Mesmo prevista no primeiro contrato, NovaDutra não cumpriu com a obrigação; atraso deve causar transtornos aos usuários até 2029
A prorrogação do contrato de concessão da Via Dutra (BR-116), publicada no Diário Oficial da União (DOU) nessa quarta-feira (24), vai causar mais transtornos que soluções aos usuários de uma das principais rodovias brasileiras.
Isso porque a obra na Serra das Araras, imprescindível para a segurança dos usuários, prevista no contrato da NovaDutra, na primeira concessão, nunca foi realizada nos 25 anos de concessão. Agora, com a prorrogação do contrato até fevereiro de 2022, nada será feito, pois esse novo aditivo não prevê obras.
Diante disso, levando em conta todo o processo de uma nova licitação, sabe-se lá quando a nova empresa assumirá a rodovia. E, depois disso, essa obras deverá ser iniciada no terceiro ano da concessão. Em suma, a obra – que deveria estar pronta – supostamente será finalizada somente em 2029 ou 2030, se tudo seguir dentro do cronograma e se anova concessionária cumprir com suas obrigações.
A nova descida da Serra das Araras, um trecho atualmente com limite de 40km/h, traçado que tem mais de 70 anos e não possui acostamento. Não há justificativa para uma obra de apenas 8 quilômetros, por mais complexa que seja, demorar tanto tempo, média de 2 quilômetros por ano segundo o PER- Programa de Exploração da Rodovia que a ANTT publicou e apresenta em audiências públicas.
Serão 33 anos pagando pedágio, considerando a prorrogação da concessão da NovaDutras, para que o usuário tenha finalmente uma pista de descida segura na rodovia mais importante do país. E não há nenhuma garantia de que efetivamente esse prazo será cumprido. Inclusive provavelmente a obra sequer inicia no atual governo cujo mandato termina em 2023, já que a obra inicia em 2025 e pode durar até fevereiro de 2029.
Posição da Usuvias
O Estradas consultou a Associação Brasileira de Transportadores Usuários de Vias Concedidas (Usuvias) para saber a posição da entidade sobre o novo atraso na obra na Serra das Araras. Veja a resposta na íntegra:
“A UsuVias entende que a questão da Serra das Araras é um grande exemplo daquilo que não pode ocorrer em uma concessão rodoviária, acarretando consequências não desejadas aos usuários. Talvez, na concessão que se encerra no próximo domingo, a duplicação da Serra das Araras fosse o principal ponto do projeto que se esperava ter por realizado em favor dos usuários.
A construção da nova pista era prevista desde o contrato original e deveria ter seu projeto básico elaborado nos dois primeiros anos da concessão e estar concluída até o 15º ano (2010). Documentos indicam que no 12º ano da concessão (2007) ainda se discutia o projeto básico. Já o projeto executivo foi apresentado no 14º ano (2009).
Em 2011, quando as obras já deveriam estar concluídas, o empreendimento retornou ao estágio inicial, tendo sido enviados novos estudos preliminares à Agência. Em 2013, a ANTT ainda discutia qual das concepções de projetos seria implantada. Nesse contexto, foi proposta a prorrogação da Concessão para inclusão de novos investimentos que poderiam chegar a R$ 4,359 bilhões e resultar na prorrogação do contrato de concessão por até 16 anos e 9 meses. A proposta não contou com o apoio do TCU, conforme justificativas constantes do Processo nº TC 031.581/2015-3 e acabou por ser abandonada pela ANTT, resultando no arquivamento do referido processo.
Agora a Serra das Araras fica para a nova concessão da DUTRA, o que de fato leva para data mais distante do que os usuários desejavam lá em 1995, quando da 1a concessão da Rodovia. Na minuta do Programa de Exploração Rodoviária levada à Audiência Pública nº 018/2019, o investimento está previsto para ser executado do 3º ao 6º ano da concessão. Contudo, o histórico aqui descrito não nos deixa muito otimistas acerca do cumprimento desse prazo.
Ainda, o aditivo contratual aprovado no último dia 23 pela Diretoria da Agência prevê a extensão de prazo contratual por 12 meses, podendo ser prorrogado por períodos de 6 (seis) meses, limitado ao prazo total de extensão contratual de 24 (vinte e quatro) meses. Ou seja, o início da nova concessão pode se dar daqui a 2 anos, atrasando ainda mais o início da obra.
