JOSÉ ALEXANDRE NOGUEIRA DE RESENDE
DIRETOR-GERAL DA ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres)

O diretor-geral da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), José Alexandre Nogueira de Resende, concedeu entevista exclusiva ao www.estradas.com.br por ocasião da inauguração das balanças de pesagem e salas de fiscalização da ANTT na rodovia Pres. Dutra, que liga o Rio de Janeiro a São Paulo.

Qual a diferença da atuação da ANTT no processo de concessão de rodovias em relação ao extinto DNER?

O DNER fiscalizava especificamente o contrato de concessão, com foco nas questões contratuais. A agência reguladora, no caso ANTT, tem um enfoque na fiscalização de mercado. A noção do acompanhamento do mercado e os contratos que envolvem aquele mercado.

As balanças, por exemplo, podem não ser tão importantes do ponto de vista da fiscalização de um contrato, mas certamente são primordiais na ficalização de um mercado.

A ANTT criou canais de comunicação com os usuários através de 0800, internet e criação de uma Ouvidoria. Como tem sido essa experiência?

Recebemos contribuições do Brasil inteiro.Atualmente, são mais de 1500 por dia, que servem de apoio à nossa fiscalização. São denúncias, queixas, sugestões, e até mesmo críticas com relação à atuação da própria agência. As agências reguladoras se caracterizam pelo processo de transparências. As decisões são tomadas através de audiências públicas.

A importância do registro nacional do transportador rodoviário de cargas ficou clara com essas contribuições que estão chegando, e há anos não era dada atenção a esse assunto.

No transporte de passageiros temos recebido mais contribuições e isso nos levou e motivou a uma séria de audiências para discutir a nova regulamentação do tansporte de fretamento. Recentemente, estabelecemos um novo procedimento de autorização para viagem de fretamento, que antes era feito pela polícia rodoviária e que passou para a ANTT e será feito via internet. Essa solução surgiu devido às sugestões que tínhamos recebido e críticas, pois havia usuários que tinham que viajar até 200 km para chegar num posto de polícia e conseguir a autorização. Dentro de algumas semanas isso será possível pelo site da ANTT.

O usuário vai entrar, preencher a solicitação e poderá imprimir a autorização da ANTT. Além de facilitar o turismo esse sistema irá trazer para a legalidade uma série de transportes que acaba indo para a ilegalidade.

No momento em que você restaura a fiscalização você também tem que dar condições de legalidade da operação. Senão, em vez de ajudar, você vai criar um problema maior ainda.

Quais as dificuldades que ANTT enfrenta nessa fase inicial?

A ANTT tem dificuldades características de quase todas as agências regularodas. O principal problema é a falta de quadro, estamos trabalhando com 20% do estimado em lei. Temos dificuldades orçamentárias, fruto da realidade que o Brasil está passando. E temos também de montar inicialmente essa estrutura básica para prestar esse serviço com bom atendimento ao usuário e operador. Por essas razões, praticamente após 1 ano e meio de criada a ANTT, é que temos condições de inaugurar os primeiros postos da Agência na rodovia presidente Dutra que é a principal do País.

Qual a importância desses postos gerais de fiscalização da ANTT?

Significam a visão da agência no campo, estando presente, vendo o que está acontecendo. Isso nos traz uma proximidade do usuário, saindo do gabinete de Brasília, vendo aonde as coisas estão realmente acontecendo. Será um conjunto de fiscalizações, como o excesso de peso, o vale pedágio, o Registro Nacional do Transportador de Carga, que estamos instituindo, o combate ao transporte clandestino, e também a fiscalização do transporte de fretamento e regular de passageiros.

Está prestes a ser aprovado no Congresso um projeto de lei que estabelece uma série de condições para o transportador de cargas e passageiros. Dentre elas o limite de horas dirigindo sem parar, e de carga de trabalho. Qual a importância desse tipo de controle?

