IRREGULAR: Ônibus Volvo não podia fazer a viagem que matou uma pessoa e feriu outras 16 na BR-116, na madrugada desta segunda-feira (25). Viagem era intermediada pela Buser. Foto: Victor Hugo Bittencourt/RPC

Estradas apurou que o veículo é habilitado e tem licença cadastrado junto à Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), porém estaria praticando viagem em regime regular, na qual não possui autorização. Viagem irregular era intermediada pela Buser; empresa enviou novo comunicado*

Mais uma vez, a irregularidade chama a atenção para a grave ocorrência de um acidente (sinistro) com morte e feridos, na madrugada desta segunda-feira (25), na BR-116, em Campina Grande do Sul (PR). Desta vez, envolvendo o ônibus Volvo, modelo Paradiso DD, ano 2018, da empresa Capanema Transportes Eireli – EPP, que estava realizando a viagem – irregular – intermediada pela Buser.

Conforme apurou o Estradas, junto à Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) , “o ônibus de placa BDA4B58 envolvido em um acidente na madrugada desta segunda-feira (25/9), na BR-116, em Campina Grande do Sul, é habilitado e tinha licença cadastrada para realização de viagens em regime de Fretamento. No entanto, o veículo acidentado estaria praticando viagem em regime Regular, na qual não possui autorização para realizar. Portanto, a viagem seria considerada irregular, já que a empresa não tinha licença para tal serviço.

A ANTT lamenta e expressa solidariedade aos familiares das vítimas e esclarece que fornecerá todas as informações necessárias às autoridades de segurança pública para apoiar as investigações, quando solicitadas. Vale destacar que, nas empresas outorgadas pela Agência, quando ocorrem acidentes, existe a obrigação de comunicação dos fatos, e dependendo da causa, são abertos procedimentos para verificação das condições de segurança.”

Cochilo por conta do excesso de jornada de trabalho

Não bastasse essa irregularidade, o próprio motorista, identificado como Paulo Marques Filho, disse ao site Banda B, que dormiu ao volante. “Saí de Campinas, fui a São Paulo, peguei 14 lá, estava com 52 passageiros, chegando aqui, parei para tomar café, com duas passageiras na frente. Quando vi, o carro foi para a esquerda, puxei para direita, mas subiu no guard-rail e pranchou”, disse o condutor.

Ainda segundo Paulo, ao site Banda B, ele estava cansado. “Eu apaguei. Eu descansei duas horas só, estávamos procurando casa para dormir de dia lá, começou faz uma semana, é uma linha nova”.

Segundo o motorista, a passageira que morreu não estava prevista para essa viagem.

COCHILO: Motorista da Capanema, Paulo Marques Filho, disse ao site Banda B que perdeu controle do veículo por ter cochilado ao volante. Volvo capotou na BR-116, nesta madrugada (25). Foto: Reprodução/RPC

Conforme o Estradas publicou – antes mesmo da informação divulgada pelo site Banda B, “pelas características do sinistro, há indícios de cochilo ao volante, uso do celular ou excesso de velocidade. A Polícia Civil irá investigar as causas.”

VOLVO: Ônibus Volvo, ano 2018, foi o que se envolveu em acidente na BR-116, na madrugada desta segunda-feira (25), deixando uma mulher morta e vários feridos. Foto: Sérgio de Sousa Elias/Ônibus Brasil

Empresa Capanema enviou nota, à tarde

Estradas entrou em contato com a empresa, por E-mail, uma vez que o telefone que consta no site não atendeu às ligações. Até a publicação desta matéria, não recebeu resposta.

A reportagem também entrou em contato com a Agência Nacional de transportes Terrestres (ANTT) para saber se a empresa e o ônibus estavam autorizados a realizarem essa viagem, entre São Paulo (SP) e Curitiba (PR). Até a publicação desta matéria, não recebeu resposta.

Por volta das 18h, a empresa, por meio de sua assessoria de imprensa, enviou a nota oficial.

A Capanema Tour lamenta profundamente o acidente ocorrido na madrugada desta segunda-feira (25), na BR-116, em Campina Grande do Sul, rumo à Curitiba. As causas do acidente ainda estão sendo apuradas, mas seguimos colaborando com as investigações, prestando o esclarecimento necessário às autoridades policiais.

Estamos oferecendo todo o suporte necessário às vítimas e respectivas famílias, acompanhando de perto as condições de saúde dos feridos. Também providenciamos um veículo substituto aos demais passageiros, que já seguiram viagem para o destino final.

Do nosso lado, destacamos que as viagens que fazemos são sempre autorizadas pelos órgãos responsáveis, por isso confirmamos que o ônibus envolvido possui documentação e licenças em dia e realiza manutenção periódica dos veículos da frota.

A segurança é um valor muito importante para a nossa empresa, então sentimos novamente pelo ocorrido e seguimos à disposição de todos os passageiros, familiares, das autoridades e da imprensa para prestarmos as informações solicitadas.

Viagem intermediada

O Estradas também manteve contato com a Buser, e, por meio de sua assessoria de imprensa, recebeu a seguinte nota:

A Buser lamenta profundamente pelo acidente ocorrido nesta segunda-feira (25) envolvendo um veículo de uma empresa parceira, a Capanema Turismo, rumo à Curitiba. Informamos que estamos prestando todo o apoio necessário aos passageiros, sendo que a maior parte seguiu viagem em um veículo substituto e outra parte foi imediatamente encaminhada para hospitais da região.

Além do suporte às vítimas e suas famílias, com o apoio da nossa torre de controle que atua remotamente, abrimos uma investigação para entender as reais causas do acidente, mas adiantamos que o ônibus estava com a documentação em dia e apto para fazer a viagem.

