal no Equador era de dez gramas, equivalente a 30 cigarros de maconha, o dobro do permitido na Holanda, onde o limite é de 5 gramas.

Após o assassinato de Villavicencio, Daniel Noboa foi eleito presidente do Equador e, logo após assumir, eliminou a ‘Tabla de Drogas’ em novembro passado, conforme proposto pelo candidato falecido, alegando o desejo de combater o microtráfico.

Em seguida, enfrentou rebeliões nos presídios e assassinatos de autoridades. Na segunda-feira (4), oito juízes foram detidos pelas autoridades equatorianas, após investigações do Ministério Público, por envolvimento com o crime organizado.

Quantidades propostas pelos ministros do STF podem estimular o microtráfico

A proposta de Barroso foi de tolerância para o porte de 100 gramas de maconha, já Moraes indicou 60 gramas. São quantidades suficientes para produzir 300 cigarros de maconha (100 gramas) ou 180 (60 gramas) e contrastam com as 10 gramas que eram toleradas naquele país e com a nova política de drogas adotada em novembro pelo Equador.

Após 10 anos de descriminalização do porte de drogas, as autoridades equatorianas entenderam que essa política contribuiu para o aumento do microtráfico e beneficiou o crime organizado.

É importante lembrar que o limite no Equador era de 10 gramas de maconha; portanto, o risco do crescimento do microtráfico tende a ser muito maior com as propostas de 100 gramas e 60 gramas dos nossos ministros, ainda que não seja essa a intenção dos magistrados.

Além disso, o Equador constatou que a descriminalização coincidiu com o aumento do número de mortes violentas de 11 para 45 a cada 100 mil habitantes, colocando o país como o mais violento nas Américas. Ao mesmo tempo o consumo explodiu, aumentando o problema social e de saúde pública.

Portanto, a descriminalização não resolveu o problema da criminalidade, nem dos presídios, como espera o ministro Barroso. O fim da ‘Tabla de Drogas’ no Equador coincidiu com uma decisão oposta na Colômbia, poucos dias depois, onde o presidente Gustavo Petro criou a sua ‘tabela de drogas”.

Alguns meses antes, o próprio filho do presidente colombiano disse que a campanha do pai foi financiada, em parte, por narcotraficantes. A ‘tabla de drogas’ do atual presidente colombiano descriminalizou a posse de pequenas quantidades de várias drogas. O mesmo caminho adotado, por dez anos, no Equador e abandonado em novembro passado.

Fiscalização do toxicológico sempre adiada pelo poder Executivo

Por outro lado, no Executivo do governo federal, a fiscalização do exame toxicológico, obrigatório para condutores das categorias C, D e E (caminhão, ônibus e carreta), tem sido adiada seguidamente. Isto ocorreu no governo Bolsonaro e continua ocorrendo no governo Lula.

Esse o cenário atual, apesar dos excelentes resultados obtidos pelo exame no desestímulo ao uso, na redução de sinistros (acidentes) e no combate à exploração dos motoristas profissionais.

Devemos acrescentar que o exame toxicológico foi considerado constitucional em recente Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) julgada pelo Supremo. Indício de que o STF estava mais preparado para decidir sobre o tema. O que não parece ocorrer com a descriminalização.

Entretanto, a Lei de Drogas deixa de mãos atadas os agentes de trânsito. No último sábado, um caminhoneiro foi flagrado pela PRF dirigindo em excesso de jornada, com 163 comprimidos de “rebite”, alegando ser para uso próprio.

Assinou um TCO (Termo Circunstanciado de Ocorrência), assumindo que compareceria quando convocado pelo Judiciário e foi liberado para continuar dirigindo um veículo com dezenas de toneladas. É importante salientar que não se trata de negligência da PRF, mas sim de limitações legais impostas pela Lei de Drogas.

No domingo do último Carnaval, três caminhoneiros em excesso de jornada, todos de posse de drogas, normalmente utilizadas para se manterem acordados, foram flagrados pela mesma PRF com drogas. Sendo que um deles portava rebites, 100 gramas de maconha e várias gramas de cocaína.

