O jornalista Rodrigo Lopes e o fotógrafo-cinegrafista Jefferson Botega, do Diário Gaúcho, estão percorrendo o Rio Grande do Sul, mostrando a vida e as histórias de quem ajuda a forjar o retrato do povo gaúcho. Hoje, eles mostram como está uma rodovia bem conhecida dos gaúchos: a RST 101, a Estrada do Inferno.

Qualquer candidato que quiser representar os gaúchos a partir de 2011 no Palácio Piratini, na Assembleia Legislativa, na Câmara ou no Senado, deveria antes de 3 de outubro percorrer os 80km entre Palmares do Sul e Mostardas, na RST-101, e ouvir as histórias que chegam aos ouvidos do seu Wellington.

Em trabalho de parto, a caminho de ganhar o quarto filho, a recepcionista Elisandra da Silva, 27 anos, deixou Mostardas em uma ambulância. Levou quatro horas para chegar ao hospital, em Porto Alegre. Teve sorte, chegou a tempo. Pior foi uma amiga, que ganhou o bebê no trajeto esburacado.

Diego Zimer saiu de Novo Hamburgo e levou duas horas para percorrer apenas 30km da rodovia.

Há 17 anos motorista de ônibus escolar, Jaci César da Silva faz diariamente o trajeto, transportando crianças. Muitas vezes, é obrigado a invadir a pista contrária, por causa dos buracos. Já perdeu as contas de quantos carros viu, ao anoitecer, parados na estrada, com os pneus estourados e a barra de direção quebrada.

– “É minha profissão”

Ao ouvir essas histórias, Wellington Bermudes sacode a cabeça. Aos 55 anos, mais da metade deles trabalhando como borracheiro na margem da rodovia, ele não sabe o que dizer.

– Para o senhor, a estrada esburacada é um bom negócio? – pergunto.

Wellington sorri constrangido, baixa a cabeça, envergonha-se de confirmar, mas finalmente diz:

– Fazer o que, né? O que é ruim para a maioria… Pra mim, é minha profissão.

– O inferno permanece

Até ontem, quando comentávamos que iríamos a Mostardas, escutávamos:

– Ah, a antiga Estrada do Inferno… Agora, está boa.

Deixamos Osório pela RST-101, em direção a Palmares do Sul. Trecho de asfalto bom, rodovia bem sinalizada. Mas, no km 88, no limite entre Palmares do Sul e Mostardas, a rodovia começava a justificar o antigo apelido.

– Estamos chegando ao inferno – diz Jefferson, na direção.

São 80km de buracos, alguns com 2m de diâmetro. Em alguns trechos, só é possível transitar pelo acostamento. No km 155, nem isso. São 300m de crateras.

Dos 4.343 quilômetros rodados pelo Rio Grande do Sul desde o dia 23, quando deixamos Porto Alegre, estamos diante do pior trecho de rodovia. Ouvimos um barulho seco: foi-se o pneu. E a roda entortou

E foi assim, por força da necessidade que encontramos o borracheiro Wellington.

Nos feriadões, por causa dos buracos, Wellington chega a atender de 15 a 20 motoristas por dia. Por R$ 10, ele desentorta a roda. Logo, chega outra vítima da RST-101, Gerson Ferreira Lemos, com o pneu do caminhão rasgado.

Seu Wellington ouvirá mais uma história de alguém que teve a vida atrapalhada por um buraco. Como Elisandra, Diego, Jaci. Como nós.