Os acidentes de trânsito estão entre as principais causas de morte no Brasil, perdendo apenas para as doenças do aparelho circulatório. O péssimo estado de conservação das estradas, o excesso de velocidade e o uso de bebidas alcoólicas são apontados como responsáveis por essa triste realidade, que também aflige outros países. A União Européia (UE) anunciou um plano para reduzir o número de ocorrências em 50% até 2010. Para tanto, aposta no uso de radares: hoje, 15.103 desses aparelhos fazem o monitoramento das estradas européias, enquanto o Brasil, que tem o dobro da área da UE, conta com apenas 3.200 unidades em operação.
Os radares ainda são vistos com desconfiança pela maioria dos motoristas brasileiros, que consideram o equipamento uma espécie de sanguessuga com o único objetivo de enriquecer os cofres públicos. Deram-lhe até um apelido depreciativo: “chupa-cabra”. Já a UE, que encara os acidentes de trânsito como problema de saúde e orçamento, quer aumentar ainda mais o número de radares em suas estradas. O Brasil não trata o problema com a devida urgência e até mesmo as estatísticas são imprecisas e defasadas.
O Departamento Nacional de Trânsito (Denatran) não tem informações posteriores a 2002. Os dados mais recentes vêm do Ministério da Saúde, que aponta 33.182 mortos nas estradas brasileiras em 2003. Não há informação posterior e mesmo esse registro não corresponde à realidade, já que os índices se referem apenas aos mortos no local, sem levar em conta os óbitos ocorridos posteriormente, mas como conseqüência direta dos acidentes. Em Salvador, a SET trabalha com 50 fotossensores (que fiscalizam os semáforos), 37 radares fixos e quatro radares estáticos (do tipo portátil, que se parece com um televisor).
De acordo com a lei, a instalação dos radares deve ser precedida de placas indicativas, posicionadas entre 100 m e 400 m do equipamento. Gustavo Almeida, coordenador do núcleo de fiscalização eletrônica da SET, disse que o órgão tem promovido campanhas educativas para melhorar a imagem dos radares entre os motoristas baianos: “Os radares são como salva-vidas em uma praia, estão lá para proteger a vida das pessoas. Mesmo que a maioria dos infratores alegue que as multas são apenas uma forma de ganhar dinheiro, é fato comprovado: onde existem radares, o número de acidentes cai drasticamente”, disse. No ano passado, foram registradas 6.255 ocorrências na capital baiana, com 245 mortos e 6.010 feridos. Até abril deste ano, a SET contabilizou 1.768 acidentes, com 64 mortos e 1.704 feridos.
A Bahia temi 6.516 km de estradas federais que se encontram entre as piores do país. Segundo uma pesquisa realizada pela revista Quatro Rodas, mais da metade das rodovias federais comprometidas no Brasil encontra-se na Bahia. No ano passado, a Polícia Rodoviária Federal (PRF) registrou 6.249 ocorrências com 493 mortos e 4.078 feridos no Estado, uma média de mais de uma morte por dia. Em 2006, entre os dias 1º de janeiro e 31 de maio, a PRF registrou 2.300 acidentes, com 174 mortos e 1.502 feridos. Apesar de a PRF anunciar uma queda no número de ocorrências, os números falam por si: apenas no último feriado do São João, oito pessoas perderam a vida nas estradas baianas.
A PRF contava até pouco tempo com apenas 20 radares portáteis (do tipo que parece uma furadeira apontada para os veículos). “Quando os aparelhos detectam excesso de velocidade, os policiais passam o rádio e acionam uma viatura situada a 2 km do local, que intercepta o infrator”, explicou o inspetor Amaro, da PRF. Em março, o equipamento foi acrescido de três radares fotográficos, mais modernos e que dispensam as abordagens por gerar suas próprias provas: “Nas primeiras duas horas e meia de uso dos novos radares, 493 veículos foram flagrados por excesso de velocidade. Hoje, a média caiu para 30 a 40 veículos”, disse. Da acordo com o inspetor, a política da PRF não é aumentar o número de multas, e sim diminuir a velocidade média dos veículos.
Mesmo assim, Amaro considera a quantidade de radares insuficiente para extensão da malha rodoviária baiana: “O ideal seriam 10 radares fotográficos, pelo menos um para cada delegacia existente no Estado”, argumentou. 40 mil morrem por ano nas estradas da Europa Na UE, ocorre 1,3 milhão de acidentes todos os anos, com mais de 40 mil mortos e 1,7 milhão de feridos. Os dados se referem aos óbitos ocorridos dentro de 30 dias da data do acidente. De acordo com estudos oficiais, se todos os 25 países membros da UE utilizassem devidamente os radares, 5.800 pessoas não morreriam e outras 180 mil não se acidentariam a cada ano. Os números preocupam a Organização Mundial da Saúde: só nos Estados Unidos, mais de 3 milhões de pessoas morreram em decorrência de acidentes automobilísticos desde 1928.
No Brasil, onde a contagem é feita de maneira deficiente, calcula-se que já ultrapassamos o primeiro milhão de mortos desde a virada do século XXI. Além da perda de vidas humanas, os acidentes também trazem prejuízos econômicos: os Estados Unidos gastam 74 bilhões de dólares por ano com o problema, enquanto o Brasil gasta cerca de 10 bilhões de dólares no mesmo período.