Três em cada 10 motoristas acidentados em Belo Horizonte e atendidos nos três hospitais de pronto-socorro (HPS) da capital – João XXIII, no Centro, Risoleta Neves, em Venda Nova, e Odilon Behrens, no Bairro São Cristóvão, na Região Nordeste – admitem ter consumido bebida alcoólica até oito horas antes da batida, capotamento ou atropelamento. É o que revela o estudo Saúde em trânsito, coordenado pelo epidemiologista Roberto Marini Ladeira em parceria com a secretaria Municipal de Saúde e a BHTtrans. Ele e sua equipe entrevistaram 1.663 condutores, passageiros, ciclistas e pedestres socorridos nessas instituições de saúde depois de se acidentarem. O médico pondera, no entanto, que o percentual pode ser maior do que o encontrado, pois as respostas das vítimas foram espontâneas.

Das 1.663 pessoas, no entanto, o especialista não informou quantos são motoristas, passageiros, ciclistas e pedestres. Foram divulgados percentuais: “O maior índice (daqueles que admitiram ter ingerido álcool) foi entre os motoristas (27,7%) e o menor coube aos ciclistas (9,1%). O resultado referenciou-se nas respostas espontâneas. Não foram realizados exames laboratoriais para a confirmação do uso”, reforçou o médico. Os relatos das vítimas foram coletados em 2003 e serviram de base para sua tese de doutorado, defendida em dezembro, no Programa de Pós-Graduação em Saúde Pública da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), sob a orientação da professora Sandhi Maria Barreto.

A possibilidade de o número ser maior do que o apurado é reforçada pela delegada Andréa Abood, que há 10 anos trabalha na Delegacia Especializada em Acidentes de Veículos (Deav) de BH. Segundo ela, cerca de 60% das ocorrências de acidentes de trânsito na capital envolvem motoristas que consumiram bebida alcoólica. “A gente tem que pensar também no aumento da frota de veículos e do número de pessoas habilitadas. Aproximadamente 60% deles admitem o uso da bebida”, endossou a delegada.

Hoje, em razão da Lei Seca (11.705/08), sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em junho, o motorista embriagado que matar alguém no trânsito responderá por homicídio doloso – quando há intenção de cometer o crime – e pode ser condenado a 20 anos de prisão. A norma também prevê, em alguns casos, multa de R$ 957,70 e a suspensão da carteira de habilitação entre 12 e 24 meses.

Violência

O especialista não se restringiu às estatísticas envolvendo a dramática relação álcool/direção. Dos condutores que deram entrada nos HPSs (não significa apenas os que admitiram ter ingerido bebida), 119 (18,7%) tinham menos de um ano de carteira na data da ocorrência. A maioria dos motoristas – 273 (42,5%) – havia sido aprovada nos exames do Departamento Estadual de Trânsito (Detran) num período entre um e cinco anos. Outros 77 (12,1%) entre seis e 10 anos. A minoria – 83 (13%) – tinha habilitação a mais de uma década.

“O horário com maior número de sinistros foi das 17h às 18h59: 17,7% (295 vítimas). Observa-se que 39,4% dos acidentes ocorreram entre as 16h e as 22h. Cerca de 75% dos acidentes, independentemente do tipo de vítimas, aconteceram antes das 20h. O maior índice de vítimas ocorreu no fim de semana, com 18% nos sábados e 15,2% nos domingos. Ao considerar a internação hospitalar como a permanência maior do que 24 horas, a média foi de 12,6 dias para pedestres, 7,7 dias para motociclistas, sete dias para ciclistas e 4,4 dias para motoristas de carros”, informou Roberto.

O médico também apurou como as vítimas foram socorridas aos HPSs. Das 1.663 vítimas, 784 (47,1%) foram removidas do local do acidente pelo Resgate do Corpo de Bombeiros – o Serviço de Atendimento Médico de Urgência (Samu) entrou em funcionamento em 2004 –, 454 (27,3%) por particulares, 118 (7,1%) pela polícia, 68 (4,1%) pelo “atropelador”, 35 (2,1%) por ambulâncias, 19 (1,1%) por táxi, 4 (0,2%) por equipes da BHTrans. As demais 181 (10,9%) foram listadas como “outros” ou “ignorado”.