Por Rafael Scala*
Quando falamos em tecnologia e inovação, o que vem a sua mente? Provavelmente robôs, carros autônomos, inteligência artificial, certo? Mas, embora possa não parecer à primeira vista, alguns setores mais tradicionais, como o de Operação e Manutenção Rodoviária, podem se beneficiar e trazer muitos ganhos para a sociedade com a digitalização, usando soluções já disponíveis no mercado.
Hoje, aproximadamente 60% de tudo que circula e é consumido no Brasil é transportado em caminhões nas rodovias, segundo dados de uma pesquisa da Confederação Nacional de Transportes (CNT). 100% da soja, carne, leite, frutas e verduras em algum momento trafegam nas auto estradas, assim como 67% de toda a nossa exportação para a Argentina e 54% da distribuição de diesel. É um setor extremamente importante, ligado a diversas outras áreas da sociedade.
Um outro estudo feito pela CNT perguntou aos empresários do ramo quais iniciativas e reformas deveriam ser priorizadas pelo governo. A realização de investimentos em infraestrutura, a desburocratização e a redução da carga tributária foram as três frentes destacadas pela maior parte dos transportadores como as mais importantes. Também foi mencionado o aumento da segurança no ambiente de transporte de cargas e passageiros. Mas, para que esse movimento aconteça, é preciso que tanto a esfera pública quanto os cidadãos entendam que todo esse processo de gestão, operação e manutenção rodoviária é formado por diversas atividades complexas, que muitas vezes ainda são feitos de forma manual.
A falta de inovação na gestão das rodovias pode acarretar em diversos problemas, tanto para os usuários quanto para a população que reside ou trabalha às margens da pista e para o próprio órgão gestor. E um grande aliado para ajudar com essas questões é um bom sistema de gestão digital que auxilie no desenvolvimento de todas as atividades, como o gerenciamento de contratos, receitas, fiscalização e manutenção das vias.
A importância de uma boa gestão nas faixas de domínio
Como Especialista em Soluções de Tecnologia pro Setor de Infraestrutura e Transportes da Softplan, uma das maiores desenvolvedoras de software do Brasil, pude acompanhar dois modelos de gestão que estão dando muito certo: o do Departamento de Estradas de Rodagem do Distrito Federal (DER-DF) e o da Secretaria de Infraestrutura e Mobilidade de Santa Catarina (SIE). Os dois órgãos utilizam os módulos do SIDER, uma plataforma completa para a gestão digital da infraestrutura de transportes e obras e fizeram muitas mudanças positivas no gerenciamento de suas faixas de domínio.
A faixa de domínio é a base física sobre a qual se assenta a rodovia, constituída pelas pistas de rolamento, canteiros, obras de arte (grandes viadutos, por exemplo), acostamentos, sinalização e faixa lateral de segurança. Todos os elementos que estejam até o alinhamento das cercas que separam a via dos imóveis marginais fazem parte desta área, e precisam ter uma boa gestão em prol da segurança dos usuários e de uma boa manutenção da via.
Existem diversos fatores na gestão desses espaços, desde a solicitação de cidadãos para construir ou ocupar legalmente (seja com moradia ou com trabalho, como é o caso de vendedores ambulantes) até a fiscalização em campo dos servidores, que é extremamente importante não só para garantir a segurança da via mas também para possíveis projetos de melhoria. Antes da implantação do sistema digital, tanto o DER quanto a SIE precisavam esperar alguns dias para obter os resultados que eram colhidos em campo pelos fiscais. Agora, eles são disponibilizados em tempo real na plataforma e os órgãos conseguem mapear tudo que está regularizado e ocupado no espaço. Então, caso haja um planejamento ou projeto para aumentar a pista da estrada, por exemplo, o engenheiro responsável vai ter um mapeamento preciso do local. Também é possível autuar possíveis infrações (como a venda de bebidas alcoólicas em rodovias federais) com muito mais rapidez e sem a necessidade de usar papel.
A arrecadação com o uso da faixa de domínio também ganha muito com o sistema digital. Empresas ou cidadãos que desejem ocupar a área de alguma forma (com moradia, comércio, outdoors ou com equipamentos de transmissão de dados, como telefonia e internet) devem solicitar uma autorização e pagar uma taxa referente ao uso do espaço. Com a digitalização, a plataforma faz uma gestão automática dos contratos, trazendo um controle maior para os fiscais. No DF, por exemplo, os servidores conseguiram localizar e reativar pagamentos que não estavam sendo feitos. Com um gerenciamento melhor, o estado conseguiu aumentar a arrecadação anual das faixas de domínio de R$300 mil, em 2010, para R$7,2 milhões em 2018. Isso representa não só mais dinheiro destinado à melhorias na rodovia, mas também uma economia para os cofres públicos. Com uma boa gestão das faixas de domínio, o número de acidentes tende a diminuir, o que resulta em menos indenizações por avarias em veículos ou por prejuízos em relação à infraestrutura da estrada (como danos em postes, por exemplo).
Outro ponto positivo da digitalização é a diminuição do tempo entre uma solicitação e a conclusão de um procedimento. Em SC, os processos podiam levar até seis meses para serem finalizados. Hoje, já é possível passar por todos os procedimentos em cerca de um mês. O estado também fez uma parceria com os cartórios para vincular todas as assinaturas eletrônicas de desapropriação de áreas e aprovações de averbação da faixa de forma 100% digital.
Os exemplos do DER e da SIE deixam bem claro o quanto a tecnologia já é essencial para o setor rodoviário. A falta de eficiência no processo de gestão da área pode impactar diversos projetos, comprometer o orçamento do órgão e ainda causar atrasos em obras importantes para as melhorias das auto estradas. Além disso, as entidades públicas precisam ser atualizadas para sempre falar a mesma língua que o cidadão está falando, facilitando o acesso e trazendo mais celeridade e transparência aos processos. A transformação digital já está acontecendo, e é preciso sempre buscar a modernidade para conectar a gestão pública com seu verdadeiro propósito: aproximar a população dos seus governos.
(*) Rafael Scala é especialista em Soluções de Tecnologia pro Setor de Infraestrutura e Transportes da Softplan
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