A UsuVias acredita que a lição que fica, por toda essa questão que envolve a Serra das Araras, é a necessidade de acompanhamento mais de perto do cumprimento das obrigações contratuais, para que os usuários não fiquem alijados de efeitos positivos da concessão, especificamente nesse ponto.”
Concessão
Na primeira concessão da Dutra em 1996, a rodovia aumentou 5 quilômetros no contrato e depois encolheu 5 quilômetros. O que significou 125 quilômetros por ano de manutenção que jamais seriam necessários ao longo de 25 anos de concessão. Portanto, milhões de dólares de economia para a concessionária que jamais foram repassados para os usuários com redução de pedágio.
Agora, na nova concessão que envolve trecho da Dutra (BR-116), a quilometragem da BR-116 no Estado do Rio de Janeiro “aumentou” 6 quilômetros sem explicação clara da ANTT.
Entenda o caso
Quando a Rodovia Presidente Dutra (BR-116) foi concedida para a NovaDutra em 1996, pelo extinto DNER – Departamento Nacional de Estradas de Rodagem, o Estradas.com.br – na época, Revista das Estradas – alertou que tinha algo estranho na concessão porque a rodovia sempre teve 402 quilômetros de extensão e aparecia no contrato com 407 quilômetros.
A extensão de 407 quilômetros , está na Seção I do contrato original, item h, na página 3. Onde diz que a rodovia começa no Rio de Janeiro no Km 163 e termina na divisa com São Paulo no Km 333,5. Depois, segue considerando o Km 0 em Queluz (SP) até o Km 236,6 na Marginal do Tietê na capital paulista. Portanto, estranhos 407 quilômetros no total.
Pouco tempo depois que a concessionária assumiu, a Dutra “encolheu” o lado paulista da Dutra em 5 quilômetros, retornando para os históricos 402 quilômetros. Informação que está no site da ANTT.
A situação era suspeita, porque ao longo de 25 anos de concessão, essa diferença significava 125 quilômetros de rodovia (25 anos x 5 km ) de investimento em manutenção mas que só existiam no papel.
Portanto, redução de dezenas de milhões de dólares de custo para a concessionária ao longo dos 25 anos de contrato. Além do mais, a rodovia não poderia ter 402km em 1995, passar para 407 km em 1996 e no ano seguinte voltar aos 402km.
Rodovia “encolheu” mas pedágio continuou o mesmo
Apesar de vários alertas, esse “estica-encolhe” da rodovia mais importante do país, nunca foi transformado em redução da tarifa do pedágio pelo extinto DNER. Muito menos ainda por quem a sucedeu, a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT).
Agora, no edital da nova concessão que envolve trecho da Via Dutra, entre São Paulo e Seropédica (RJ) e ainda da Rio-Santos (Ubatuba-Itaguaí), aparece que a divisa da Dutra, entre Rio de Janeiro e São Paulo, está inexplicavelmente no Km 339,6. Desta vez a mudança ocorre no lado Fluminense, a divisa que sempre foi no 333,5 agora tem 6 km a mais. Sem nenhuma explicação.
Diz a ANTT e o governo no seu Programa de Parcerias de Investimentos sobre a nova concessão e trecho da Dutra: “Nos estudos submetidos à Audiência Pública, o escopo do empreendimento foi aumentado para 598,5 km, sendo 124,9 km na BR-116/RJ (entre o entroncamento com a BR-465 no município de Seropédica, km 214,7, e a divisa RJ/SP, no km 339,6); 230,6 km na BR-116/SP ( entre a divisa RJ/SP, km 0, e o entroncamento com a BR-381/SP-015, Marginal Tietê, no km 230,6); 190,9 km na BR 101/RJ (entre o entroncamento com a BR-493, no município de Itaguaí, km 408,1, e a divisa RJ/SP, km 599; e 52,1 km na BR/101/SP (entre a divisa RJ/SP, km 0, e Praia Grande, Ubatuba , km 52,1 .”
Ora, novamente a BR-116 “esticou” só que desta vez 6 quilômetros do lado do Estado do Rio de Janeiro e não 5 quilômetros do lado paulista. Basta qualquer usuário passar no trecho, entre Itatiaia (RJ) e Queluz (SP) e ver as placas indicando que a BR-116, no estado do Rio de Janeiro, termina no Km 333 e não no Km 339, como informa o Governo. E a placa não foi instalada por engano, está ali tem mais de 24 anos.