São questões que nos preocupam. O excesso de carga de trabalho, principalmente por parte do transportador rodoviário de carga afeta a segurança nas estradas. Temos acompanhado esse assunto que é prioritário para o setor. Na verdade as linhas de passageiros já possuem uma legislação específica e estamos acompnhando com mais interesse o mercado de transporte de cargas que está desregulamentado. Criamos o registro do transportador rodoviário de cargas, que nainda não é uma regulamentação, mas uma habilitação para o exercício da atividade. Poderemos ter pré-condição para o exercício da atividade e também pré-condição para a eventual perda da habilitação para o exercício da mesma.

Não chega a ser uma regulação setorial, é um outro processo, que também está em discussão no Congresso, o chamado Projeto de Disciplinamento do setor rodoviário de Cargas. Cabe a ANTT aguardar essa discussão no legislativo, o estabelecimento da lei que quando o Executivo sancionar a Agência terá função de acompanhamento e regulação do setor.

Qual a sua opinião sobre as chamadas viagens “Non Stop” (quando a empresa faz a viagem entre duas cidades sem a parada prevista no esquema operacional) que algumas empresas de transporte rodoviário de passageiros estão fazendo em linhas interestaduais e até intermunicipais?

Considero isso um descumprimento de contrato, passível, na reincidência, da declaração de caducidade do contrato daquela empresa. Obviamente que a falta das condições básicas de fiscalização tem permitido que isso venha acontecendo.

Nossa intenção é coibir esse tipo de procedimento e a empresa que for identificada e constatada pela ANTT que está cometendo essas irregularidades será multada e, na reincidência, poderá inclusive perder a sua concessão. O que nós vamos procurar é reforçar nossa condição de fiscalização e para isso esses postos de fiscalização que estão sendo criados pela ANTT são muito importantes.

Nós sabemos que tem ocorrido o chamado “non stop” exatamente na rodovia Presidente Dutra, na linha Rio-São Paulo. É uma questão de segurança e bem estar do passageiro. Nós disso não vamos abrir mão.
Nós já estamos programando algumas fiscalizações itinerantes que vão ocorrer sem data marcada, sem previsão e vamos punir severamente as empresas em que estiver acontecendo o “non stop”. No caso da Rio-São Paulo, temos quatro empresas operando e não teremos nenhum tipo de receio de declarar a caducidade de qualquer uma dessas concessionárias.

Quais são as prioridades da ANTT nessa fase incial?

No caso das concessões de rodovias, criamos a resolução 239 que regulamenta os procedimentos para a execução de obras e serviços pelas concessionárias de rodovias federais reguladas pela ANTT. Fizemos revisões, para avaliar o que tinha efetivamente ocorrido nos contratos e algumas inexecuções foram detectadas nessas revisões e foram deduzidas do valor da tarifa. Isso permitiu que o nível de reajuste fosse menor do que aquilo que estava programado.

Estamos realizando um conjunto de audiências públicas na busca de outras metodologias que possam ser utilizadas no sentido de buscar melhor modicidade tarifária e criar mecanismos para evitar que possam ser superdimensionados o volume de obras e consequentemente afetada a tarifa. Estamos reintroduzindo as balanças e estudando o excesso de velocidade e aguardando as novas concessões de rodovias.

No setor de passageiros fizemos recentemente convocação para a nova regulamentação do setor de fretamento e para o serviço regular, procurando regulamentar o decreto 2521.

Na parte de ferrovias, realizamos programa amplo, com diversas audiências públicas, resestruturação societária e operacional das ferrovias O que permitiu um volume de captação de recursos este ano, por parte das ferrovias, de algo em torno de R$ 2,5 bilhões. É a primeira vez, nos últimos 70 anos, que no próximo ano, teremos mais investimentos em ferrovias do que em rodovias federais.

Quanto ao transporte de produtos perigosos estamos concluindo as audiências públicas para a nova regulamentação do setor que deverá ser reeditada nas próximas semanas.

Os contratos de concessão de rodovias estão disponíveis no site da ANTT, mas o chamado PER (Programa de Exploração de Rodovias) não. Com isso o usuário tem dificuldade de colaborar com a ANTT fiscalizando o trabalho das concessionárias. Não seria interessante disponibilizar o PER?

É uma boa sugestão. Tínhamos imaginado que as alterações ou eventuais revisões seriam feitas através de audiências públicas. Mas a idéia de disponibilizar o PER é muito interessante, até porque o usuário poderá colaborar na fiscalização. Vou levar ao conhecimento da diretoria essa sugestão.

