Policial afirma ter se ferido com estilhaços do airbag após acidente leve em Feira de Santana (BA); Honda diz não ter conhecimento sobre o caso

O policial Tiago Ferreira, de 32 anos, ia para o trabalho dirigindo seu Honda Civic 2007 no último sábado de agosto quando bateu o carro na traseira de um Toyota Etios. Era para ser um acidente com ferimentos leves, já que o sedã estava a menos de 50 km/h, segundo o motorista. Mas Tiago foi levado ao centro cirúrgico de um hospital de Feira de Santana (BA) com um extenso corte no peito. Já os passageiros, também policiais, não se feriram.

O que parecia para os colegas militares um ferimento causado por um projétil de arma de fogo era, na verdade, uma lesão provocada por fragmentos metálicos que foram lançados contra ele quando o airbag foi acionado.

São casos assim que mataram, ao menos, 20 pessoas em outros países e motivaram o megarecall global de airbags fabricados pela Takata (a empresa hoje é chamada de Joyson Safety Systems).

O Honda Civic que Tiago Ferreira dirigia estava envolvido no megarecall global de airbags. Autoesporte confirmou que a unidade acidentada foi convocada para o recall no dia 27 de julho de 2015.

Além disso, a imagem abaixo mostra que a própria base de dados da Honda confirma que o veículo não passou pelo conserto gratuito. O airbag do motorista e do passageiro tinham o defeito de fabricação.

A montadora e a fabricante das bolsas infláveis sabiam do risco, mas o dono do Civic alegou que não. “Esse carro está há um ano e meio na minha mão e eu não tinha ciência desse recall. Pesquisando, descobri pelo próprio site da Autoesporte matérias que falavam sobre esse airbag que já fez vítimas no mundo todo. E que os ferimentos são semelhantes a facadas ou tiros. Bem parecido com o meu”, afirma Ferreira.

Desde 2013, montadoras e a fabricante dos airbags identificaram o mesmo problema em mais de 3,4 milhões de carros vendidos no Brasil. Quase metade desses carros (43% do total) foram fabricados e vendidos pela Honda.

Um levantamento feito em abril mostrou que mais de 2 milhões de carros circulam pelo país como o Civic de Tiago: sem ter atendido ao recall.

Responsabilidade

O caso de Tiago chama atenção porque reúne todas as características de alerta desse caso e mostra como a prevenção é importante. O primeiro ponto é que o carro foi comprado pelo policial como seminovo. Mas isso não transfere a responsabilidade do incidente da montadora para o consumidor.

“A responsabilidade de todo recall é do fornecedor. Se o recall não for feito e tiver um acidente, ele é o responsável, sim”, explica Maria Inês Dolci, vice-presidente da associação de consumidores Proteste.

O gerente geral de pós-venda da Honda confirmou que uma das dificuldades da empresa com o chamamento é entrar em contato com clientes que compraram veículos seminovos. “Os proprietários que vão adquirindo o carro usado vão, via de regra, se distanciando para as regiões mais afastadas do centro das capitais. Nós temos feito um trabalho junto aos concessionários para conscientizar o cliente que ele pode fazer o reparo”, disse.

Mesmo tendo investido em campanhas de comunicação para informar mais consumidores sobre a falha, a Honda revela que apenas 46% dos mais de 1,3 milhão de carros convocados ao megarecall foram consertados.

Um ano e meio atrás esse índice era de 21%. Nesse período, porém, Tiago Ferreira diz não ter sido alertado do problema.

Clima tropical aumenta os riscos

O clima quente e úmido do Brasil é considerado um fator de risco para que outros airbags defeituosos apresentem o mesmo problema. Isso porque a falha é potencializada quando o componente químico que faz com que o airbag seja inflado é exposto a calor e umidade.

Em entrevista exclusiva a Autoesporte, o presidente da Takata do Brasil e hoje presidente da Joyson Safety Systems do Brasil, Airton Evangelista, confirmou que o risco no nosso país pode ser considerado tão alto quanto nos locais onde outros airbags se romperam. “Se fizer um estudo, o clima aqui é bem parecido com o dessas regiões dos Estados Unidos”, disse.

