Sem uma conservação capaz de prever problemas em ribanceiras e barrancos e de os reforçar preventivamente, as estradas federais em Minas se tornaram vulneráveis às chuvas, que deixaram o estado quase isolado, chegando a ter 30 (71%) dos 42 bloqueios brasileiros em 11 de janeiro. Agora chegou a conta: R$ 126 milhões estão sendo gastos em trechos com e sem contratos de manutenção, em 16 obras emergenciais. Todas as intervenções ocorrerão sem licitação, por meio de convites. Um prêmio para empreiteiras contempladas pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte (Dnit), depois de sua incapacidade de prever e evitar erosões e deslizamentos. “Desde outubro, a Defesa Civil emite alertas avisando sobre chuvas fortes. Quem quisesse se prevenir estava bem munido de informações”, afirma o meteorologista Ruibran dos Reis, do ClimaTempo.

Entre as estradas que receberão reformas emergenciais estão as BRs 040, 116, 262, 267, 281, 354, 356, 381, 393, 482, 494 e 499. As obras foram delegadas a empresas escolhidas pelo Dnit, já que a Lei de Licitações e Contratos Administrativos (nº 8.666, de 1993) prevê a dispensa de concorrência em “casos de calamidade”. Para o professor de direito administrativo Luciano Ferraz, da UFMG, o Dnit precisa explicar a necessidade de decretar emergência e ainda poderá sofrer investigação de órgãos de controle. “O Tribunal de Contas da União, a Controladoria-Geral da União e até o Ministério Público podem levantar se a situação que resultou em obras emergenciais não foi resultado de negligência”, afirma.

Segundo o Dnit, a maioria das rodovias – o órgão não informou quais – tinham contratos de conservação ativos quando as chuvas provocaram desmoronamentos de barrancos sobre o asfalto e erosões no solo, tornando muitos trechos intransitáveis e perigosos. Contudo, de acordo com a autarquia federal, “os contratos de manutenção e conservação cobrem apenas serviços rotineiros, como tapa-buracos, roçada e sinalização”. Ou seja, nada é feito para monitorar e impedir as movimentações do solo e o avanço das erosões. Os contratos com as empresas também “não têm em seu escopo o tipo de serviço emergencial: terraplenagem em grandes volumes, compacitação, contenção de encostas. Nem com 25% de aditivos permitidos por lei aos contratos”, informou o departamento, que minimiza os convites a empreiteiras, explicando que cada contrato teve três empresas chamadas e o menor preço foi escolhido.

BLOQUEIOS “O problema não é de engenharia. É de gestão e de planejamento. Ou os contratos de manutenção eram suficientemente capazes de tratar o que consideraram imprevistos ou a fiscalização gerencial não fez valer o que estava no contrato. O problema vem de antes do contrato”, avalia o mestre em engenharia de transportes pelo Instituto Militar de Engenharia do Rio de Janeiro (IME) Paulo Rogério da Silva Monteiro. De acordo com ele, pequenos problemas de conservação poderiam ter resultado em estragos por todo estado. “Raramente a gente aprende com os erros. Pequenos defeitos malcuidados podem gerar grandes problemas, como bueiros entupidos e encostas desprotegidas. O que parece é que essas vias estavam vulneráveis”, disse.

Interrompida por quase um mês por erosões e montanhas de terra e pedras que deslizaram sobre o asfalto, a BR-356, entre Ouro Preto e BH, é a que receberá mais recursos, R$ 38,8 milhões. A BR-040, entre BH e Rio, é a estrada que receberá o segundo maior aporte de recursos sem licitação, somando R$ 26,3 em três contratos, sendo que um deles prevê também ações nas BRs 262 e 381 no Anel Rodoviário. A estrada chegou a ter quatro bloqueios simultâneos na época das chuvas, só no trecho BH-RJ. Em Itabirito parte da montanha do km 583 cedeu e a margem da pista no sentido Rio precisou ser interditada, pois a força das águas de um córrego escavou a terra e deixou a estrada dependurada. Em Conselheiro Lafaiete e em Congonhas, na Região Central, a estrada ficou alagada.

O QUE DIZ A LEI Há dispensa de licitação, de acordo com a Lei nº 8.666, de 1993, nos casos de emergência ou de calamidade pública, quando caracterizada urgência de atendimento de situação que possa ocasionar prejuízo ou comprometer a segurança de pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens, públicos ou particulares. A lei dispensa a licitação somente para os bens necessários ao atendimento da situação emergencial ou calamitosa e para as parcelas de obras e serviços que possam ser concluídas no prazo máximo de 180 dias consecutivos e ininterruptos, contados da ocorrência da emergência ou calamidade, vedada a prorrogação dos contratos.

ENQUANTO ISSO…
…Fotos de buracos invadem a Internet

Criado por um grupo de três estados, um site com informações de buracos em vias urbanas e estradas de todo o Brasil já se espalha pela internet. O buracospelobrasil.com está na rede desde janeiro, mostra fotos, vídeos e textos enviados por pessoas insatisfeitas e pede providências às autoridades. “Resolvemos colocar a ideia em prática depois que quase morri em um acidente por causa de um buraco na BR-364, em Rondônia”, conta L.D., um dos idealizadores do grupo que prefere não se identificar. O site tem representantes em Rondônia, Mato Grosso e Ceará, mas já recebeu reclamações de Minas Gerais, Goiás e São Paulo. As queixas são enviadas por e-mail aos órgãos competentes de cada região e, caso haja respostas, elas também são publicadas. Ontem, o grupo promoveu um “Twitaço” para chamar a atenção dos internautas.