Esclarecemos que a Buser é uma plataforma de intermediação de viagens de ônibus que conecta pessoas que querem viajar a empresas de fretamento. As empresas parceiras que atuam com a nossa rede são devidamente licenciadas pelos órgãos fiscalizadores, e devem seguir uma rigorosa seleção. Os motoristas das empresas parceiras também precisam cumprir uma série de requisitos, incluindo documentações e treinamentos obrigatórios, para saber se estão aptos para prestarem serviços de condução de passageiros nas rodovias brasileiras.”

 A reportagem voltou a questionar a Buser sobre o fato de o ônibus ser irregular e o motorista estar com excesso de jornada de trabalho, mas a Buser manteve-se ‘calada’.

Buser envia novo comunicado*

“A Buser esclarece que, ao contrário do que informa em nota a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), não havia nenhuma irregularidade na viagem realizada pela empresa parceira Capanema Tour, para fazer o trajeto entre Campinas (SP) e Curitiba (PR), pois ela foi feita dentro de um modelo que não prevê a venda de passagens, que é o fretamento colaborativo, complementando o modelo de linhas. Ou seja, o ônibus estava habilitado e tinha licença cadastrada para a atividade que realizou.

Esse modelo de fretamento, em que a Buser atua como plataforma de intermediação em parceria com centenas de empresas fretadoras – sempre cumprindo as normas de segurança e tendo todas as autorizações necessárias, seja de órgão federal ou dos órgãos estaduais – , foi criado em 2017 e possui jurisprudência favorável, com decisões em diversos tribunais no país que atestam a sua legalidade. Inclusive, há uma decisão do STJ reconhecendo a legalidade da Buser e autorizando a operação da plataforma no Paraná, em viagens interestaduais.

Entre as decisões está um acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), que em dezembro de 2020 julgou improcedente um recurso que acusava a Buser de transporte ilegal de passageiros. Em novembro de 2021, foi a vez do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) liberar as operações das empresas de fretamento em viagens intermunicipais no Rio de Janeiro. A tentativa de impedir a liberdade de escolha dos viajantes já havia sido derrotada também no Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2), liberando as operações de fretamento colaborativo em viagens interestaduais partindo da capital do Rio de Janeiro. Há ainda decisões da Justiça Federal em Minas Gerais, que proibiu a ANTT e o Departamento de Edificações e Estradas de Rodagem (DER-MG) de impedir ou interromper viagens intermediadas pela plataforma Buser com o argumento de prestação clandestina de serviço público, da Justiça do Espírito Santo e do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJ-SC).

Nossa plataforma ultrapassou a marca de 10 milhões de clientes cadastrados. A Buser chega a embarcar mais de 20 mil passageiros por dia. Somos uma empresa séria, que conta com o apoio de grandes investidores mundiais, como Lightrock, Softbank e a própria Globo Ventures.

Essa acusação da ANTT nada tem a ver com a falta de regularização da plataforma. É uma perseguição política que inclusive já foi judicializada. E isso passa pelo debate da regulação dos serviços prestados por aplicativos, que está acontecendo em todo o mundo. No Brasil não é diferente e continua em evolução, tanto no Congresso Nacional e nas próprias agências reguladoras.

Sobre o caso em questão, lamentamos profundamente e reiteramos que nossa plataforma leva muito a sério a questão da segurança das viagens, por isso está apurando, de forma cuidadosa, juntamente às autoridades, o que pode ter levado ao acidente, além de dar todo o apoio necessário, via Buser, aos familiares da vítima. Mesmo estando com as licenças em dia, resolvemos fazer a suspensão temporária do motorista e da empresa responsável, para que haja clareza e coerência até a apuração dos fatos.

Multas recentes

Não bastasse as irregularidades, a reportagem também apurou que o veículo, registrado no Estado do Paraná, tem multas recentes, no sistema do Detran do Paraná, sendo uma por excesso de velocidade e outra por não indicar o condutor. Ambas foram pagas em 15/9/23.

O sinistro

Na madrugada desta segunda-feira (25), ) na altura do km 31 da BR-116, em Campina Grande do Sul, Região Metropolitana de Curitiba (PR), na madrugada desta segunda-feira (25), envolvendo um ônibus Volvo, da empresa Capanema Transportes Eireli – EPP, deixou uma mulher morta e várias pessoas feridas, de acordo com o Corpo de Bombeiros (CB).

Segundo a PRF do Paraná, o coletivo transportava 53 pessoas quando se envolveu no sinistro. Além da morte, houve 26 feridos. Os feridos foram removidos para hospitais da região. Quanto ao condutor do ônibus, ele estava com a documentação em dia.

Já quanto ao cronotacógrafo, a PRF-PR informou que o equipamento está ativo (a reportagem já havia constatada a validade do aparelho),porém não foi verificado porque o aparelho estava inacessível e posteriormente foi recolhido pela Perícia. A PRF não teve acesso ao disco/fita diagrama.

Ainda segundo a PRF-PR, os policiais não checaram o documento de autorização da viagem, no momento do sinistro. “A informação será verificada até a conclusão do LPAT. O condutor somente apresentou a lista de passageiros”, informou.

Da mesma forma, não foi possível verificar se o motorista respeitava a Lei do Descanso, pois o cronotacógrafo não foi checado pelos inspetores.

Segundo a concessionária responsável pela rodovia, por conta do sinistro, o tráfego ficou interditado por várias horas. Por volta de 8h30, uma das faixas foi liberada e o tráfego começou a fluir.

(*) Matéria atualizada em 26/9/23 com novo comunicado da Buser e resposta da PRF-PR