Eles também foram liberados para continuarem a viagem, dirigindo carretas com dezenas de toneladas, naturalmente sem a posse das drogas. Como o SOS Estradas já propôs, ninguém deveria continuar dirigindo quando estiver em posse de drogas ou com exame toxicológico vencido. Esperamos que o Parlamento adote essa proposta.

Mas essa é a triste realidade enfrentada atualmente pelos policiais no trânsito brasileiro. São obrigados a liberar condutores de veículos pesados que admitiram fazer uso de drogas.

E nada irá mudar com a provável descriminalização do porte de maconha para uso próprio pelo STF. Afinal, o limite para porte será apenas da maconha. Consequentemente, quem estiver com centenas de comprimidos de rebite ou com cocaína a bordo dos veículos, poderá alegar ser para uso próprio e será liberado para seguir viagem. Inclusive quando tiverem maconha, desde que esteja dentro do limite tolerado pela provável decisão do STF.

STF decidirá qual caminho iremos seguir ou será o Parlamento?

Até o momento, não foi possível entender o critério adotado pelos ministros do STF para considerar tolerável o porte de quantidades que permitem preparar entre 180 e 300 cigarros de maconha.

Principalmente, considerando que países como a Holanda, citada inúmeras vezes como exemplo de política de tolerância, consideram quantidades acima de 5 gramas, que permitem fazer 15 cigarros de maconha, como tráfico.

É importante lembrar aos nossos magistrados que, no dia 27 de fevereiro último, foi condenado à prisão perpétua o maior traficante da Holanda, que continuava controlando o crime do presídio. Três pessoas ligadas à principal testemunha do caso foram assassinadas: seu irmão, seu advogado e o jornalista policial mais importante da Holanda.

Magistrados envolvidos no julgamento são mantidos em anonimato por questões de segurança. O pais é considerado o centro europeu de distribuição de drogas, com destaque para as drogas sintéticas; às quais foram incluídas na tabela do porte descriminalizado pelo governo português há poucos meses.

A sociedade brasileira também deveria questionar por que a maioria dos veículos de comunicação citam os casos da Holanda, Uruguai e Portugal, onde existe porte descriminalizado em quantidades menores, e não mencionam Suécia, Alemanha, França, Inglaterra, onde não existe descriminalização do porte.

É, no mínimo, curioso que o caso do Uruguai seja objeto de numerosas matérias, mas a experiência de uma década do Equador não é sequer mencionada. Por que não dão destaque ao fim da tabela de drogas naquele país e à detenção de 8 magistrados na segunda-feira (4)?

Para alguns, a cobertura jornalística pode parecer seletiva. Seguramente, não é essa a intenção. Entretanto, é evidente que a ‘grande imprensa’ não tem estudado o tema com a profundidade e imparcialidade necessárias.

Na avaliação do portal Estradas, faltam mais informações para os ministros do STF sobre políticas de drogas; inclusive, sobre os resultados obtidos em países que não adotaram a descriminalização como foco ou que revisaram a política implantada após constatarem o seu fracasso.

A votação atual de 5 x 1 indica um resultado que, na avaliação do Estradas, em nada vai contribuir para a redução da criminalidade, do tráfico, consumo de drogas e da segurança viária.

Apesar disso, resta a expectativa de que os ministros ouçam representantes de entidades que tratam de dependentes químicos, para entender as consequências dessa possível tolerância. Estudem melhor os resultados obtidos por países que adotaram a descriminalização e os que continuam não tolerando essa possibilidade. Portanto, adiem essa decisão para quando tiverem elementos mais seguros para decidir.

Ao mesmo tempo, é hora do Parlamento, representado pelo senador Rodrigo Pacheco, dar sua contribuição para que o Brasil não seja mais um país controlado pelo narcotráfico.

Afinal, a experiência de dez anos do Equador mostrou que a tolerância com a posse de drogas para uso próprio não trouxe nenhum benefício para a sociedade. Muito menos para a redução do consumo de drogas ou da criminalidade.

