Detrans permitem que motoristas usuários de drogas continuem dirigindo impunes
TRISTE REALIDADE: Detrans permitem que motoristas usuários de drogas continuem dirigindo impunes. Nessa ocorrência, caminhoneiro estava drogado e esmagou carro matando 4 pessoas. Foto: Reprodução/Redes Sociais

Detran/SC tenta justificar porque não aplica a lei e é desmentido pela Secretaria Nacional de Trânsito

Apesar de a Lei 14.599/2023 determinar que os órgãos de trânsito (Detrans) de todo o país autuem motoristas das categorias C, D e E por não apresentarem laudo negativo do exame toxicológico — com multa de R$1.467,35, sete pontos na CNH e suspensão da habilitação até a regularização —, diversos Detrans ainda não cumprem a norma. Dentre eles, os do Paraná, de Santa Catarina e de São Paulo.

Essa omissão permite que possíveis usuários de drogas continuem conduzindo veículos pesados, colocando vidas em risco, sem nenhuma punição. A falta do exame obrigatório praticamente denuncia o uso de substâncias ilícitas. O Estradas apurou dois casos em que motoristas profissionais dirigiam com exame vencido, sendo que um deles sob efeito de cocaína.

Falta de ação do DetranSP

Em contato com os Detrans para apurar o cumprimento da lei, o DetranSP novamente não respondeu aos questionamentos. Em outras ocasiões, atribuiu a responsabilidade à Senatran, alegando falta de orientação para a aplicação da norma.

A Senatran, contudo, esclareceu que todas as normas e procedimentos necessários estão vigentes e regulamentados, conforme revelado na matéria Senatran desmente DetranSP sobre exame toxicológico de motoristas envolvidos em duas mortes. Estados como Minas Gerais já aplicaram as sanções previstas em lei, demonstrando que a regulamentação é suficiente.

Dados da Secretaria Nacional de Trânsito indicam que, em 27 de maio de 2023, eram 1.134.807 motoristas das categorias C, D e E habilitados em São Paulo com o exame toxicológico vencido. Estes motoristas deveriam ser notificados, multados e ter sua CNH suspensa, prevenindo que continuassem dirigindo e colocando vidas em risco.

O portal Estradas apurou, com exclusividade, dois casos de motoristas habilitados pelo DetranSP, com exames toxicológicos vencidos, envolvidos em acidentes fatais nas rodovias Rio-Santos (BR-101) e Via Dutra (BR-116). Questionado sobre medidas adotadas, o DetranSP não apresentou ações concretas, reiterando a responsabilidade da Senatran.

Para Fernando Diniz, presidente da entidade TrânsitoAmigo, a omissão é inaceitável:
“É assustador imaginar que mais de 1 milhão de motoristas habilitados em São Paulo podem dirigir veículos pesados sem comprovar que não são usuários de drogas. Enquanto isso, o DetranSP fecha os olhos para essa grave questão.”

DetranPR segue omisso

O DetranPR justificou sua inércia afirmando que o sistema ainda está sendo adequado, mesmo após mais de um ano da aprovação da lei:
“Estamos tratando do tema com cautela para evitar que a população se sinta prejudicada. Avisaremos com antecedência quando as autuações começarem.”

Essa posição ignora o fato de que mais de 200 mil motoristas com exame vencido seguem dirigindo, colocando vidas em risco, mesmo após decisão judicial obrigando o cumprimento da norma, como destaca a matéria publica pelo Estradas, em maio deste ano, Justiça revoga decisão do Detran do Paraná e multas do toxicológico voltam a ser aplicadas.

Portanto, a população já está prejudicada por correr risco todos os dias pela omissão do órgão.

Bom exemplo de Minas confirma a omissão dos demais

Diferente de São Paulo, Paraná e Santa Catarina, Minas Gerais aplicou a legislação desde o início: “Foram mais de 136 mil autuações a motoristas irregulares, reafirmando nosso compromisso com a segurança no trânsito”, afirmou a CET-MG.

Até maio de 2023, Minas Gerais registrava 264.461 motoristas com exames vencidos, punindo metade desse total e regularizando outra parte. Enquanto isso, o Paraná, com números semelhantes, não autuou ninguém por decisão da direção do órgão.

Disparidades entre estados

Outros estados também apresentam diferentes níveis de ação. Veja alguns exemplos:

Senatran: todos os recursos disponíveis

Em resposta ao Estradas, sobre a postura irresponsável de alguns Detrans, a Senatran destacou que desde a publicação da Lei 14.599/2023 todas as medidas regulatórias, sistêmicas e procedimentais foram adotadas. A Secretaria realizou reuniões, ajustes e campanhas de conscientização, garantindo segurança jurídica e plena orientação aos Detrans.

De acordo com Rodolfo Rizzotto, autor do estudo “As Drogas e os Motoristas Profissionais”, “É hora de o Ministério Público investigar por que alguns dirigentes de Detrans não cumprem a lei? As vítimas de sinistros (acidentes) causados por motoristas irregulares devem acionar a Justiça para cobrar a responsabilização desses gestores omissos.”

Rizzotto esclarece que a droga mais utilizada atualmente é a cocaína e não há justificativa para que o motorista não faça o exame. “Quem não apresenta o toxicológico pode ser considerado um potencial drogado. Como mínimo sua CNH tem que ser suspensa, até que prove o contrário.”