Até pela internet é possível checar a informação. A imagem do trecho tem link no google maps e pode ser visitado por qualquer usuário. Para encontrar com mais facilidade, clique aqui e percorra o trecho entre a divisa de São Paulo com o Rio de Janeiro.
Portanto, está na hora de o Ministério da Infraestrutura explicar isso. Tem algo de muito estranho no ar. O documento do Programa de Exploração de Rodovias, o chamado PER, é mais uma confirmação da nossa observação e está na página 1 do Anexo II.
Concessão sob suspeita?
Esta discrepância, permite qualquer cidadão suspeitar da concessão. Porque se numa situação simples já é difícil de explicar, que dirá quando há um contrato muito técnico?
E é bom relembrar que a Via Dutra não será concedida integralmente para a nova concessionária, em 2022, mas apenas o trecho até o acesso à BR-465 em Seropédica (RJ), cuja quilometragem também foi alterada em mais 6 quilômetros – acesso que, originalmente, era no Km 208 agora é no Km 214.
Dali até a divisa com MG será outra concessão da BR-116, conforme o próprio governo já deu a entender nas audiências públicas do lote da Dutra. Isto significa que esses quilômetros a mais poderão surgir em outro trecho da concessão na BR-116, no Estado do Rio de Janeiro e depois desaparecerem sem despertar a atenção da mídia e opinião pública, como ocorreu em 1996.
ANTT se manifesta
“No presente caso, apesar de se tratar de rodovia já existente, destacamos que haverá nova licitação, em fase de ajuste de estudos pós Audiência Pública. Os estudos técnicos elaborados detalham necessidades e atualizações constantes do Sistema Nacional de Viação – SNV. Por essa razão,divergências em marcos quilométricos afixados nas rodovias (o grifo é nosso) e as versões mais recentes do SNV são comuns.
No projeto da rodovia constam as quilometragens do SNV, com a devida correspondência aos marcos quilométricos existentes na rodovia. Ou seja, tratam-se dos mesmos pontos, mas com sistemas de referências diferentes.
Quanto à questão dos estabelecimentos comerciais, a concessionária vencedora da licitação avaliará toda a sinalização da rodovia e manterá ou ajustará os marcos quilométricos do projeto, conforme a necessidade.
Para consultar todos os documentos dos contratos de concessão atualmente vigentes clique aqui : https://www.antt.gov.br/concessoes-rodoviarias“
Posição do Estradas
Para que o usuário e leitor entenda melhor, a medição de rodovias federais muda sempre que a rodovia passa de um estado para outro. Considera-se o Km 0 da BR-116, no Rio de Janeiro, no município de Sapucaia (RJ), na divisa com Além Paraíba (MG). A rodovia segue até o início da Rodovia Presidente Dutra, no entroncamento com a Av. Brasil, num percurso aproximado de 163 quilômetros.
Ali, inclusive, a Dutra inicia como Km 163, conforme contrato da concessão, e depois são 170 quilômetros até chegar na divisa com Queluz (SP), onde encontramos o km 333 do lado Fluminense e o Km 0 da Dutra(BR-116), no Estado de São Paulo. A quilometragem segue crescendo até o Paraná, quando entra naquele estado e passa a ser Km 0 da BR-116, no Paraná, após a divisa.
Embora a administração política das rodovias não nos surpreenda, pelo histórico de episódios polêmicos, os engenheiros brasileiros são muito qualificados, quanto mais para simplesmente medir a extensão das rodovias. Não há como a BR-116 aumentar 6 quilômetros, entre o seu início na divisa com Minas Gerais até a divisa do Rio de Janeiro com São Paulo, na Via Dutra.
Portanto, não são “divergências em marcos quilométricos”, como informa a ANTT, e sim extensão pura e simples da rodovia BR-116. Não é critério subjetivo, são metros e quilômetros.
A resposta da ANTT é comparável ao mecânico que usa a famosa linguagem da “Rebimboca da parafuseta”. Não explica de forma clara porque a rodovia passou de 402 quilômetros para 407 quilômetros no início da concessão para a Nova Dutra e pouco depois voltou aos 402 quilômetros (período do DNER). E agora, aumenta 6 quilômetros na BR-116 no lado fluminense, sem explicar como, repetindo em parte o modus operandi do primeiro contrato.
Questionamos a ANTT sobre a possibilidade da BR-116 no Rio de Janeiro “encolher” novamente após a concessão, como ocorreu em 1996 no Estado de São Paulo. Não obtivemos resposta.
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