A reconstrução da Via Costeira a partir do projeto original concebido pelo renomado paisagista Roberto Burle Marx pode ser uma realidade, caso o poder público considere a solicitação dos arquitetos Marizo Vítor e Paulo Nobre, professores do Departamento de Arquitetura da UFRN. Eles encaminharam à Semurb o pedido de resgate do projeto histórico feito no final da década de 70, por encomenda do governo estadual, e que nunca chegou a ser colocado em prática.

As obras de ampliação da avenida Dinarte Mariz foram planejadas pelo Departamento Estadual de Rodagens (DER-RN), por ser tratar de uma rodovia estadual (RN-301). No entanto, a reforma foi embargada em 2006, pelo Ministério Público, porque vários pontos do projeto apresentado pelo órgão foram contestados. A primeira reação dos ambientalistas foi com relação à retirada dos coqueiros.

Diante do projeto paisagístico apresentado pela empresa que ganhou a licitação para executar a reforma, os professores de arquitetura acharam por bem resgatar uma idéia que, se for levada adiante, valorizará muito mais a Via Costeira. “Pesquisamos e confirmamos a existência do projeto desenvolvido por Burle Marx. Infelizmente, esse trabalho não existe mais nos arquivos da Semsur, o órgão municipal responsável pelas praças e jardins da cidade”, explicou Paulo Nobre. Ele e Marizo Vítor participam da Rede de Pesquisadores Jardins de Burle Marx no Nordeste.

É época em que formulou o projeto, o DER-RN não apresentou o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) para o órgão municipal licenciar a obra, no caso, a Semurb (Secretaria Municipal de Urbanismo e Meio Ambiente). Os responsáveis pelo processo não sabiam da necessidade de tal protocolo: por se tratar de uma via estadual, imaginavam que o procedimento era dispensável. Ao término da audiência pública, a Semurb aderiu à causa dos ambientalistas e se dispôs a receber propostas e sugestões sobre os pontos polemizados.

Os arquitetos Paulo e Marizo aproveitaram a oportunidade e apresentaram a sugestão do resgate do projeto original. Como não há nenhum registro nos órgãos públicos sobre a existência do projeto propriamente dito, eles confirmaram o fato com o pessoal do escritório do paisagista. Ele faleceu em 1994, porém, sua obra continua sendo mantida pelo sócio Haruyoshi Ono.

“Todo o Nordeste tem obra de Burle Marx, menos Natal. Com esse resgate, seria a oportunidade de valorizarmos uma das mais importantes vias de acesso da rota turística do Estado com o projeto assinado por um dos mais importantes e renomados paisagistas do mundo”, declarou Marizo Vítor. Os professores lembram que 2009 é o ano de centenário de nascimento de Marx, ocasião ideal para a cidade receber um presente desse porte, ao mesmo tempo em que rende homenagens ao célebre artista dos jardins brasileiros.

Diante do silêncio da Semurb quanto à sugestão feita pelos professores, eles elaboraram um manisfesto para tornar pública a idéia que, na concepção dos pesquisadores, é a forma mais sensata de buscar solução para um dos principais entraves à obra de intervenção da Via Costeira: o projeto paisagístico.

A reportagem da TN tentou conhecer a versão da Semurb e do DER-RN, quanto à sugestão do resgate do projeto histórico desenvolvido por Burle Marx para a Via Costeira. De acordo com a assessoria de imprensa da secretaria municipal de Meio Ambiente e Urbanismo, o departamento de controle ambiental está analisando a viabilidade da solicitação dos professores de arquitetura.

Quanto ao DER, foram feitas várias tentativas de comunicação via telefone com a assessoria, porém, a jornalista responsável não atendeu às ligações da redação, tampouco retornou os recados deixados na caixa de mensagens.

Uma via cercada de polêmica

Quando a Via Costeira foi projetada, houve muita polêmica por causa do impacto causado à natureza. Para tentar reverter a situação, o governo estadual contratou Roberto Burle Marx, um dos maiores paisagistas do nosso século, conhecido e premiado internacionalmente, para elaborar o Projeto Paisagístico do Parque das Dunas e da Via Costeira.

De acordo com o texto do manisfesto escrito pelos professores Paulo Nobre e Marizo Vítor, “Burle Marx solicitou um inventário da vegetação existente, para só então desenvolver a proposta de recomposição das dunas e de arborização dos canteiros e das rótulas do sistema viário”. Através do arquivo da TRIBUNA DO NORTE, eles confirmaram a preocupação do paisagista com a preservação do meio ambiente, marca registrada das suas intervenções: “O projeto será desenvolvido lentamente e mais importante ainda é que será aproveitada toda a flora da região […] será montado em Natal um horto experimental para que seja acentuada a vegetação existente e não trazer de outras regiões” (Tribuna do Norte, 12/07/1979).

Ainda segundo o manifesto: “? sabido que os estudos se prolongaram por aproximadamente dois anos, observando rigorosos critérios profissionais. O levantamento botânico foi realizado pelo botânico Luis Hemydio de Mello Filho, parceiro de Burle Marx, que hoje dá nome à Biblioteca do Parque das Dunas. Embora o Horto Experimental tenha sido implantado na área, a proposta apenas foi executada parcialmente. Com a saída de cena do seu mentor, o escritório Burle Marx & Cia., sediado na cidade do Rio de Janeiro, detém os direitos autorais do referido Projeto Paisagístico”.

Por ter múltiplos talentos, o paisagista Roberto Burle Marx era bastante respeitado nos meios em que atuava. Além de gostar e de entender de plantas, ele foi também desenhista, pintor, tapeceiro, ceramista, escultor, pesquisador, cantor e criador de jóias. Nasceu em São Paulo, no dia 4 de agosto de 1909, passando a residir no Rio de Janeiro a partir de 1913. De 1928 a 1929 estudou pintura na Alemanha, tendo sido freqüentador assíduo do Jardim Botânico de Berlim.