Não existe estudo sério que comprove, em nenhum país do mundo, aumento da segurança, redução da violência e do uso de substâncias psicoativas, com políticas de flexibilização do porte para uso próprio. São feitos apenas recortes de dados para defender teses pró-descriminalização. Inclusive na imprensa em geral.

O que já está provado é que o crime organizado está infiltrado em todos os poderes e no Brasil não é diferente. A expansão da rede de distribuição de drogas com o microtráfico, beneficiado pela descriminalização do porte para uso próprio, vai custar muitas vidas e pode levar nosso país para um caminho provavelmente sem volta.

Leia sobre o tema:

STF deve descriminalizar porte de droga e acidentes nas estradas podem aumentar junto com o tráfico

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4 COMENTÁRIOS

  1. Ainda não sabemos como sairá a redação final, mas algumas considerações merecem ser realizadas a respeito do tema: 1. Com base em qual medida, estudo ou estatística teremos uma quantidade “autorizada para porte”? A droga é um problema de saúde pública. Técnicos da saúde foram ouvidos para dispor de informações de quantas gramas de maconha consumidas diariamente podem ser prejudiciais a saúde, considerando um cidadão de porte médio? Os custos com a dependência, certamente aumentarão, e estão sendo levados em consideração os custos com previdência, absenteísmo, etc?; 2. O segundo aspecto é uma comparação com países que tiveram a descriminalização da maconha, mas que também regularam a plantação e a comercialização, como Uruguai, Holanda, etc. No Brasil, se fala apenas na descriminalização do porte, permanecendo proibida o plantio e a comercialização, aceitando-se então, que o usuário adquira a droga na “boca”. Então temos algo bem estranho, pois aceitamos que um usuário tenha o porte de uma substância que só pode ser adquirida de um criminoso!!!; 3. Essa decisão trará para os policiais situações inusitadas, do tipo, abordar uma pessoa com 30/60/100gr de maconha, e pelas circunstâncias liberá-lo por tratar-se de um porte, e ali bem próximo prender um traficante com 10gr de maconha, que pelas circunstâncias caracteriza o tráfico. Reflexão

  2. O texto se e gana ao ignorar o Canadá, onde o porte e consumo são não apenas descriminalizados como legalizados e altamente regulamentados, cenário esse objeto de algumas centenas de estudos científicos sobre os impactos da regulamentação do mercado. Casos de violência e tráfico são relacionados ao consumo e tráfico de outros entorpecentes como os opioides, que por sua vez são a causa principal de crises de vulnerabilidade social, aumento do número de incidentes violentos e sobrecarga no sistema de saúde.

