Gerenciadoras de risco, seguradoras, aplicativos de frete, donos da carga, não controlam o exame toxicológico dos caminhoneiros

Desde que entrou em vigor, em 12 de abril deste ano, a lei 14.071/20 foi regulamentada por meio da Nova Resolução 843/2021 do Conselho Nacional de Trânsito (CONTRAN) que estabelece modificações no Código de Trânsito Brasileiro (CTB), dentre elas, a mudança em relação à validade do exame toxicológico.

O exame tem contribuído para redução de acidentes (sinistros) nas rodovias, além de combater a concorrência desleal e desmobilizar parte da logística do crime organizado, que costuma utilizar motoristas usuários de drogas nas suas operações.

Mas, com base na pesquisa que a reportagem fez, essa redução de sinistros pode ser prejudicada na medida que as próprias empresas que transportam ou tem envolvimento com a atividade não verificam a validade do exame de cada condutor.

O Estradas entrou em contato com empresas como  Fretebras, CargOn, Pamcary, Buonny, TruckPad, Quadeo, Tecnorisk e Brasil Risk para entender como estão tratando a questão do exame toxicológico. Apenas a Fretebrás e Buonny responderam.

A Fretebrás admitiu que ainda não está preparada para esse controle.

A Buonny consultada sobre o tema, disse: “..a empresa não possui a atribuição de órgão fiscalizador e, por esse motivo, não pode exigir a realização ou comprovação do exame. Além dos órgãos e agentes de fiscalização, apenas a empresa empregadora em regime de CLT pode requerer ao motorista a realização e apresentação dos resultados do exame toxicológico. Motoristas autônomos estão desobrigados pela legislação a prestar essa informação à empresa contratante ou à gerenciadora de riscos, mas se tiverem restrições na CNH, também serão detectados pela Gerenciadora, quando das pesquisas.”

Além dessas empresas, a reportagem manteve contato com a Associação Nacional dos Usuários do Transporte de Carga (ANUT), e perguntou o que a Associação tem feito sobre esse tema? Se ela, ANUT, enquanto associação representativa, tem verificado e/ou cobrado das empresas a checagem do exame toxicológico nos motoristas profissionais?

Mas, a ANUT não respondeu aos questionamentos. Indício de omissão quanto a esse controle, embora represente os donos da carga que deveriam estar atentos as condições do motorista. Não ter o exame toxicológico em dia é no mínimo preocupante.

Mas o histórico da entidade nunca foi preservar a segurança viária, conforme o Estradas.com.br teve oportunidade de acompanhar durante audiências públicas no Congresso Nacional.

O que faz a gerenciadora de riscos

A gerenciadora de risco, por meio de tecnologia, gera informações em tempo real que visam à segurança do motorista e da carga. Implementam processos que envolvem toda a cadeia de movimentação, transporte, distribuição e armazenamento de cargas.

Entretanto, não controlam, até o momento, uma informação simples e importante, como se o motorista está com o controle de drogas em dia. Isto apesar da lei prever multa de R$ 1467,35 , sete pontos na CNH e suspensão por 90 dias da habilitação.

Curiosamente, as empresas analisam o perfil dos profissionais, referências pessoais e informações fornecidas pelo próprio motorista, experiência profissional, tribunais de justiça, histórico de viagens monitoradas, validação facial e vigência da CNH.

Também são analisados o tipo de carga, valor transportado, origem e destino, proprietário e dados do veículo, documentação junto aos órgãos competentes. A  experiência do profissional junto a empresas para as quais carrega frequentemente. Até a situação do CPF na Receita Federal, e histórico de sinistros.

Lembrando que a análise do perfil profissional visa determinar a exposição ao risco das viagens e estabelecer o perfil adequado a cada tipo de embarque, com base no cruzamento de informações sobre o profissional motorista, o proprietário, o veículo e a carga, o que proporciona maior segurança e agilidade na logística e entrega de mercadorias. Conforme esclarece a Buonny.

Desafios do setor de seguros

De acordo com o presidente da Comissão de Transportes da Federação Nacional de Seguros Gerais , Paulo Robson Alves, disse que os seguros de transportes têm como excludente de cobertura, entre outras situações, a inobservância das disposições que disciplinam o transporte de cargas por rodovia.

Segundo ele, desta forma, em um possível sinistro de acidente, por exemplo, é fundamental identificar o nexo de causa do sinistro para dar o devido enquadramento no processo de regulação.

Nesta situação, existem dois desafios a serem pontuados:
1. Em um possível sinistro de acidente e dependendo do nexo de causa desse sinistro, se as Seguradoras estão solicitando documento hábil ou comprovação do exame toxicológico que possa contribuir com o enquadramento dos sinistros de forma correta e seus desdobramentos
2. A questão de tema relativo ao gerenciamento de riscos. A pergunta é se as Gerenciadoras têm acesso em algum banco de dados que possam evidenciar que o motorista está suspenso de exercer suas atividades por 90 dias em função de evidência de ter sido testado positivo no exame toxicológico.

“Do ponto de vista de riscos e seguros, é um tema muito importante, e se implementado de forma adequada com fácil acesso a essas informações para ajudar na seleção adequada dos motoristas, eu vejo de forma muito positiva e até com mais chance de segregar de forma justa os bons profissionais, que reúnem melhor controle de exposição de riscos com preço de seguro justo assim como transparência nas análises de sinistros.”, esclarece Paulo Robson Alves da Fenseg.

Para o Coordenador do SOS Estradas, Rodolfo Rizzotto, é fundamental que as empresas, sejam seguradoras, gerenciadoras de risco, intermediadoras de frete e embarcadoras, verifiquem se o condutor está com a validade do exame toxicológico em dia.

“Dessa forma estarão comprovando seu interesse no transporte seguro e no desestimulo ao uso de drogas. Além de combaterem a concorrência desleal dos que usam drogas em relação aos demais e fortalecendo uma política pública de interesse nacional”, afirma Rizzotto.

Quem estiver com exame vencido poderá ficar sem carga

Caminhoneiros que não apresentarem o exame em dia poderão ser impedidos de transportar.

A medida ainda está em estudos mas deve ser aplicada em breve, já que não interessa entregar a carga a quem não cumpre o exame e que poderá representar risco, não só de acidente, como também de envolvimento em outras atividades criminosas.

Por isso, a precaução é natural até porque a lei prevê multa de R$ 1.467,25 , suspensão do direito de dirigir por no mínimo 90 dias e sete pontos na carteira. Também já foi identificado que a maioria dos motoristas são a favor deste controle e fazem o exame regularmente. Os que costumam reclamar são justamente os que não cumprem a lei e são suspeitos de uso de drogas. Muitos acabam entrando no crime.

A Polícia Rodoviária Federal tem apreendido com frequência drogas escondida dentro de carga legalizada. Os usuários de drogas são muitas vezes cooptados pelo crime organizado para transportar drogas, armas, munição, contrabando, escondidos no meio de carga legalizada. Como neste caso em Santa Catarina, com apreensão de 24 toneladas de maconha, onde os fardos da droga estavam ocultos em meio à carga de milho a granel.

PRF encontra 24 toneladas de maconha em carga de milho