Ao som do estouro de várias bombas de gás lacrimogêneo e efeito moral – lançadas pela Polícia Militar contra manifestantes que não puderam acompanhar a votação nas galerias da Assembleia Legislativa –, os deputados estaduais arquivaram o Projeto de Decreto Legislativo 69/2013, que previa o fim da cobrança do pedágio da Terceira Ponte.

Durante a sessão de ontem,a segunda-feira (15), um grupo de parlamentares chegou a pedir a suspensão da votação pelo descumprimento do acordo com os ex-ocupantes da Casa, mas os trabalhos foram mantidos pelo presidente Theodorico Ferraço (DEM).

O deputado Cláudio Vereza (PT), no seu quinto mandato parlamentar, lembrou que o plenário da Assembleia nunca votou qualquer matéria sob o som de bombas. “Isso é um terrorismo contra os deputados e contra a população”, denunciou o petista. No plenário, os deputados Euclério Sampaio (PDT) – autor do projeto – e Lucia Dornelas (PT) também protestaram. A petista chegou às lágrimas durante a votação do texto.

A ação policial começou paralelamente ao início da votação do projeto do pedetista. Cerca de uma hora antes da sessão já era possível observar uma incomum – e desproporcional – presença de policiais no entorno e dentro do Palácio Domingos Martins, sede do Legislativo estadual. De acordo com servidores da Casa, um contingente de 400 policiais militares estaria envolvido na operação.

Meia hora antes do começo da sessão (que foi iniciada às 15 horas) houve a primeira ocorrência de confronto entre os policiais e manifestantes que não puderam acompanhar a sessão, como havia sido acordado na audiência de conciliação realizada na sexta-feira (12). Integrantes do “Movimento Ocupa Ales” alegam que somente um grupo de 30 a 50 pessoas foi autorizado a entrar na Casa.

A direção da Assembleia havia declarado que as galerias poderiam ser ocupadas por até 150 pessoas sob alegação de questões de segurança. Mas o espaço dos manifestantes acabou sendo ocupado por servidores da própria Casa, que haviam sido convocados pelos deputados contra a aprovação do projeto. Do lado de fora da Casa, esse mesmo grupo de manifestantes que não pode entrar acabou sendo alvo das bombas lançadas pela tropa de choque da PM.

Coincidência ou não, o estrondo das primeiras bombas foi ouvido às 15h56, quando foi iniciada a discussão do projeto pelo fim do pedágio da ponte. Em meio também aos protestos dos poucos manifestantes nas galerias, o deputado Gildevan Fernandes (PV) – relator do projeto na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa, que faltou às sessões da última semana – leu trechos do parecer em que apontava a inconstitucionalidade da proposta de Euclério.

O verde alegou que o Poder Legislativo não poderia sustar os efeitos de um contrato administrativo, bem como a votação em regime de urgência – prática comum na maioria dos projetos de interesse do governo e dos deputados – violaria o poder de fiscalização da população. Gildevan tergiversou: “Como todos nós cidadãos, gostaria de aliviar as despesas contra os demais cidadãos. Mas, como homem público, nós devemos agir na forma da lei”.

Durante a discussão na CCJ, o autor do projeto não se disse convencido pelas justificativas apresentadas pelo relator. No mesmo sentido, o deputado Cláudio Vereza – vice-presidente da Comissão – se posicionou contra o parecer de Gildevan. Entretanto, a comissão decidiu por seis votos contra um pela ilegalidade da proposta. Votaram a favor do relator, os deputados Luzia Toledo (PMDB), Elcio Alvares (DEM), Marcelo Santos (PMDB), Josias Da Vitória (PDT).

Logo depois do parecer contrário à aprovação do texto, o parecer foi levado para apreciação do plenário da Casa, que poderia derrubar a decisão da CCJ. Antes da votação, o deputado Euclério Sampaio voltou a defender sua proposição sob alegação de que o governo do Estado teria tornado estaduais vias que pertenciam ao município de Vila Velha sem o crivo do Legislativo. O pedetista pediu a votação nominal – isto é, cada deputado deveria registrar seu voto no painel eletrônico.

Mas apesar dos protestos vindos da galeria, a maioria dos deputados estaduais votou pela ratificação do parecer da CCJ e, consequentemente, o arquivamento da proposta. Além do grupo de 15 deputados que faltaram às sessões durante o período de ocupação da Casa, a deputada Janete de Sá (PMN) também foi contra a proposta. Esse comportamento da parlamentar surpreendeu aos manifestantes, que chegaram a ser apoiados pela deputada e ex-sindicalista nos primeiros dias de ocupação.

Já passava das 17 horas quando os manifestantes que estavam nas galerias da Casa decidiram deixar o local. O grupo se concentrou nas escadarias em frente da sede da Assembleia, mas foram reprimidos por tropas policiais quando deixavam o local. A polícia utilizou bombas de gás lacrimogêneo e tiros de bala de borracha para dispersar os poucos manifestantes que tentavam o acesso à rua lateral da Assembleia – caminho para a Praça do Pedágio da Terceira Ponte e local de saída dos veículos oficiais dos deputados.

Diante do quadro de repressão policial, o autor da proposta lamentou a condução do processo pela cúpula da Assembleia. “Quero lamentar a violência sofrida pela população. Essa Casa perdeu a chance de dar um chega para lá em tudo que vem acontecendo no nosso Estado e no País”, exclamou Euclério.