Resposta do Detran/SC

O DETRAN/SC vem esclarecer que o estado de Santa Catarina não está sendo omisso, como sugere a matéria, nem descumprindo a lei em relação ao exame toxicológico. Diante da inércia da SENATRAN em responder à consulta formulada pelo DETRAN/SC acerca do tema, o Conselho Estadual de Trânsito de Santa Catarina – CETRAN-SC, optou por suspender os efeitos da fiscalização do art. 165-D, por considerar que a lavratura do auto de infração sem os dados obrigatórios causaria insegurança jurídica aos condutores e, principalmente, para a autoridade de trânsito estadual que analisa a consistência destes, podendo, inclusive, resultar em uma grande demanda de ações judiciais contra o DETRAN/SC, bem como uma quantidade considerável de recursos de multa interpostos pelos condutores autuados, resultando no deferimento/anulação da penalidade e, consequentemente, prejuízo aos cofres públicos.

A SENATRAN estabeleceu que a infração de trânsito fosse lançada no RENACH (Registro Nacional de Condutores de Veículos Automotores) do suposto infrator. Porém, tamanha é a dificuldade de lançar a multa no prontuário do condutor que até o momento não é possível lançar quando se trata de infração de responsabilidade do pedestre ou do ciclista, embora essas infrações já existam no CTB desde 1997.

O Detran/SC não se recusa a cumprir a lei, inclusive tendo decisão favorável do Ministério Público catarinense nesse sentido, que afirmou não haver irregularidade alguma na suspensão do art. 165-D do Código de Trânsito Brasileiro: “Pelo contrário, compreende-se que os motivos apresentados pelo CETRAN-SC para a suspensão em debate são plenamente plausíveis e razoáveis, sobretudo porque o Conselho leva em conta que eventual manutenção do dispositivo suspenso, sem maiores parâmetros da SENATRAN, poderia ocasionar prejuízos não só ao erário, mas à população como um todo.”

Cumpre ressaltar que, não houve, em nenhum momento, a intenção de fomentar que o condutor deixe de realizar o exame toxicológico, até porque se for alvo de abordagem veicular, será devidamente autuado com a anotação da placa. A resolução 23/2024 do CETRAN/SC somente se manifesta sobre a chamada “multa de balcão”, ou seja, aquela que é aplicada automaticamente e balizada mediante sistema ao condutor tão somente pela sua conduta omissiva.”

Nota Oficial da Senatran

Desde a publicação da Lei n 14.599, de 19 de junho de 2023, a Secretaria Nacional de Trânsito (SENATRAN) tem executado inúmeras ações para compatibilizar os ambientes regulatórios, tecnológicos e procedimentais ao normativo vigente. Primeiramente, foram publicadas Deliberações do CONTRAN com prazos para que os condutores realizassem os exames toxicológicos. A Resolução CONTRAN 1.009, de 24 de abril de 2024, promoveu alterações importantes nos regulamentos do CONTRAN sobre a matéria, conferindo segurança jurídica para todos os atos necessários.

Em paralelo, foram realizados ajustes sistêmicos, de modo a permitir o efetivo monitoramento e fiscalização por parte das autoridades de trânsito competentes, inclusive quanto à conduta infracional prevista no art. 165-D do Código de Trânsito Brasileiro (CTB).

Foram realizadas diversas reuniões entre a SENATRAN e os técnicos dos órgãos e entidades executivos de trânsito dos Estados e do Distrito Federal, de modo a apresentar os novos procedimentos e dirimir as dúvidas necessárias, inclusive com respostas formais aos questionamentos formulados.

Logo, a SENATRAN estabeleceu e concluiu todas as tratativas necessárias para que os órgãos componentes do Sistema Nacional de Trânsito exerçam suas atribuições legais quanto à matéria. Neste sentido, informamos que há vários Detran’s notificando normalmente, o que comprova que não há impedimentos sistêmicos para a execução das notificações.”

Secretaria Nacional de Trânsito

Nota da Redação

Conforme o Estradas já revelou, vários Detrans do Brasil estão notificando e autuando os condutores com o exame toxicológico vencido, em alguns casos, há quase seis meses. Portanto, cumprindo a legislação, sem usar subterfúgios. A própria Senatran deixa isso claro.

Portanto, o Detran de Santa Catarina não demonstra interesse em notificar condutores com o exame toxicológico vencido, permitindo que dezenas de milhares de condutores usuários de droga possam trafegar normalmente com habilitação em dia, sem restrição por parte do órgão, apesar de não apresentarem laudo negativo obrigatório para drogas.

Na avaliação do Estradas, os dirigentes do órgão, assim como outros que procedem da mesma forma,  assumem o risco de contribuir para que motoristas usuários de drogas, com exame vencido, causem tragédias nas estradas e ruas do país, sem que nenhuma medida preventiva seja tomada pelo órgão de trânsito, como a suspensão da CNH até apresentação de laudo negativo.

(*) Matéria atualizada em 18/12/24 com as respostas do Detran/SC e da Senatran

1 COMENTÁRIO

  1. Bom dia !
    A atitude dos Detrans acima citados é uma vergonha e não tem nada que justifique a não atuação desses motoristas.
    Muita gente vai ter que morrer para que a providência seja tomada.

Comentários encerrados