Apesar de o clima brasileiro aumentar o risco de que outras cápsulas de airbag se rompam, não haviam sido registrados casos com vítimas no Brasil até este momento. A informação foi confirmada a Autoesporte pelo Ministério da Justiça, que monitora todos os recalls do país por meio da Secretaria Nacional do Consumidor.

“Até o momento não foram registrados acidentes com feridos ou mortos relacionados aos airbags da Takata no Brasil”, afirmou a assessoria de imprensa do Ministério da Justiça em nota.

Seus direitos

Conforme previsto em lei, qualquer recall é sempre gratuito e não tem data limite para ser atendido. Ou seja: mesmo que a convocação tenha sido feita anos atrás, o consumidor ainda tem o direito de solicitar que o reparo seja feito.

Além disso, o direito ao recall se estende aos proprietários de carros comprados no mercado de usados, seja em lojas independentes, concessionários ou de pessoas físicas. Também vale lembrar que o reparo pode e deve ser feito mesmo que as revisões do carro não estejam em dia e mesmo que a garantia já tenha acabado.

Outro lado

A assessoria de imprensa da Honda do Brasil afirmou que a empresa ainda não foi informada sobre o rompimento do airbag em Feira de Santana.

“A partir dessa informação, estamos tomando medidas para identificação e contato com o cliente envolvido. Caso seja constatado a deflagração com rompimento do insuflador do airbag da Takata, daremos a devida assistência ao cliente”, diz a nota.

Os representantes da montadora também afirmam que já foi informada sobre o rompimento de outros insufladores de airbag no Brasil, mas afirmou que todos foram casos não fatais. Autoesporte pediu mais detalhes sobre a gravidade dos casos e atualizará esta reportagem assim que a montadora se pronunciar novamente.

Já os representantes da Joyson Safety Systems informaram que a empresa não tinha conhecimento sobre este caso específico e que não irá se pronunciar. Além disso, a fabricante afirma não ter conhecimento de nenhum caso de rompimento de seus airbags com vítimas.

Confira a íntegra da resposta da Honda:

Qual é a posição da montadora sobre o caso? A empresa pretende prestar algum tipo de suporte à vítima?

Honda do Brasil: Ainda não fomos informados sobre esta ocorrência. A partir dessa informação, estamos tomando medidas para identificação e contato com o cliente envolvido. Caso seja constatado a deflagração com rompimento do insuflador do airbag da Takata, daremos a devida assistência ao cliente.

A Honda foi informada sobre este incidente?

Honda do Brasil: Ainda não recebemos nenhum contato ou informação sobre a ocorrência mencionada.

A empresa tem conhecimento de outros casos semelhantes com seus carros no Brasil?

Honda do Brasil: No Brasil, temos registro de alguns casos não fatais de deflagração do airbag da Takata, com rompimento do insuflador. Nesses casos, a Honda atua prestando a devida assistência ao cliente envolvido.

Qual é a orientação da Honda do Brasil para proprietários de veículos incluídos no megarecall de airbags?

Honda do Brasil: Que os proprietários verifiquem em nosso site www.honda/recall, via a identificação da placa ou número do chassi, se seus veículos possuem pendências de realização do recall do insuflador de airbag da Takata e faça o agendamento do reparo imediatamente se necessário.

Qual é a porcentagem de carros Honda já efetivamente consertados no Brasil?

Honda do Brasil: Já registramos 46% de veículos reparados.

A vítima afirma não ter sido comunicada diretamente pela empresa a respeito da falha. Qual é a posição da empresa sobre isso?

Honda do Brasil: No Brasil, a legislação prevê que a divulgação de uma campanha de recall aos clientes seja realizada em meios de comunicação de massa (Rádio, TV e Jornais), o que foi feito pela empresa. Além disso, a Honda tem liderado diversas iniciativas para ampliar o alcance da comunicação com os clientes como entrega de folhetos em pedágios, envios de SMS, e-mails, cartas dos Detrans conveniados, campanha de marketing em TV aberta e fechada entre outros.

Fonte: www.revistaautoesporte.globo.com