    • O texto não tem o objetivo de falar de todos os países. Até porque a maioria dos países do mundo jamais descriminalizaram o porte de qualquer droga para consumo próprio. Poderíamos citar países como Japão e Coréia do Sul, com políticas extremamente rigorosas, muito mais seguros e tranquilos para viver que em Vancouver ou Toronto, por exemplo. No Uruguai, tão festejado pela mídia, pessoas que não são usuários de maconha, fazem o cadastro como usuários para comprar a droga legalmente e vender para os turistas. Tornaram pessoas comuns traficantes. O caso do Equador é emblemático, principalmente em função do assassinato de Fernando Villavicencio, politicamente de esquerda, portanto, não seria uma questão ideológica, já que Correa é apontado como político de esquerda. Villavicencio percebeu as consequência da descriminalização, principalmente no aumento das redes de distribuição com o micro tráfico. A regulamentação da descriminalização da maconha, inclusive nos EUA, onde vários estados adotaram essa política, tem sido um grande fracasso quando analisamos sistemicamente. A legalização da venda tem servido para aumentar o THC da droga devido a concorrência, agravando o problema de saúde e o Estado não consegue controlar. A legalização serve ainda para lavagem de dinheiro, assim como ocorre atualmente com a ‘legalização’ das casas de apostas. Na Califórnia a violência saiu de controle. Estudos comparando estados semelhantes nos EUA, com legislações diferentes quanto a maconha, provam que onde é descriminalizado há mais mortes no trânsito (veja o site do Insurance Institute for Highway Safety ou estudo do Instituto AAA). No Colorado, após a descriminalização, aumentaram brutalmente os casos de crianças hospitalizadas por uso acidental da droga, surtos psicóticos de adolescentes e adultos. Enfim, problemas graves de segurança e saúde pública. O “European Drug Report 2023: Trends and Developments” confirma o fracasso das políticas aplicadas na Europa, em particular nos países que adotaram a política da descriminalização. A justificativa sempre desses organismos internacionais é que necessitam de mais recursos e pessoal. Em Portugal, turistas são abordados nas principais ruas por traficantes, próximos de policiais, oferecendo cocaína e outras drogas. Portugal está com o maior índice de overdose da sua história e agora descriminalizou drogas sintéticas. O Canadá fracassou nas tentativas e experiências que fez e fracassará nas mais recentes em que descriminaliza praticamente tudo. Quem conheceu as cidades canadenses, como Vancouver e Toronto há dez anos, e circula atualmente pelas ruas de lá hoje vê claramente o fracasso das políticas de tolerância com relação ao uso de drogas. Tornaram-se moradias de zumbis. Além disso, não podemos esquecer a indústria farmacêutica e a proliferação dos opióides. Basta ver o aumento do uso de drogas no ambiente de trabalho nos relatórios do Quest (Workforce Drug Test Positivity). Mas quais os executivos e acionistas foram efetivamente punidos nos STFs da vida desses países? A solução passa por políticas de desestímulo ao uso de drogas. Muito mais eficientes que a fiscalização. Como já ocorre no Brasil com o exame toxicológico que cria barreiras para quem pretende dirigir veículos das categorias C, D e E. Trabalhar em companhia aérea, ingressar em forças de segurança, atuar nas empresas de petróleo. Aliás, a diferença dos resultados obtidos comparando o exame toxicológico com as Operações da Lei Seca, confirma que prevenção, com punição, funciona muito melhor que fiscalização com punição. https://estradas.com.br/toxicologico-foi-seis-vezes-mais-eficiente-para-drogas-que-lei-seca-para-alcool/ Por fim, quem tem interesse na descriminalização é o crime organizado (casos Equador e Colômbia comprovam isso). Além das elites que consomem drogas e não querem ser acusados de financiar o crime, como fazem atualmente. Por isso, o espaço dado ao tema é infinitamente maior que as discussões sobre saneamento básico, educação e saúde, que afetam a população mais humilde. O que o STF tem feito para punir os agentes públicos que negligenciam essas necessidades da população brasileira? Qual a manchete da imprensa sobre isso? O mesmo ocorre com a chamada inclusão, discutem todas as formas, mas quais as matérias dão destaque a inclusão dos deficientes físicos? Qual a bancada de rede de tv que tem um deficiente trabalhando? Basta entrar nas redações para identificar que essa inclusão não tem a devida atenção. Com exceção dos jogos para olímpicos. O nosso foco não é ser contra ou a favor das drogas e sim da preservação de vidas, em particular no trânsito. Estamos abertos a debater o tema em qualquer frente. Mas não ficamos limitados as fontes entusiasmadas da descriminalização. Buscamos estudos, pesquisas sérias, com “peer review” e mesmo estas analisamos com cuidado. Sem contar que as entidades que existem no Brasil como Conselho Federal de Medicina, Associação Brasileira de Psiquiatria, Associação Brasileira de Estudos do Álcool e outras Drogas – ABEAD, nenhuma delas defende a descriminalização em qualquer modelo. Será que eles não entendem do assunto? Nós preferimos acreditar na ciência, nos estudos sérios e não compramos argumentos pela mídia ou de supostos institutos criados para defender teses e não para realmente estudar seriamente o tema, usados como referência inclusive em votos no STF.

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