REBITES: Três caminhoneiros foram flagrados pela PRF da Bahia com 140 comprimidos de anfetaminas, o popular 'rebite', durante abordagens na BR-242, em Itaberaba (BA), e BR-116, em Jequié (BA), nessa terça (22) e quarta-feira (23). Foto: Divulgação/PRF-BA

Ocorrências foram registradas na terça (22) e na manhã desta quarta-feira (23), nas rodovias BR-116 e BR-242. Condutores foram autuados

Três caminhoneiros foram flagrados pela Polícia Rodoviária Federal (PRF) da Bahia com 140 comprimidos de anfetaminas, o popular ‘rebite’, durante abordagens na BR-242, em Itaberaba (BA), e BR-116, em Jequié (BA), nessa terça (22) e quarta-feira (23).

Segundo os inspetores baianos, a primeira ocorrência foi nessa terça (22), no km 225 da BR-242, em Itaberaba (BA). Por volta das 17h, foi abordado um caminhão, e, após checagem, os inspetores localizaram uma cartela contendo 19 comprimidos de Nobésio extraforte.

Já na manhã desta quarta-feira (23), por volta das 9h, em Jequié (BA), um comando de fiscalização no km 677 da BR-116, abordou uma carreta Scania R450, onde foram localizados 14 comprimidos de ‘rebite’, dentro da cabine.

Segundo a PRF, minutos depois, no mesmo local, uma nova abordagem a uma Scania P370, foram encontrados 7 comprimidos de ‘rebite’ na cabine. Questionado sobre o uso do entorpecente, o caminhoneiro entregou espontaneamente mais 100 unidades da droga.

Diante dos fatos, foi lavrado o termo circunstanciado de ocorrência pelo crime de porte de drogas para consumo (art. 28 da Lei 11.343/2006). Os motoristas assinaram o termo de compromisso para comparecer perante o juiz quando intimados.

NOBÉSIO EXTREFAORTE: Caminhoneiros foram flagrados nessa terça (22) e quarta (23), com comprimidos de Nobésio extraforte, o popular ‘rebite’. Todos foram autuados e liberados. Foto: Divulgação/PRF-BA

Perigo constante

No último dia 18, o Estradas publicou matéria sobre outro caso envolvendo um caminhoneiro – desta vez, usuário de droga – que chocou a carreta que conduzia, num muro do quartel do Exército, em Campo Grande (MS).

Na ocasião, a cena foi flagrada por várias câmeras e a carreta só parou quando chocou contra o portão de ferro do quartel do Exército. O percurso registrado foi de aproximadamente 6 quilômetros.

MURO DO QUARTEL: Caminhoneiro só parou quando chocou a carreta contra o muro de ferro do quartel do Exército, em Campo Grande (MS). Percurso registrado foi de aproximadamente 6 quilômetros. Foto: Ari Theodoro/Midiamax

Outros casos semelhantes com caminhoneiros drogados

Em janeiro deste ano, um caminhoneiro com carga de cerveja percorreu mais de 100 quilômetros entre a BR-277 e o perímetro urbano de Curitiba (PR). Somente parou após colidir com dezenas de veículos. Na ocasião, ele admitiu uso de cocaína, ‘rebite’ e justificou dizendo que estava dirigindo sem dormir. As drogas provocaram alucinações, o que o levou a acreditar que estava sendo perseguido.

No ano passado, outro caminhoneiro drogado, que arrastou uma moto por 32 quilômetros na BR-101, em Santa Catarina, e matou a esposa do motociclista que estava na garupa, foi condenado a 14 anos de reclusão. Apesar disso, 1 ano depois da tragédia sua habilitação ainda estava válida.

No dia 17 de julho, outro caminhoneiro sob efeito de rebite e cocaína provocou acidente na BR-316, no PI, e foi preso. Ele parou no posto da Polícia Rodoviária Federal alegando estar sendo perseguido. Os policiais perceberam que estava com sintomas do uso de drogas. Em seguida, um motociclista alertou que um carro havia sido ‘jogado’ para fora da pista.

A PRF foi ao local e constatou que o veículo estava no trecho citado, com cinco pessoas, e os ocupantes descreveram um caminhão que os ‘jogou’ para fora da estrada. Era exatamente o mesmo. A PRF então encontrou ‘rebite’ e vestígios de cocaína no caminhão. Caso o caminhoneiro não tivesse parado no posto policial, teria escapado ileso.

Impunidade garantida para quem não faz o exame toxicológico

A exigência do exame toxicológico de larga janela, que detecta o uso regular de drogas nos últimos 90 dias, introduzido no Brasil pela Lei 13.103/15, estabeleceu a primeira política pública eficiente de prevenção do uso de drogas para condutores das categorias C, D e E, habilitados para dirigir caminhões, vans, ônibus e carretas.

