Uma sistemática de pagamento aos caminhoneiros autônomos, a carta-frete, deve acabar em breve. O governo aprovou recentemente emenda à lei do transportador rodoviário de carga, que põe fim a essa modalidade. Falta agora que a norma seja regulamentada pela ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres), o que deve levar mais 40 dias, para que passe a valer na prática.

A carta-frete existe há 50 anos nesse mercado, mas não tem valor fiscal nem respaldo legal. Segundo o presidente da Unicam (União Nacional dos Caminhões), José Araújo da Silva, o China, essa relação informal entre o profissional e a empresa transportadora dificulta a comprovação de renda para a obtenção de linha de crédito Procaminhoneiro do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) – que oferece juros de 4,5% ao ano para o autônomo adquirir veículo financiado.

China cita que, com a dificuldade para a obtenção do veículo novo, hoje a frota em circulação dessa categoria tem em média 23 anos de vida útil. “Mas tem caminhão de mais de 40 anos rodando”, afirma.

DESCONTO
Para o representante do setor, além de dificultar o acesso a crédito, a modalidade prejudica a categoria – formada por mais de 1 milhão de caminhoneiros – por induzir a compra casada, o que desrespeita o Código de Defesa do Consumidor.

Isso ocorre porque o caminhoneiro só pode descontar o valor que consta nesse documento em postos de combustível conveniados à empresa que o contratou e ainda tem de abastecer nesses locais para conseguir trocar o papel por dinheiro. “E o autônomo ainda precisa pagar ágio de R$ 0,15 a R$ 0,20 pelo litro do diesel na hora da troca da carta-frete, já que a transportadora demora para pagar o posto”, explica.

FRETE
De acordo com dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), o governo registra R$ 16 bilhões anuais como montante gerado pelo frete realizado pelos profissionais do ramo. A estimativa no setor, no entanto, é que o transporte de carga movimente R$ 60 bilhões ao ano. Ou seja, R$ 44 bilhões estariam na informalidade.

Para o presidente da Unicam, a nova lei vai regularizar a sistemática de pagamento dos autônomos e tirá-los da informalidade. Ele avalia ainda, que mesmo passando a pagar impostos, os caminhoneiros terão vantagens, já que o dinheiro será depositado direto em suas contas, sem a necessidade de pagar ágio na compra do combustível. “E o posto não foi feito para trocar cheque. Vai deixar de atuar por imposição e terá de oferecer bons serviços (para atrair os transportadores)”, acrescentou.

Representantes das empresas preveem alta nos custos

Para representantes das companhias transportadoras de carga, o fim da carta-frete poderá representar aumento de custos para as empresas.

“A mudança foi iniciativa dos condutores autônomos (o projeto foi levado ao governo pela Unicam), mas (a modalidade) era um facilitador. Ninguém tinha de ir no banco para sacar o dinheiro, evitava o risco de assalto”, afirma o consultor jurídico do Setrans (Sindicato das Empresas Transportadoras de Carga do ABC), Marco Aurélio Guimarães Pereira. Ele acrescenta que a regulamentação deverá trazer transtornos para as companhias. “Provavelmente vai existir o cartão do autônomo, que vai gerar custos, como aconteceu com o vale-pedágio. Criou mercado para os agentes financeiros e o segmento foi penalizado”, diz.

Em relação aos financiamentos para renovação da frota, segundo o dirigente, os autônomos já podem hoje comprovar a renda, por meio dos recibos e da declaração da movimentação financeira concedida pela empresa transportadora. Pereira cita ainda que o fim da sistemática deve criar dificuldades para os próprios profissionais.

Segundo ele, muitos têm veículos em nome da esposa, dos filhos, e o depósito terá de ser em nome do proprietário.