Qual a importância do processo de concessão de rodovias?

A questão é pragmática. A manutenção das rodovias ou você paga através da carga tributária ou paga quem usa.

Essa é a realidade que não é só do Brasil, mas do mundo inteiro. O Estado deve cuidar da saúde, educação e segurança. Os demais setores de infra-estrutura devem ser geridos pela iniciativa privada. Independente do país e de governo esta é uma tendência mundial.

O problema no Brasil é que as rodovias são abertas. Na Dutra, por exemplo, 500.000 veículos/dia que trafegam pela rodovia só 180.000 pagam pedágio. Quanto maior o volume de tráfego pagante menor será o valor do pedágio.

A ANTT herdou um grande volume de multas que foram aplicadas, mas que nunca foram pagas. Como os senhores estão lidando com isso?

Havia um grande volume de multas que a polícia rodoviária aplicou contra empresas de transporte de passageiros, que foram enviadas para o ministério e não havia um sistema para processá-las. Nós estamos montando o sistema de processamento, com o apoio do Banco Mundial. Ainda não está completo, pois tivemos corte orçamentário este ano. Parte dessas multas já estão sendo cobradas e estamos introduzindo um sistema de fiscalização mais eficiente. Temos estoque de R$ 40 milhões de multas, já emitidas, sendo as de maior valor do setor ferroviário.

Não é interesse da Agência aplicar multas, não é um fim em si mesmo, para gerar receita.Mas a situação não pode ser conduzida de tal forma que os seguimentos envolvidos não sintam nenhum tipo de punição e não tenham nenhum respeito ou busca de melhor prestação de serviço. O que vinha acontecendo é que não havia nenhum tipo de apenação e com isso não tinha estímulo de eficiência.

No momento de selecionar seus quadros a ANTT tem sido muito rigorosa. Há algum motivo especial para essa postura?

Estamos falando de uma entidade nova com visão nova de mercado, e precisamos pensar muito sobre qual seria o perfil do funcionário de uma agência. Fizemos um concurso seletivo com apoio da UNB (Universidade de Brasília), que selecionou 1/3 do nosso quadro atual. Outro 1/3 é de pessoas requisitadas dentro da própria administração pública e o restante de funcionários do setor de transportes, da administração pública federal e estadual.

Buscamos pessoas que tivessem mentalidade e visão de mercado mais do que de fiscalização e que tivessem capacidade de arbitrar conflitos, o que requer que se tome cuidado até com o temperamento do servidor da agência.

Temos, sob nossa responsabilidade, seis concessões rodoviárias, tendendo a crescer, 12 ferroviárias, 3.000 empresas de fretamento de passageiros rodoviários, 250 empresas de transporte regular de passageiros interestadual, com 2.900 contratos em vigor. Nós temos 1007 empresas brasileiras com autorização de transporte internacional rodoviário de cargas e 1445 estrangeiras operando no Brasil.
Sem falar no setor de transporte de produtos perigosos e multimodal Portanto, são mais de 6.000 empresas com contratos, pleitos, reinvidicações, necessidades, problemas, que exigem uma equipe preparada para lidar com essas questões.

Estamos com cerca de 400 funcionários de um quadro aprovado em lei de 1759. Este ano, devido aos cortes orçamentários, fomos obrigados a suspender contratação de mais 200 funcionários. Ano que vem esperamos contratá-los. Para suprir isso, estamos fazendo convênios com a PRF e a Receita Federal, que está nos apoiando nos postos de fronteiras.

O que a ANTT pretende fazer para aumentar a segurança nas estradas?

São várias ações. A coibição do transporte clandestino, a regulamentação do setor, as balanças que reduzem o risco de veículos com excesso de peso já são contribuições para o aumento da segurança nas estradas.

Estamos analisando a possibilidade de introduzir um sistema de controle de velocidade nas rodovias federais, de tal envergadura que a gente possa reduzir o número de acidentes. Na medida que houve privatização, os acidentes diminuiram, as condições das estradas melhoraram, mas a velocidade também aumentou.