O impacto foi tão importante que “sumiram” do mercado quase 4 milhões de condutores dessas categorias. Revelando o que foi definido como positividade escondida, ou seja, motoristas cientes que não passariam no exame, pela sua larga janela (90) dias, e preferiram não renovar a CNH.

Mas, desde que a lei entrou em vigor em março de 2016, o exame enfrenta numerosas batalhas para sua aplicação. Inicialmente, com pedidos de liminares de órgãos de trânsito, contra o único instrumento que permite inibir o uso de drogas ao volante. O que era absolutamente incoerente, considerando que a tentativa de combater a política pública vinha justamente dos órgãos de trânsito.

Mas a Justiça derrubou todas as liminares e manteve o exame. Apesar de os resultados obtidos com quase 300 mil condutores com laudos positivos e milhões que desapareceram do mercado, por serem usuários contumazes de drogas, além da redução dos sinistros, a política do exame continuou a ser combatida.

Nem mesmo as informações científicas disponíveis atualmente, com o maior banco de dados sobre uso de drogas do país, têm sido utilizadas pelos órgãos do governo federal ligados à saúde e ao uso de substâncias psicoativas. É como se colocassem uma venda nos olhos para não ver os benefícios.

Uma das alegações que justificaria o combate a esta política pública seria de que os caminhoneiros, tão temidos pelos políticos, seriam contra. Nem mesmo as manifestações a favor do exame das maiores entidades de transporte e da categoria, dentre elas a ABCAM (Associação Brasileira de Caminhoneiros Autônomos), NTC, ABRATI e CNTTA (Confederação dos Transportadores Autônomos) dentre outras, pareciam convencer os políticos de plantão.

No governo Bolsonaro, no apagar das luzes, o então presidente adiou as multas, por meio de Medida Provisória, para quem não cumprisse a lei, para junho de 2025. O Congresso Nacional reagiu e confirmou as punições com a Lei 14.599/23.

Ainda disso, essa nova lei ainda determinou o escalonamento do exame periódico, obrigatório a cada 30 meses, já que quase 4 milhões de condutores estavam com ele vencido. O que revela ainda a ponta do iceberg das drogas no transporte rodoviário.

Apesar da decisão do Congresso, o novo governo vetou a chamada multa de balcão, aplicada ao motorista que não realiza o exame periódico quando vai renovar a CNH, como também não cumpriu o escalonamento previsto para iniciar em julho deste ano (2023).

O veto pode ser derrubado pelo Congresso, o que pode ocorrer na próxima semana. Previa o Art. 165 D multa de R$ 1.467,35 para quem não estivesse em dia com o exame toxicológico, mas foi vetado, conforme pode ser visto: Art. 165-B.  Conduzir veículo para o qual seja exigida habilitação nas categorias C, D ou E sem realizar o exame toxicológico previsto no § 2º do art. 148-A deste Código, após 30 (trinta) dias do vencimento do prazo estabelecido.

Como se não bastasse, o Governo anunciou que somente seriam punidos os que estão com o exame vencido, a partir de  28 de dezembro de 2023. A PRF inclusive comunicou que a fiscalização somente se iniciará a partir desta data. Fato sem precedentes, já que a autoridade policial pode não aplicar a autuação prevista em lei, uma vez que existe fundamentação legal para isso. Mas anunciar que não vai punir é inédito.

O uso de drogas por motoristas profissionais é motivado principalmente pela exploração dessa mão de obra. Motoristas que tentam suportar longas jornadas e acabam utilizando substâncias psicoativas.

Ao contrário do que supunham as autoridades e a sociedade, o uso de drogas por caminhoneiros e motoristas de ônibus revelou que, dos laudos positivos, apontam a cocaína como droga predominante, em 70% dos casos.

O uso dessas drogas explica as alucinações e casos como os relatados nesta matéria. Mas quantos motoristas não foram noticiados pela imprensa e flagrados pelas autoridades nessas condições? Quantos brasileiros perderam a vida jogados para fora da pista por motoristas drogados?

Evidente que não são apenas os motoristas profissionais que usam drogas, e a possibilidade da descriminalização do porte de drogas pelo Superior Tribunal Federal na próxima semana seguramente vai contribuir para o agravamento do problema. Mas veículos pesados, por vezes com mais de 70 toneladas e condutores drogados são armas de destruição em massa. Quantas mortes serão necessárias para que o governo decida de fato combater o uso de drogas por motoristas?